quinta-feira, janeiro 18, 2018

Não humilhem mais a democracia




As eleições do novo dirigente do PSD mostraram que o escrutínio foi realizado com ilegalidades tão flagrantes que apenas podem desacreditar ainda mais o actual regime político e ferir a legitimidade de Rui Rio. Isto se ainda resta alguma vergonha aos políticos e eleitores.

Não sou militante do PSD, não tenho simpatias especiais por nenhum dos candidatos, mas já sei que, nas próximas eleições, terei menos possibilidade de opção consciente e cívica. Depois de ver a forma como decorreu a campanha eleitoral e a votação, tenho dúvidas de que algum dia irei votar em Santana Lopes ou Rui Rio numas eleições nacionais.

Enquanto decorriam debates acesos mas pouco claros e construtivos entre os dois candidatos, surgiam notícias de que estavam a ser feitos pagamentos de quotas à pressão para aumentar o número de militantes do Partido Social-Democrata que pudesse votar. O Observador denunciou que “nesta eleição, as provas do tradicional caciquismo abundaram. Desde logo, o pagamento massivo de quotas nas últimas horas: a 15 de dezembro, antes do fecho dos cadernos eleitorais, no último dia para o pagamento de quotas, havia cerca de 50 mil inscritos, segundo a sede nacional do PSD; nos momentos derradeiros foram saldadas mais de 20 mil quotas e os militantes ativos dispararam para mais de 70 mil. A quota é de 1 euro mensal, 12 euros por ano” ”( http://observador.pt/especiais/video-como-os-caciques-de-ovar-angariaram-votos-para-rio/).

Não li nem ouvi qualquer tipo de desmentido, embora se trate de uma violação clara das regras democráticas, que não pode ser justificada por argumentos do tipo “noutros partidos fazem o mesmo”.

Mas a batota não ficou apenas por aí. O mesmo texto publicado pelo Observador é acompanhado de um vídeo que mostra a forma como venceu Rui Rio em Ovar. Nesta situação, o mínimo que se exige é uma investigação deste caso de flagrante caciquismo e, se se constatar que os episódios descritos são verdadeiros – pessoalmente, não tenho dúvidas de que são -, repetir o escrutínio pelo menos nas regiões onde foram detectadas acções ilegais e, no máximo, repetir a eleição com toda a transparência e legalidade. O PSD e a democracia portuguesa só ganhariam com isso.

Durante os muitos anos que vivi na Rússia, tive a oportunidade de assistir a eleições e, principalmente durante a era de Vladimir Putin, que já dura há mais de 17 anos e sem fim à vista, tive a oportunidade de assistir a esse tipo de truques para não só aumentar a afluência às urnas, mas destacar a “popularidade crescente” dos líderes russos.

Quando isto acontece em regimes como o de Vladimir Putin, são muitas as vozes que justamente se levantam para criticar a “democracia soberana”, mas o mesmo não deverá ser válido para as eleições de dirigentes partidários portugueses? Será que voltámos ou nunca saímos da política de “dois pesos, duas medidas”?

A credibilidade dos actuais partidos políticos portugueses já não é grande e certamente que não aumentará com dirigentes partidários eleitos da mesma forma como foi eleito Rui Rio.

Os partidos políticos deveriam ser escolas da democracia, mas, pelos vistos, parecem ser mais universidades de caciquismo, clientelismo, batota e corrupção. Penso que não vale a pena enumerar exemplos, pois arriscar-me-ia a ocupar demasiado espaço.

Mas os eleitores portugueses têm também sérias responsabilidades nesta situação, pois os políticos que temos, graças a Deus e à democracia, não nos são impostos por ninguém, somos nós que os escolhemos livremente.   



P.S. Recorri ao exemplo de “eleições livres” na Rússia não porque pretenda denegrir o Presidente Putin (os russos que resolvam os seus problemas internos), mas porque é o país que melhor conheço. Mas poder-se-ia recorrer a outros exemplos como a realização de eleições na Ucrânia, onde, pela primeira vez na história, se realizou, em 2004-2005, uma terceira volta para se eleger um Presidente.

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