quarta-feira, maio 16, 2007

Igrejas Ortodoxas russas põem fim a cisão


A Igreja Ortodoxa Russa do Patriarcado de Moscovo e a Igreja Ortodoxa Russa no Estrangeiro assinam na quinta-feira a Acta de União Canónica, pondo assim fim a uma das mais importantes cisões no seio dos cristãos ortodoxos russos.

A cerimónia de assinatura desse documento, em que participarão os chefes das duas Igrejas, o Patriarca de Moscovo Alexei II e o Metropolita Lavr, terá lugar no Templo de Cristo Salvador, na capital russa.

O Templo de Cristo Salvador, destruído a dinamite pelas autoridades comunistas em 1933 e reconstruído nos anos 90 do século passado, é o símbolo do renascimento da religião ortodoxa na Rússia.

Deste modo, os ortodoxos russos pretendem pôr fim a uma separação de mais de 80 anos.

A cisão entre as duas Igrejas ortodoxas ocorreu depois da revolução comunista de Outubro de 1917 da Rússia, quando as autoridades declararam o ateísmo como ideologia oficial e desencadearam uma perseguição implacável contra as religiões existentes no país.

Parte significativa do clero ortodoxo abandonou a Rússia e criou, em 1924, a Igreja Ortodoxa Russa no Estrangeiro (IORE), que excomungou o regime comunista. Os padres e metropolitas que ficaram no interior do país ou optaram por jurar fidelidade ao novo regime, considerando o novo poder “emanente de Deus” ou passaram à clandestinidade, criando a chamada Igreja Ortodoxa das Catacumbas.

As duas Igrejas estiveram de “costas viradas” até à chegada de Vladimir Putin ao Kremlin, no ano 2000. Porém, o Presidente russo deu um forte contributo para a sua aproximação.

“Desse modo serão simbolicamente superadas as consequências da Guerra Civil de 1918-1921, que dividiu o povo russo (e a Igreja Ortodoxa com ele) em “vermelhos” e “brancos”, nos que ficaram na URSS e nos que emigraram”- considera Pavel Krug, analista religioso do diário Nezavissimaia Gazeta, acrescentando: “Tudo isso se inscreve no “postmodernismo ideológico” da Rússia da época de Vladimir Putin, onde as estrelas vermelhas vizinham pacificamente com as águias bicéfalas imperiais no Kremlin”.

“Sem dúvida que a união se realizaria de uma forma ou outra. Mas quando Vladimir Putin se envolveu neste processo, a sua atitude bondosa tornou-se uma espécie de garantia. Ela contribuiu para eliminar a tensão, garantiu uma série de condições externas para um diálogo fértil, sem se imiscuir nele” – declarou Mark, arcebispo de Berlim e da Alemanha da Igreja Ortodoxa Russa no Estrangeiro.

Porém, esta união não está a ser bem recebida por todos os sectores da Igreja Ortodoxa Russa no Estrangeiro, tanto mais que não foram eliminadas todas as divergências com Moscovo. Por exemplo, a IORE exige que o Patriarcado de Moscovo abandone o Conselho Mundial das Igrejas, movimento ecuménico internacional, considerando o ecumenismo uma “heresia”.

Além disso, alguns sectores da IORE exigem que a Igreja Ortodoxa Russa faça um “acto de contrição público” pela “colaboração com o regime comunista ateu”.

Porém, a maioria dos analistas religiosos consideram que a assinatura da Acta da União Canónica constituirá mais um passo para o reforço da Igreja Ortodoxa na sociedade russa.

1 comentário:

A. Stáritsin. disse...

Em primeiro queria dar os parabéns ao autor do blogue, meu conhecido de há muito, desde os tempos da Universidade de Moscovo, pelo magnífico trabalho.
Permitam-me um comentário sobre este post.
Em primeiro lugar, sobre as datas:
Os comunistas e os seus órgãos repressivos, ou seja a Tcheka (e, respectivamente, o NKVD, o KGB, o FSB) foram anatematizados ainda no tempo do Patriarca Tikhon, na sua mensagem pastoral de 19 de Dezembro de 1918, que os apelidou de “verdugos do género humano”.
A primeira sessão da Alta Administração da Igreja Russa fora das fronteiras da Rússia teve lugar a 6 de Novembro de 1920 em Constantinopla. A 9 de Junho de 1921 foi realizada a sessão da Alta Administração na cidade de Sremski Karlovtsy, no então Reino Sérvio-Croata-Esloveno. A 13 de Setembro de 1922, o Concílio de Bispos no estrangeiro, de acordo com o decreto do Patriarca Tikhon, extinguiu a Alta Administração da Igreja Russa fora das fronteiras e criou o Sínodo de Bispos da Igreja Ortodoxa Russa no Estrangeiro (IORE).
O Patriarcado de Moscovo é um fruto do regime soviético e muitos dos seus bispos pertenceram (e, sem qualquer dúvida, pertencem) ao KGB/FSB. O Patriarcado de Moscovo precisa da Igreja Ortodoxa Russa no Estrangeiro para confirmar a sua legitimidade, que não possui e que depende não do reconhecimento ou não-reconhecimento por parte de outras igrejas mas sim dos cânones da Igreja e da correcta continuidade apostólica.
O Patriarcado de Moscovo nasceu ideologicamente depois da declaração do metropolita Sergui Stragorotski de 1927 mas “legalmente” só começou a existir depois da autorização-ordem de Estaline de 4 de Setembro de 1943, tendo sido organizada pelo NKVD no prazo de duas semanas de “concílio”, no qual o metropolita Sergui foi elevado a “patriarca”. O Patriarcado de Moscovo foi criado por Estaline neste “concílio” formado por um grupelho de três renegados da Igreja leais ao regime soviético: o metropolita Sergui Stragorotski, o metropolita Alexei Simanski e o metropolita Nikolai Iaruchevitch. Este grupo cresceu, como se costuma dizer, como cogumelos depois da chuva, atingindo uma dimensão mundial. O Patriarcado de Moscovo é um filho ilegítimo, nascido da relação ilegítima entre o metropolita Sergui e o ditador ateu Estaline, que este utilizou para fins de propaganda.
Passo a citar uma carta de Konstantin Preobrajenski, antigo agente do KGB refugiado actualmente nos EUA, ao padre Viktor Potapov, um dos padres que, por ingenuidade ou conscientemente, escolheram a traição à IORE, oferecendo a sua igreja ao Patriarcado de Moscovo, ou melhor, à filial do KGB/FSB.
«Uma excessiva aproximação à Rússia soviética nunca trouxe felicidade aos ortodoxos que vivem nos EUA.
De facto, é difícil imaginar uma prenda pior para os adeptos da união da IORE com a ’igreja vermelha’. Acontece que nós unimo-nos ao KGB não só como serviço secreto, ao que já estamos habituados, mas como um bando de assassinos, facto que os representantes oficiais americanos encaram com grande suspeita.
O momento não é o melhor. Recentemente, os serviços secretos de Putin levaram a cabo uma série de assassínios políticos e atentados, nomeadamente em Londres e Washington. Muitos dos paroquianos ficaram na dúvida: será que vale a pena unirmo-nos a um país tão perigoso?
Para dizer a verdade, entre os seus conhecidos há uma pessoa a quem o título de ‘agente do KGB’ assenta como uma luva. Trata-se do patriarca Alexei Ridiguer. Porque é que não se afasta dele com repulsão? Peço-lhe que se afaste! Ele não é digno da sua amizade. Ele trair-vos-á na primeira oportunidade…. Melhor será irmos os dois ao Congresso americano e apresentar um relatório sobre como a KGB se infiltra nos EUA a coberto do Patriarcado de Moscovo. Acredito que os dois teremos muito que contar!
Afinal com que se “reunifica” a Igreja Ortodoxa Russa no Estrangeiro – com o Patriarcado de Moscovo ou com Putin? Com Putin, precisamente com ele, a figura principal do império do KGB por ele criado. Então reconheçamos que esta operação não é da Igreja mas sim do Estado, é uma operação estratégica. Reconheçamos que o Patriarcado de Moscovo desempenha aqui o papel de ‘cortina de fumo’, papel que sempre exerceu para o poder soviético.
Aliás, a própria parte russa o reconhece, às vezes inadvertidamente. Por exemplo, a ‘União de Cidadãos Ortodoxos”, depois de uma das minhas publicações, acusou-me de minar os interesses estratégicos da Rússia, interesses que não são de maneira nenhuma da Igreja. Pela lógica deles, o senhor, pelo contrário, reforça os seus interesses na América. Sendo o senhor um cidadão americano, como se coaduna tal com o seu patriotismo?» Fim de citação.
Podemos afirmar que os bispos, sacerdotes e leigos traidores da Igreja Ortodoxa Russa no Estrangeiro que passaram a sujeitar-se ao Patriarcado de Moscovo, sem o arrependimento deste último, já não são membros da IORE. A antiga Igreja Ortodoxa Russa no Estrangeiro continuará a existir e a testemunhar a verdade até ao total arrependimento dos dirigentes do Patriarcado de Moscovo pelas arbitrariedades passadas e presentes. É esta a sua profética missão. Uma coisa é certa: a actual assinatura da Acta de União Canónica irá afastar ainda mais no tempo o arrependimento do Patriarcado de Moscovo, se não for até ao dia do Juízo Final. É pena.
Podemos, no entanto, felicitar os serviços secretos pela vitória sobre a “Igreja branca”, embora não seja uma vitória definitiva porque não conseguirão comprar todos nem enganar todos.
A. Stáritsin.