Ao ler as memórias do príncipe russo Felix Iussupov, um dos homens que participou no assassinato de Gregori Rasputin, deparei com o facto curioso de esse russo estar ligado por fortes laços de amizade ao último rei português, D. Manuel II.
Não posso deixar de citar esta passagem curiosa das memórias: "Recordo-me como o rei português ficava surpreendido e indignado ao ver no meu apartamento uma Torre de Babel (a cena passa-se em Londres em 1920, quando no apartamento do príncipe russo viviam dezenas de pessoas que tinham fugido à revolução comunista de 1917). Ficou definitivamente furioso quando o sentei a jantar na casa de banho.
O rei Manuel não compreendia a desordem. E também não compreendia brincadeiras. Mas eu gostava de brincar com ele. Certo vez, tendo-o convidado para o jantar, decidi vestir Bull (secretário de Iussupov) com roupas de uma respeitosa dama de idade. Apresentei-a ao rei como minha tia surda que acabára de chegar da Rússia. Manuel ouviu atentamente, fez uma vénia e beijou a mão da "tia". Durante a refeição, eu ferrava os lábios para não me rir. O criado que nos servia sorria baixinho. Bull imitiva genialmente bem a "tiazinha", mas, de súbito, esqueceu-se, levantou uma taça de champanhe e gritou: "Viva Sua Alteza Portuguesa!" O rei não suportava surpresas daquelas. Ficou ofendido e não falou comigo durante um mês.
"Mal tinha acabado de ser perdoado, preguei mais uma partida, mas, desta vez, involuntariamente. Tendo sido convidado para um almoço no palacete de Manuel, cheguei muito atrasado. Depois de despir rapidamente o sobretudo e tirar o chapéu, entreguei-os a um sujeito que estava à porta, correndo depois pelo corredor para chegar à sala de visitas. O rei Manuel recebeu-me friamente. Eu balbuciei desculpas. Abriu-se a porta e fiquei contente ao ver que não tinha sido o último a chegar, mas entrou o sujeito para quem apressadamente tinha atirado o sobretiudo e o chapéu. Porém, Manuel foi ao encontro dele e, depois, virou-se para mim com as palavras: "Parece-me que ainda não te apresentei o meu tio, o duque do Porto".
"Estava pronto a desaparecer pelo chão abaixo. Mas sua excelência não ficou nada zangado por ter passado por criado. O tio, ao contrário do sobrinho, tinha sentido de humor".
6 comentários:
Comentário enviado por mail pelo leitor Rui Miguel: "Escrevo para congratulá-lo pelo blog que descobri. Achei os artigos muito interessantes pois sempre tive um certo fascínio por esta parte do mundo e por esta cultura Russa. Lembro-me em criança de ver os desenhos animados do Gena e Tcheburashka que o Vasco Granja mostrava e como me identificava com aquele humor, educação e estética. Claro que como "moço" de 12 um dos meus heróis era o Yuri Gagarin mas também já me apaixonava por aquelas belas Ginastas da CCCP:) Conheço relativamente bem a cultura Russa de hoje em dia. Quanto à Rússia tenho visitado várias vezes ao longo dos últimos 2 anos uma vez que a minha namorada é de Moskva. No que toca à presença hoje de Portugal na Rússia sou muito critico na forma como os nossos produtos são promovidos. Diga-se que estão bastante ausentes ou até mal representados. Fico triste de cada vez que vou aí aos supermercados e não encontro qualquer vinho interessante, queijo, azeite, café etc...No entanto vejo as prateleiras inundadas de produtos Espanhois, Italianos, Franceses, Alemães (vinho inclusive). Esta seria uma das formas de cativarmos estas "gentes" não só para os produtos mas também para a nossa cultura. As minhas amizades Russas deliciam-se e espantam-se com qualquer das nossas iguarias. Penso mesmo que um Treská (Bakalhovski) de boa qualidade seria muito apreciado após uma cuidada acção de divulgação gastronómica. Já levei na mala Riberalves e quando cozinhei um bacalhau com natas para os meus amigos Russos choraram por mais.
Como lhe disse fascina-me a cultura Russa tanto actual, Czarista ou Soviética e procuro sempre encontrar coisas interessantes para visitar e experimentar. Já agora sabe se há algum restaurante português em Moscovo? Em Sankt Peterburg fui a um restaurante Italiano excelente (muito próximo de Nevski Prsopekt) e o chefe é Português ... Delfim de nome. Quando fui lá, tinham anunciado uma semana de culinária portuguesa e por isso ele veio pessoalmente à mesa saber porque havia um cliente a pedir um menu tão tipicamente português.
Já agora chamo-me Rui Moura, dou aulas na Fac. de Ciências do Porto e devo ir a Moscovo novamente em Fevereiro. Sou também piloto de acrobacia e tenho voado aviões Yakovlev e Sukhoi cá e nalguns países de Leste (Lituania e Republica Checa).
Um grande bem haja e mais uma vez parabéns
Rui"
A história do Conde do Porto é verdadeiramente impagável!
Aproveito também para felicitar o José Milhazes pelo doutoramento recentemente concluído na Faculdade de Letras do Porto. :)
Caro Rui, aproveito o seu comentário para agradecer aos leitores e amigos que me felicitaram pela defesa bem sucedida da tese de doutoramento. A todos um grande abraço e espero que este novo grau académico ajude a elevar o nível também do meu blogue.
Um muito interessante blog.
Permito-me, porem, chamar a atenção para o facto do retrato apresentado não ser o do Príncipe Yusupov (autor das interessantes memórias) mas o do pai, o Conde Sumarokov-Elston.
http://jemantiaindrai.blogspot.com/2006/09/velha-rssia-felix-youssupov-por-serov.html
delicioso! comprei esta biografia na ferin ha uns meses mas tenho andado entretido com outras leituras. esta passagem abriu-me o apetite para a ler. obrigatorio.
excelente matéria!
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