quarta-feira, junho 28, 2006

Estudantes guineenses abandonados em Moscovo




Setenta e cinco estudantes da Guiné-Bissau, alunos da Universidade Amizade dos Povos (Patrice Lumumba) de Moscovo, terminaram os seus cursos, mas não podem regressar ao seu país porque o Governo guineense não honra os seus compromissos financeiros perante aquele estabelecimento de ensino.
Bissau deve à Universidade de Amizade dos Povos, onde estudam alunos de numerosos países do chamado "Terceiro Mundo", cerca de 270 mil euros pelos estudos de dezenas de alunos guineenses. Como o dinheiro não chega e a dívida aumenta rapidamente, a direcção daquela escola superior russa deixou os 75 finalistas da Guiné-Bissau terminarem os seus cursos, mas já anunciou que não entregará o diploma aos alunos (apenas darão uma fotocópia desse documento), nem lhes facultará o bilhete de regresso ao país, enquanto as contas não forem acertadas.
Além disso, mais umas largas dezenas de estudantes guineenses em universidades de várias cidades não recebem, há cerca de sete meses, um tostão de bolsa de estudo, o que os obriga a passar dificuldades extremas.
Revoltados, cerca de 40 estudantes reuniram-se à porta do edifício onde se encontra a Embaixada da Guiné-Bissau na capital russa, para exigirem que o Governo guineense resolva rapidamente os problemas. Caso contrário, as autoridades estudantis russas ameaçam também expulsar das residências os alunos cujos países tiveram dívidas para com as universidades.
Desta vez, não conseguiram entrar no edifício onde se encontra a embaixada, pois a segurança tomou medidas para impedir que os estudantes ocupassem a representação diplomática guineense, como já aconteceu no Inverno passado. O embaixador da Guiné-Bissau, Roberto Herbert, apenas aceitou receber quatro alunos em representante dos manifestantes.
No fim do encontro, Hussain Simões Pereira, um dos dirigentes dos estudantes, informou-nos que o embaixador teria dito que "não tinha conhecimento de qualquer dívida à universidade e iria estudar o caso", coisa em que os jovens guineenses não acreditam, porque mostraram-nos uma carta que a Universidade teria enviado à Embaixada a comunicar a dívida das autoridades guineeenses para com ela.
Os estudantes guineenses prometem não desistir da luta e voltar para conversar com o embaixador, que também é conhecido no mundo diplomático por não possuir meios financeiros à representação digna do seu país na Rússia.
Perante isto, colocam-se duas perguntas: como é que a Rússia, que já não ajuda por "internacionalismo proletário" e diz agir segundo as normas do mercado, ainda aceita alunos de países mergulhados na pobreza e na corrupção, que se sabe que não se irão preocupar com os seus cidadãos? Será que algum dia regimes corruptos como o da Guiné-Bissau terão vergonha pela situação difícil em que colocam os seus cidadãos?
Depois não é de espantar que seja alto o número de estudantes africanos e de outros países do chamado "Terceiro Mundo" nas prisões russas. A principal causa é o tráfico de estupefaciantes.

1 comentário:

Ivo Rafael Silva disse...

Perante isto, colocam-se duas perguntas: como é que a Rússia, que já não ajuda por "internacionalismo proletário" e diz agir segundo as normas do mercado, ainda aceita alunos de países mergulhados na pobreza e na corrupção, que se sabe que não se irão preocupar com os seus cidadãos? Será que algum dia regimes corruptos como o da Guiné-Bissau terão vergonha pela situação difícil em que colocam os seus cidadãos?

Perante estas "pertinentes" questões levantadas pelo José Milhazes, eu gostaria de levantar outras questões e sob diferente perspectiva:

- Será que não é essa "regra de mercado" que incentiva a que um país dito de "corrupção" como a Guiné-Bissau tenha relações com outro país de "pobreza e corrupção" como a actual Rússia? Ou será que esta Rússia que fugiu do "internacionalismo proletário" é agora o melhor exemplo de país "não corrupto"? É esta a realidade actual? Uma Rússia "limpa" permissiva a "sujos"? Será mesmo assim?

Parabéns ao autor deste blog. Um magnífico trabalho de jornalismo de qualidade.