Amanhã, na cidade finlandesa de Lahti, realiza-se uma reunião de dirigentes dos países-membros da União Europeia, onde, entre outras coisas, eles deverão tentar elaborar uma política comum face à Rússia no campo da energia. Matti Vanhanen, primeiro-ministro da Finlândia, país que preside à UE, e Durão Barroso, presidente da Comissão Europeia, lançaram um apelo para que “se fale a uma só voz”.
O Presidente da Rússia, Vladimir Putin, está convidado para um jantar com os dirigentes dos países da UE, onde o “prato principal” será a discussão da cooperação bilateral no campo da energia. A conversa poderá ser extremamente “indigesta”, porque os sinais que partem de Moscovo são preocupantes e o Kremlin continua a apostar no aproveitamento das divisões internas na UE para realizar a sua política no campo da energia.
Claro que Vladimir Putin tem reafirmado que o seu país jamais falhará no cumprimento dos contratos assinados, mas a União Europeia não esqueceu o conflito entre a Rússia e a Ucrânia, ocorrido no início do ano, quando Moscovo simplesmente “fechou a torneira” dos seus gasodutos.
As divergências entre a Rússia e a UE são várias. Por um lado, a União Europeia quer obter as garantias máximas dos fornecimentos de petróleo, gás natural e carvão, que são feitos, em medida considerável, pela Rússia. Este país fornece 40% do gás, 32% do petróleo e 17% do carvão que a União Europeia consome. Em segundo lugar, a UE pressiona Moscovo para que ratifique a Carta da Energia, documento que prevê, entre outras coisas, o acesso das empresas ocidentais aos gasodutos e oleodutos russos, a garantia dos investimentos estrangeiros na economia russa.
Porém, estes princípios vão contra a política do Kremlin no campo da energia. O princípio do comércio livre do gás, por exemplo, vai contra a política da Gazprom, a empresa monopolista russa no campo da exportação do gás, que prefere concluir contratos de fornecimento a longo prazo e defende a manutenção do seu poder absoluto sobre os gasodutos no território da Rússia. Além disso, Moscovo exige que a carta inclua também a regulação do comércio de materiais nucleares.
“A Carta de Energia é um tema esgotado, a UE revela falta de sensibilidade na aceitação dos nossos argumentos, já foram gastas demasiadas horas a provar a posição russa” – declarou Serguei Iastrjembski, político que, no Kremlin, responde pelas relações com a UE, e deixa no ar um aviso: “se a Rússia não está pronta para ratificar a carta na sua redacção actual, é preciso começar a alterar as fórmulas que não aceitamos, não há outra hipótese”.
Além disso, Iastrjembski sublinha que a cooperação avança mesmo sem a assinatura da carta, porque a Rússia consegue acordos com membros separados da União Europeia: a construção do Gasoduto do Norte da Europa, projecto russo-alemão, ou do oleoduto Burgas-Alexandropulus, obra a realizar por empresas russas, búlgaras e gregas.
Moscovo tem conseguido criar, desse modo, brechas profundas na UE e mal-estar em países vizinhos como a Polónia ou os Estados Bálticos: Letónia, Lituânia e Estónia. Os recentes acordos de empresas alemãs com Moscovo, por um lado, e as ameaças do Kremlin de suspender as licenças de exploração de vários projectos de empresas britânicas, holandesas e francesas agudizaram essas divergências.
Isto é tanto mais preocupante, porque a União Europeia, a várias vozes, não tem grandes alavancas de pressão sobre a Rússia. É ideia reinante no Kremlin que o país é capaz de desenvolver o campo energético sem a participação estrangeira. Um sinal disso é a recente decisão de Moscovo de não abrir à participação internacional a exploração do gigantesco jazigo de gás de Shtokman, no Oceano Glaciar Árctico.
Porém, a União Europeia, unida, pode fazer lembrar a Vladimir Putin que sem o seu apoio a Rússia não poderá ingressar na Organização Mundial do Comércio. Bruxelas tem também de incentivar a procura de fontes de energia alternativas, bem como apostar nas novas energias. Além disso, deve sublinhar que assim como a UE dificilmente poderá viver sem o petróleo e gás russos, também a Rússia não terá vida fácil sem o mercado europeu. A ameaça de Putin de que o gás e o petróleo russos poderão ser desviados para a Ásia constituirá um “bluff” nos próximos dez-quinze anos, porque, para que isso aconteça, é preciso instalar milhares de quilómetros de tubos.
No jantar, os dirigentes da União Europeia poderão também querer abordar o problema das “limitações das liberdades democráticas” na Rússia, o assassinato da jornalista Anna Politkovskaia, os “dossiers nucleares” do Irão e da Coreia do Norte e as tensas relações entre a Geórgia e a Rússia.
Iastrjembski afirma que Vladimir Putin estará pronto a discutir “qualquer questão”, mas previne: “é difícil que tudo isso possa ser discutido em 2 horas e 15 minutos”.
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