segunda-feira, junho 09, 2014

Será a Rússia adversa à democracia? - 2


A minha comunicação feita nos XXXV                  Colóquios de Relações Internacionais na Universidade do Minho

Parte 2:

"Este confronto atinge o seu ponto mais alto quando Ieltsin é eleito presidente do Soviete Supremo (29 de Maio de 1990) e Presidente da Rússia (12 de Junho de 1991). A partir daqui, só a desintegração da URSS permitia a vitória total sobre Gorbatchov, o que viria a acontecer em Dezembro do mesmo ano.
Enquanto Presidente da Rússia, Boris Ieltsin empreendeu reformas económicas e políticas para adaptar o país às novas realidades geopolíticas. Enveredando por uma política de aproximação ao Ocidente, o dirigente copiou as receitas mais dolorosas no campo económico, mas, no político, manteve um regime que foi perdendo a sua democraticidade. É verdade que a liberdade de expressão e imprensa estavam fixados na Constituição da Rússia, mas os órgãos de informação estavam nas mãos dos oligarcas. Existia oposição parlamentar, mas Boris Ieltsin não teve pejo de recorrer aos tanques para dissolver o Soviete Supremo da Rússia em Outubro de 1993.
A propósito, o chamado Ocidente aplaudiu esta acção não obstante os seus efeitos altamente nocivos para a jovem democracia russa.
As eleições presidenciais de 1996 são o corolário da deformação do jovem corpo democrático. Partindo com uma intenção de voto de cerca de 3% para a primeira volta, conseguiu passar à segunda juntamente com Guennadi Ziuganov, secretário-geral do Partido Comunista da Rússia. Na recta final, bateu o líder comunista à custa de uma campanha eleitoral completamente monopolizada. Foi caso para dizer, em relação à televisão que os russos “acordavam e adormecia com Ieltsin”. O chamado Ocidente voltou a aplaudir.
A vitória de Ieltsin nas eleições de 1996 mostrou à elite russa que estava na hora de encontrar um substituto para o dirigente do país. Além dos fracassos no campo económico, do saque a que foi sujeita a riqueza nacional nos anos de 1990, durante o processo de privatizações, a guerra da Tchetchénia foi mais uma nódoa sangrenta na actividade política de Boris Ieltsin.
A chamada “Família” (círculo próximo do Presidente russo que, no fundo, governava por ele), e principalmente o oligarca Boris Berezovski, viram num coronel do KGB, chamado Vladimir Putin, um político que poderia dar uma imagem nova do poder, mas mantendo-se obediente.
Porém, a pouco e pouco, Putin foi substituindo nos mais altos cargos políticos herdados do seu antecessor por homens de sua confiança, fundamentalmente saídos dos serviços secretos soviéticos: KGB.
Além do mais, começou a neutralizar os oligarcas, utilizando para isso variados métodos: ou obrigando-os a vender as suas propriedades e bens na Rússia e a emigrarem, como foi o caso de Vladimir Gussinski, dono de um dos maiores impérios de mídias no país, ou expropriando-os e condenando-os a pesadas penas de prisão, como foi o caso de Mikhail Khodorkovski, dono da petrolífera YUKOS.
O primeiro mandato de Putin (2000-2004) ficou também marcado por um claro melhoramento das condições de vida da população, devido fundamentalmente ao aumento significativo dos preços do petróleo e do gás nos mercados internacionais, e pelo esmagamento militar da guerrilha separatista na Tchetchénia. Foram muitos os cidadãos russos que acreditaram que a centralização do poder, processo conhecido por “criação de um poder vertical”(que se manifestou, nomeadamente, na nomeação dos governadores das regiões e repúblicas da Federação da Rússia pelo Kremlin, em vez da sua eleição em sufrágio directo), bem como a já citada guerra contra os oligarcas serviram para impor alguma ordem no país e poderiam reduzir a corrupção, uma das mais graves chagas sociais no país.
Porém, nos seus dois primeiros mandatos, uns oligarcas foram substituídos por outros mais próximos dos serviços secretos russos e do poder. Empresas públicas gigantes como a gasífera Gazprom, a petrolífera Rozneft, a companhia de transportes ferroviários RZD, etc. passaram a ser geridas por esses elementos em função dos interesses do Kremlin.

Em geral, o segundo mandato presidencial de Putin ficou marcado por uma forte ofensiva contra a oposição, continuando a ser um mistério a morte de alguns jornalistas". (continua) 

6 comentários:

chukcha disse...

"A propósito, o chamado Ocidente aplaudiu esta acção não obstante os seus efeitos altamente nocivos para a jovem democracia russa."

Pois... esse foi sempre o great game do Ocidente.
Primeiro a desintegração da Urss, posteriormente a desintegração da Rússia. Porque umas dezenas de países entre a Estónia e o Cazaquistão são bem mais maleaveis que um país multinacional que se estende de Smolensk à Chukota, com todos os seus recursos...

E por isso sempre aplaudiram e financiaram a desintegração da Rússia enquanto unidade territorial, cultural et al.

Só que falharam, o "liberalismo" morreu com Ieltsin, porque consistia na delapidação do património da Rússia em proveito de todos menos dos Russos. É por isso que os políticos liberais não podem andar na rua.
A questão não é entre democracia ou ditadura. È entre o controlo (e aproveitamento) de recursos por parte dos russos ou não.

E por isso me chateia um bocado a tese Ocidental que as eleições não são democráticas na Rússia, pois as alternativas a Putin são:
o Ziuganov
o Zhrik
o Mironov

Qual destes é que o Ocidente perfere? OS amigos "liberais", financiados pelas fundações para a democracia e liberdade, não ganham para o parlamento...
Porque a Rússia está vacinada contra o liberalismo económico(proveitosos anos 90)...

PortugueseMan disse...

...O primeiro mandato de Putin (2000-2004) ficou também marcado por um claro melhoramento das condições de vida da população, devido fundamentalmente ao aumento significativo dos preços do petróleo e do gás nos mercados internacionais...

Não é devido ao aumento significativo dos preços do petróleo e gás nos mercados internacionais.

Se a Rússia não controlasse as suas riquezas, os valores que conseguiria obter era apenas atravez do que obtivessem por impostos.

Ao controlar as suas riquezas, os lucros gerados pelas mesmas vão para o país e não para accionistas de multinacionais estrangeiras.

Esta é que é a diferença. A Rússia melhorou as condições de vida da população PORQUE controla as suas riquezas.

E volto a insistir como sempre afirmei, a grande viragem foi com o que se fez com a Yukos.

A mensagem foi passada, quem tentar levar as riquezas da Rússia para controlo exterior, sabe o destino que leva.

Pippo disse...

Pentagon to send military advisers to Ukraine

American military advisers will soon arrive in politically fractured Ukraine in a move the Pentagon says is designed to build “defense institutions” in the country, where nationalist forces continue saber-rattling against Russia.

In preparation for the consultations, US defense officials met with Kiev authorities earlier this week to discuss ways how the two countries “could strengthen our long-term defense cooperation to help Ukraine build highly effective armed forces and defense institutions,” Pentagon spokesperson Eileen Lainez said, as quoted by Military Times.

The Pentagon considers sending its military advisers “a first step” toward helping to “shape and establish an enduring program for future US efforts to support the Ukrainian military through training, education, and assistance.”

“We are committed fully to getting the assistance to Ukraine as quickly as possible,” Lainez said.

Lainez’s statement follows President Barack Obama’s promise earlier this week that the US would provide Kiev additional military help which may include training of its law enforcement and army personnel.

The Pentagon spokeswoman asserted that Washington does not see a military solution to the Ukrainian crisis, after an armed coup forced out its president, Viktor Yanukovich, following Kiev’s decision to put on hold the association agreement with the EU over economic concerns.

“Our focus continues to be on supporting Ukraine economically and diplomatically,” Lainez said. “As the president has said, we do not see a military solution to this crisis. Throughout the review, we’re looking at items with the intent that whatever is approved will stabilize the situation in Ukraine.”

In the meantime, since March, the White House has approved more than $23 million in security assistance to Ukraine.

On June 4, Obama said that the US was providing additional $5 million aid for "the provision of body armor, night vision goggles and additional communications equipment." The White House also said other aid for Ukraine included 300,000 ready-to-eat meals and financing for medical supplies, helmets, hand-held radios and other equipment.

Obama’s pledges to Ukraine, at the same time, came on the heel of his vows to invest $1 billion in stepping up the US military presence in Eastern Europe in order “to defend your territorial integrity”.

http://rt.com/news/164324-usa-military-advisers-ukraine/


Para quem está recordado, foi mais ou menos assim, ainda que sob a cobertura de uma empresa chamada MPRI (Military Professional Resources Inc.), que os norte-americanos ajudaram o exército croata a realizar a limpeza étnica dos sérvios na Krajina (Operação Tempestade, 1995).
Qualquer comparação com a actualidade não é mera coincidência.

Elio disse...

So lamento que o Jose MIlhazes seja tao parcial, nao e que Putin seja flor que se cheire, mas onde andam os jardins?
E a limpeza etnica vai acentuar-se com total apadrinhamento dos "democratas" para isso prefiro ditaduras porque assumem sem complexos enquantos os "bons"????? nem a hipocritas chegam a ser porque sao da pior escoria que existe.
Sao os mesmos que defendem a exemplar democracia no Iraque....
Em relaçao a parcialidade ja nao espero que venha a diminuir...

N. Amorim disse...

Caro JM, uma questão somente.

Não se sente (não sei qual a melhor palavra que designar aqui) "enojado" pelo completo blackout da comunicação social em geral ? Não se vê uma unica noticia sobre a operação ATO na TV ou jornais, tudo o que se lê são os anuncios do presidente em funçoes, sobre o completo atropelo dos direitos humanos, nada, nada, nada..de em vez enquando lá sai uma alfinetada da OSCE. Tivesse algum soldado russo pisado a fronteira e já se ouvia a gritaria "Os Russos vêm ai, os Russos vêm aí,..."

Isto é tão na cara das pessoas, tão descarado, que só consigo perguntar: até quando ?

Unknown disse...

Estou de acordo com Chukcha. O problema da Rússia não é entre democracia e ditadura. É entre Liberalismo e ausência deste. Independentemente do caracter mais democrático ou menos democrático do poder na Rússia, as criticas a Putin têm mais a ver com o controlo da Rússia pelo Ocidente e pelos liberais. Se a Rússia se portasse como a Arábia Saudita, o Egipto, Marrocos, Bahrein ou EAU, já não haveria problema. Mas a Russia não deixou os Americanos lá mandarem (ainda resquícios culturais da URSS?) e agora são apelidados de ditadores. Lembro os Estados Unidos do Mcartismo e da caça às bruxas, com as suas prisões arbitrárias e a supressão do Partido Comunista, bem como as perseguições a muitos movimentos civis de esquerda, tal não os impedia de se considerarem um país democrático. É que a democracia não tem a ver só com eleições, é algo de muito mais profundo. Tem a ver com governo do povo e para o povo e isso não se consubstancia apenas com eleições. Agora, a democracia dos EUA é apenas a liberdade de enriquecer, concentrar riqueza e submeter o interesse publico e do povo ao interesse dos mercados e do capital. É isto que é a liberdade e a democracia para o ocidente. Daí que, se o povo Russo não se deixar dominar, economicamente, pelo Ocidente, pode estar no caminho da liberdade colectiva e consequentemente no caminho da democracia. Putin não tem menos legitimidade do que outro passos coelho qualquer, num modelo democrato-liberal em que só dois partidos governam sempre no interesse dos mesmos. O resto...São detalhes.