Texto de Pedro Sousa Pereira publicado na Lusa:
"O livro do historiador José Milhazes “Cunhal, Brejnev e o 25 de
Abril” publica documentos sobre a “falta de autonomia” do PCP face a
Moscovo, os financiamentos e a forma como a URSS “impediu” a revolução
portuguesa.
“Estamos na época do Acordo de Helsínquia, assinado em
agosto de 1975, e a União Soviética não queria que Portugal fosse um
motivo para que falhasse a reunião de Helsínquia e que fosse posta em
causa a política de desarmamento e de desanuviamento que então tinha
lugar”, disse à Lusa José Milhazes, que apresenta, no próximo dia 13, o
livro “Cunhal, Brejnev e o 25 de Abril”.
O livro inclui
documentação soviética, depoimentos de protagonistas e testemunhos sobre
as relações entre o PCP e Moscovo e o papel da URSS durante o processo
revolucionário português.
“Os soviéticos compreendiam que, se os
comunistas tentassem tomar o poder em Portugal, a NATO e os Estados
Unidos iriam reagir e Portugal iria mergulhar numa guerra civil bastante
sangrenta”, acrescenta Milhazes, sublinhando que o então
secretário-geral do Partido Comunista Português, Álvaro Cunhal
(1913-2005), não dispunha de independência política em relação ao
Kremlin, o que “impediu” qualquer ação dos comunistas portugueses no 25
de Novembro de 1975.
“Eu penso que publico elementos suficientes
para provar que Álvaro Cunhal não era um político autónomo. Antes de
tomar uma decisão importante, Cunhal ‘aconselhava-se’. Ou seja, pedia
autorização aos soviéticos. Há uma declaração de um ex-agente do KGB que
falou com Cunhal depois de 1975 em que Cunhal reconhece essa ideia - de
que o PCP não era autónomo”, explica o correspondente da Lusa em
Moscovo.
"Há efetivamente documentos que permitem ver que o 25 de
Novembro terminou como terminou, o PCP não recorre às armas porque foi
terminantemente proibido pela União Soviética", explica, sublinhando a
dependência política do então secretário-geral do partido em relação ao
Kremlin.
“Cunhal nunca criticou Moscovo. Não existe uma crítica em
relação à política do Partido Comunista da União Soviética. Seja na
questão da Checoslováquia, seja na questão da Polónia. Além disso, e no
livro isso também fica claro, o PCP recebia grandes financiamentos dos
soviéticos, que investiam dinheiro em preparação de quadros, em
fornecimento de tecnologia de segurança e espionagem ao PCP. Eram formas
de Moscovo pagar pela fidelidade do PCP”, afirma Milhazes.
De
acordo com depoimentos e documentos publicados pelo historiador, o PCP
recebeu dinheiro da União Soviética para vários fins, como por exemplo,
organizar na Península Ibéria campanhas contra a energia nuclear.
“Mandavam
dinheiro e os comunistas portugueses organizavam manifestações de
protesto”, refere Milhazes, que sublinha que o PCP não era a única
organização política que recebia fundos de Moscovo após o 25 de Abril.
“O
Movimento Democrático Português (MDP-CDE) também estava entre os
beneficiários. Pelo menos uma vez, em março de 1978, o movimento
dirigido então por José Tengarrinha recebeu 25 mil dólares, e também por
intermédio de Octávio Pato”, escreve Milhazes no livro (página 117),
referindo-se ao papel do antigo candidato presidencial do PCP, e membro
do Comité Central, como o dirigente “que recebia as doações soviéticas”
em Lisboa.
Os comunistas portugueses continuaram a receber
dinheiro soviético mesmo quando "já não escondiam" as críticas ao último
secretário-geral do Partido Comunista da União Soviética, Mikhail
Gorbatchov, que assinou a ordem de dissolução do PCUS em 1991.
“Nesse
ano, o PCP recebeu 700 mil dólares em três tranches. A primeira
prestação, datada de 19 de janeiro, foi no valor de 350 mil dólares”,
refere o livro “Cunhal, Brejnev e o 25 de Abril” (página 116), que cita
igualmente documentação do Comité Central do Partido Comunista da União
Soviética (PCUS) sobre o financiamento de Moscovo aos partidos
comunistas em vários países.
“A política soviética em relação ao
PCP neste campo correspondia perfeitamente ao provérbio russo: ‘Quem
paga encomenda a música’”, escreve o historiador e jornalista português
residente em Moscovo desde os anos 1970.
Além da questão do
financiamento, o autor do livro pretende também apresentar provas de que
parte do arquivo da PIDE-DGS foi levado para Moscovo, "numa operação
conjunta" dos serviços secretos soviéticos e do Partido Comunista
Português.
“Cunhal, Brejnev e o 25 de Abril – Como a União
Soviética não quis a revolução socialista em Portugal”, de José Milhazes
(Editora D. Quixote, 205 páginas) é apresentado na Póvoa de Varzim no
dia 13 e no dia 24 em Lisboa".
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