sexta-feira, junho 23, 2017

País arde porque está podre


Enquanto não se olhar de frente e resolver problemas graves da sociedade portuguesa como corrupção, compadrio, carreirismo, incompetência política, Portugal continuará a ser devorado não só pelas chamas dos terríveis incêndios que consomem o nosso país todos os anos, independentemente da cor política dos nossos dirigentes.
Pedem-nos para não tirarmos conclusões apressadas sobre as causas do incêndio de Pedrógão Grande até que sejam apuradas as responsabilidades, mas quando é que isso será feito se durante anos e anos nunca o foi? Estão à espera que a época dos incêndios termine ou que a selecção portuguesa vença a Taça das Confederações, para voltarmos a pensar que somos os melhores?
Pode-se e deve-se começar já pois há razões que são endémicas. Uma delas é a corrupção. O Sistema Integrado das Redes de Emergência e Segurança de Portugal (SIRESP), que dizem ter falhado no início da tragédia, custou muito mais do que aquilo que valia na realidade, mas ninguém respondeu por isso ( https://www.publico.pt/2017/06/22/politica/noticia/siresp-a-historia-de-uma-parceria-publica-privada-de-transparencia-1776439).
A história da aquisição dos helicópteros Kamov seria surrealista se não fosse tão triste. Durante a memorável visita de José Sócrates a Moscovo em 2007, quando não se sabe graças a que favores ficou instalado no Kremlin e teve honras de joging na Praça Vermelha, eu assisti à ida do então primeiro-português a um aeródromo nos arredores russos para ver os famosos Kamov e ainda o avião gigante Beriev 200.  Segundo a Agência Lusa, Portugal adquiriu seis novos helicópteros pesados Kamov-32 (http://noticias.sapo.pt/lusa/artigo/6+11S9nvyfblb4F0Cb0H0A.html). Quando ao Beriev 200, só se voltou a falar nele quando precisámos de o alugar à Rússia para combater os incêndios. No que respeita aos Kamov, os fumos de corrupção acompanharam sempre a presença desses aparelhos em Portugal (https://ionline.sapo.pt/481711?source=social).
Os helicópteros comprados à Rússia em 2006 tornaram-se polémicos desde o início. E em vez de servirem para poupar, serviram para gastar. São os helicópteros ...


Coincidência ou não, as empresas russas têm um certo “azar” no que diz respeito aos investimentos no combate aos incêndios em Portugal. A NGCR – Tecnologias Químicas e Inovações, SA, é um bom exemplo disso. A 18-09-2013, os seus responsáveis russos prometeram investir cerca de 2 milhões de euros em Oleiros, em Castelo Branco, e criar cerca de 100 postos de trabalho para fabrico de «equipamentos de combate a incêndios, máquinas para obter poupança de energia em termos industriais e aparelhos para o tratamento de águas residuais».
Porém, no ano seguinte, o investidor russo desiste do investimento alegando alguns argumentos puramente inventados. Fernando Marques Jorge, presidente da Câmara de Oleiros, justificava o fracasso:  “a empresa não conseguiu trazer os equipamentos necessários para Portugal por causa do boicote da União Europeia (UE) à Rússia devido ao conflito na Ucrânia”. A primeira parte da explicação até pode ser verdade, mas é falsa a afirmação de Fernando Marques Jorge de que uma das fábricas que produzia os componentes que vinham para Oleiros se encontrava junto à fronteira com a Ucrânia e foi destruída (https://beiranews.pt/2015/04/oleiros-procura-novos-investidores-depois-de-gorada-instalacao-de-empresa-russa/). O autarca deve ter sido mal informado pela parte russa pois, quando da anexação da Crimeia e da invasão do Leste da Ucrânia,  não foi noticiada a destruição de qualquer edifício industrial no território russo.
Não se limitando ao “negócio aos incêndios”, a corrupção abrange praticamente todas as esferas políticas e sociais portuguesas, pondo cada vez mais em causa a própria segurança do Estado. E isto é ainda mais preocupante quando olhamos para o funcionamento da Justiça em Portugal. É difícil compreender como é que banqueiros, políticos e outros acusados do desvio de milhões de euros continuem em liberdade. As desgraças acontecem, mas continua tudo na mesma.
Porém, quando se fala da corrupção, não podemos fechar os olhos ao facto de muitos dos cidadãos consentirem e incentivarem essa praga. Nas próximas eleições autárquicas arriscamo-nos a ver o regresso ao poder local de políticos manchados pela corrupção.
E, para aumentar as dimensões da tragédia, surgem notícias que nos deviam deixar envergonhados: casas evacuadas que são pilhadas por "animais humanos" e "pessoas" que tentam ganhar dinheiro com a solidariedade dos portugueses. Não quero apelar a linchamentos, mas o ateamento de incêndios e as pilhagens deveriam ser equiparadas ao terrorismo.
Se a situação não mudar radicalmente, se muitos dos políticos continuarem a servir-se da nação e não a servi-la, se chagas como a corrupção, o compadrio continuarem a aumentar, Portugal apodrecerá ainda mais e arderá ainda mais rapidamente.
Não devo ter dito nada de novo, mas é o que eu penso. 

N.B. Para que não me chamem russófobo e outras coisas semelhantes a que já me habituei, explico que peguei nos casos de possível corrupção que melhor conheço.





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