segunda-feira, dezembro 10, 2007

Despede-se, mas não se vai embora


Como disse no post anterior, hoje, Vladimir Putin escolheu o seu sucessor no cargo de Presidente da Rússia, o que veio fazer com que as minhas atenções regressassem rapidamente dos Balcãs para Moscovo.
Aliás, preciso de fazer uma emenda à minha primeira afirmação, pois, pelo que lá está escrito, até parece que Putin é um czar autocrático. Não, as coisas, segundo as agências noticiosas russas, passaram-se de outra maneira. Os dirigentes de quatro partidos: Rússia Unida, Rússia Justa, Agrário e Força Cívica, juntaram-se, foram ao Kremlin e disseram ao Presidente russo: "trazemos aqui uma proposta da pessoa que o poderá substituir à frente dos destinos do país: trata-se de Dmitri Anatolevitch Medvedev".
Vladimir Putin gostou da proposta e respondeu: "Conheço-o há 17 anos e apoio total e completamente essa candidatura".
Afinal a Rússia é uma democracia ou não? À primeira vista, tudo está conforme as melhores tradições democráticas e constitucionais. As forças políticas que representam a esmagadora maioria dos povos da Federação da Rússia propõem ao Presidente o nome do seu sucessor no Kremlin.
Mas, talvez porque viva aqui há trinta anos e não me consiga livrar da "herança e tradições soviéticas" (se calhar, até comigo irão para o caixão), este episódio faz-me lembrar episódios da História Soviética como aquele em que os trabalhadores da fábrica ou os camponeses do kholkhoz X decidiram, na sua reunião, apresentar a candidatura de Estaline, Khrutchov, Brejnev, etc. para o cargo de deputado do Soviete Supremo da URSS. Os operários e camponeses podiam ser substituídos pelo "bloco dos comunistas e dos sem partido". Isto porque na União Soviética só havia um partido
Nos "países socialistas" da Europa do Leste, onde o monopartidarismo era mais camuflado, ao Partido Comunista (Operário) juntavam-se os partidos Agrário, Cristão, etc. para eleger o camarada A, B, ou C dirigente do país.
Hoje, a cerimónia no Kremlin pareceu-me um dejá-vu. Ao Partido Rússia Unida (uma reedição com as devidas emendas do Partido Comunista) juntou-se "o mais amplo leque de forças democráticas" para eleger um novo Presidente. A Rússia Justa não esconde que pretende substituir o Partido Comunista no flanco esquerdo, a Força Cívica foi criada pelo Kremlin para liquidar os partidos liberais: União das Forças de Direita e Iabloko e o Partido Agrário vem colorir a coligação com o apoio dos camponeses.
A escolha recaiu em Medvedev, considerado um político liberal, muito próximo de Putin (ver biografia a publicar a seguir), deixando de fora Serguei Ivanov, representante dos agentes dos serviços secretos que ocuparam o Kremlin. Mas estes deverão ser compensados. Diz-se que Ivanov poderá vir a ocupar o cargo de Primeiro-Ministro.
E Putin?
Não se preocupem, a resposta talvez esteja numa velha anedota soviética (outra vez este passado) sobre o judeu que foi fazer uma visita, mas depois "despedia-se, mas não saía". Ou seja, ele não deverá ficar muito longe do poder.
E se se concretizar a hipótese da criação do Estado unido da Rússia-Bielorrússia e Putin for eleito Presidente da nova união? Tudo encaixa bem: Putin, tal como Pedro o Grande, depois de pôr ordem em casa, vai mais longe e começa a reunificação dos territórios perdidos em 1991. Um cenário ideal...


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