quarta-feira, agosto 15, 2007

Política externa do Kremlin sem floridos

Serguei Lavrov, ministro dos Negócios Estrangeiros da Rússia, defende que os problemas da União Europeia e da política europeia não poderão ser resolvidos sem a Rússia e acusa a UE de tentar recriar um cordão sanitário em volta do seu país.
Num artigo publicado na revista “A Rússia na política global”, Lavrov escreve: “os actuais problemas da UE e da política europeia em geral não poderão ser resolvidos à margem de relações construtivas e viradas para o futuro com a Rússia, que se devem basear na confiança mútua”, sublinhando que “isso deverá corresponder também aos interesses dos Estados Unidos”.
Segundo o ministro russo, na Europa, “durante demasiado tempo dominou a política de blocos, baseada na lógica da contenção e, agora, vemo-nos perante uma situação que só dificilmente poderá ser interpretada de outra forma que não a recriação de um cordão sanitário na parte ocidental das fronteiras da Rússia”.
“O favoritismo nessa parte da Europa origina uma atmosfera doentia” – continua ele, e acrescenta: “Incentiva-se o aumento das disposições nacionalistas, que encerram em si uma ameaça à unidade do continente”.
“A Europa é ameaçada por uma situação absurda, quando ela deve financiar a sua própria divisão, tendo em conta a incapacidade da UE de influir na posição de uma série de novos membros obcecados pelo desejo de “conter” a Rússia, de conseguir uma espécie de desforra histórica” – defende Serguei Lavrov.
O ministro russo volta às críticas do alargamento da NATO e daqueles que defendem esse processo como necessário para “difundir a democracia”: “Semelhantes explicações servem apenas para ingénuos. Que relação com a democracia tem uma aliança militar-política que, no quadro da sua “transformação” aumenta consequentemente a quantidade de cenários do possível emprego da força?”
“A tese de que o ingresso na NATO é uma espécie de salvo-conduto para o “clube” dos estados democráticos é proclamada agora também para os países da Comunidade de Estados Independentes” – escreve Lavrov, acrescentando: “embora o critério de se um país passa o exame da “democraticidade” seja um: estar pronto a seguir atrás de uma política alheia”.
Serguei Lavrov defende o papel especial do seu país no espaço da Comunidade dos Estados Independentes (CEI): “ninguém duvida que a Rússia dispõe dos recursos fundamentais para manter, no espaço da CEI, a estabilidade sócio-económica e outra”. “A transição para os princípios da economia de mercado. O que poderá de forma mais convincente confirmar a nossa vontade de garantir relações normais entre Estados nesse espaço? – pergunta o chefe da diplomacia russa, e responde: “Há todas as condições para a cooperação da Rússia com o Ocidente na região, mas a cooperação deve ser igual, com respeito mútuo, nomeadamente em relação aos países da CEI que precisam de ajuda para consolidar o Estado, mas não fazer deles reféns do famigerado “jogo geopolítico do resultado nulo”.
Seria interessante ouvir o que a diplomacia da União Europeia, presentemente nas mãos de Portugal, tem a dizer sobre estas críticas da Rússia à sua política interna. Sim, porque a política entre a "velha Europa" e a "nova Europa" constitui um assunto interno da União Europeia. Moscovo sente-se em condições de dar conselhos a Bruxelas sobre a forma como gerir com os novos membros, ou seja, com os vizinhos da Rússia que se recusam a aceitar a política da "soberania limitada" e ousam criticar Moscovo.
Neste campo, é importante assinalar a parte do artigo onde Serguei Lavrov proclama, publicamente, o direito de o seu país dirigir os destinos dos países da Comunidade dos Estados Independentes. Novamente a política da "soberania limitada", iniciada por Brejnev e continuada por Putin, mas modernizada, adaptada aos tempos modernos. Se temos uma economia de mercado, então porque é que não somos nós a garantir a estabilidade social, económica e outra dos países da Comunidade dos Estados Independentes?
Concretamente, isto significa que a Rússia vai ser um jogador activo nas eleições parlamentares na Ucrânia, marcadas para 30 de Setembro. E o mais curioso é que os partidos pró-Moscovo, a bem ou a mal, irão conquistar a maioria dos lugares na Rada Suprema (Parlamento) da Ucrânia. Victor Ianukovitch, homem com uma biografia bastante duvidosa e falsificador das eleições presidenciais de 2004 na Ucrânia, arrisca-se a continuar a ser um Primeiro-Ministro respeitado.

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