Familiares das vítimas do massacre querem ver também as forças de segurança russas no banco dos réus
O Supremo Tribunal da Ossétia do Norte, república caucasiana da Federação da Rússia, condenou ontem a prisão perpétua Nurpacha Kulaiev, que as autoridades dizem ser o único sobrevivente do comando terrorista que perpetrou, em Setembro de 2004, um ataque à Escola Nº 1 de Beslan. Balanço do massacre: 331 mortos, entre os quais 186 crianças.
Kulaiev foi considerado culpado de terrorismo, assassínio, tentativa de assassínio de membros das forças de segurança e sequestro. O tribunal começou por considerar que o réu merecia ser condenado à morte, mas depois optou pela prisão perpétua, visto que a pena capital é objecto na Rússia de uma moratória desde 1992.
Nikolai Chepel, chefe adjunto do Ministério Público, que dias antes se manifestara a favor da pena de morte, anunciou que não recorrerá da sentença. Considerou-a "satisfatória".
O advogado do condenado já anunciou, porém, que irá recorrer da sentença para instâncias judiciais superiores, para o que dispõe de dez dias. "Durante o julgamento não foram apresentadas provas sobre a participação do meu cliente nos crimes de que o acusam", declarou. Kulaiev, por sua vez, considerou que o julgamento, iniciado a 17 de Maio de 2005 e durante o qual foram ouvidas mais de 300 dos antigos reféns, não passou de um "conto inventado".
Após a leitura da sentença, várias mães e familiares das vítimas do massacre de Beslan dirigiram-se ao arguido, tentando agredi-lo. Nas imediações do tribunal, em Vladikavkaz, capital da Ossétia do Norte, viveram-se cenas de histeria, também com tentativas de agressão aos jornalistas.
Um "bode expiatório"
Ella Kessaieva, dirigente da Voz de Beslan, uma das associações que reúne os familiares das vítimas, considerou "correcta" a sentença. "Não desejamos a pena capital nem para o Presidente russo", afirmou. Na sua opinião, Kulaiev é um "bode expiatório" das autoridades. "Apelaremos ao Supremo Tribunal da Rússia para continuar o processo e, se necessário, recorreremos ao Tribunal de Estrasburgo", sublinhou. "O Ministério Público apenas quis pôr fim à investigação e virar a página, mas nós queremos que se castigue os que geriram a crise."
Pelo seu lado, as Mães de Beslan, outra organização de familiares das vítimas, criticaram a sentença por a considerarem suave de mais: "Kulaiev devia ter o que merecia e agora continuará a respirar o ar que nós respiramos."
Contradições
A 1 de Setembro de 2004, no dia da abertura do ano escolar na Rússia, um comando terrorista tomou de assalto a Escola Nº 1 de Beslan e fez 1127 reféns, a maioria dos quais mulheres e crianças. Depois de 52 horas de sequestro, uma explosão no interior do edifício (que a versão oficial diz ter sido acidental) desencadeou uma desorganizada operação de resgate - morreram 318 reféns, três socorristas e dez agentes do Serviço Federal de Segurança.Familiares das vítimas de Beslan denunciaram que o detonador da operação foi a explosão de um projéctil disparado pelas forças russas contra a escola, e que as autoridades desde o início enveredaram por uma solução violenta para a crise.
Na quarta-feira, o deputado Iuri Saveliev, que é membro da Comissão Parlamentar para Beslan, declarou que as tropas especiais usaram armamento pesado contra o edifício quando ali ainda se encontravam reféns, o que contradiz a versão oficial.
A Voz de Beslan exige que se processe, "por incompetência criminosa", os membros do gabinete de crise criado para enfrentar o sequestro e se responsabilize os responsáveis das forças de segurança por não terem sabido impedi-lo.
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