segunda-feira, outubro 09, 2006

Kremlin manda investigar morte de jornalista




A oposição liberal juntou cerca de três mil pessoas numa manifestação em memória de Anna Politkovskaia no centro de Moscovo

Perante a contundente reacção interna e internacional ao assassinato de Anna Politkovskaia, o Kremlin encarregou o Procurador-Geral da Rússia, Iuri Tchaika, de chamar a si o "controlo pessoal" da investigação. O jornal com o qual a jornalista colaborava irá tentar apurar a verdade pelos seus próprios meios.
A Procuradoria analisa várias versões, todas ligadas à actividade profissional daquela que era considerada uma das vozes mais incómodas para o Kremlin, e que foi abatida no sábado, no interior do prédio onde residia. Uma versão conduz à "pista tchetchena" e outra está relacionada com o facto de alguns artigos de Politkovskaia terem conduzido a investigações judiciais contra militares russos por abusos cometidos na Tchetchénia.
A televisão mostrou uma gravação da câmara de vigilância do prédio onde residia a jornalista, onde se vê um homem alto, de boné de baseball, a entrar no edifício depois de Politkovskaia. Mais tarde, foi divulgada uma foto-robot do presumível assassino.
Porém, os colegas do bissemanário Novaia Gazeta, onde Anna publicou muitos dos seus trabalhos desde 1999, não confiam na eficácia das autoridades policiais e avançam para uma investigação independente.
Segundo eles, a jornalista preparava um artigo sobre as torturas sistemáticas na Tchetchénia a publicar hoje no bissemanário. "Por enquanto, não temos as notas nas nossas mãos, mas sabemos que existem testemunhos e fotografias", assegurou Vitali Iarochevski, redactor-chefe-adjunto, acrescentando: "A experiência de outras investigações confirma que podemos conseguir mais informação que os órgãos de segurança. Simplesmente eles não têm as fontes com que nós contamos".
Os donos do jornal, entre os quais se encontra o ex-Presidente Mikhail Gorbatchov, prometem um prémio de 700 mil euros a quem der informações que permitam descobrir os autores do crime.
Na sua página na Internet, o bissemanário assegura que "ou se tratou da vingança de Ramzan Kadirov [primeiro-ministro do governo tchetcheno pró-russo], sobre quem Politkovskaia escrevia frequentemente, ou dos que querem que as suspeitas recaiam sobre ele".
"Quero sublinhar que, não obstante os artigos de Politkovskaia sobre a Tchetchénia nem sempre terem tido um carácter objectivo, tenho, sincera e humanamente, pena da jornalista", respondeu Kadirov às acusações.
Manifestações em Moscovo
A oposição liberal russa juntou, segundo as agências russas, cerca de três mil pessoas numa manifestação em memória da jornalista no centro da capital. Os organizadores da concentração pretendiam protestar contra a política xenófoba do Kremlin face aos georgianos residentes na Rússia, mas as atenções centraram-se no crime contra Politkovskaia. "O Kremlin assassinou a liberdade de imprensa!", "O poder matou Politkovskaia!", lia-se em cartazes transportados por manifestantes.
"O assassinato da jornalista é um desafio directo ao poder e pessoalmente ao Presidente russo", disse o deputado liberal Vladimir Rijkov, sublinhando que "o rasto dos assassinos pode conduzir à Tchetchénia, a Beslan, ao teatro Nord-Ost e às mais altas esferas do poder".
O crime foi também condenado por numerosos países e organizações internacionais. Terry Davis, secretário-geral do Conselho da Europa, exigiu uma "urgente investigação" da morte da jornalista, apelo secundado pela União Europeia e pelo Governo dos Estados Unidos.

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