domingo, abril 27, 2008

Estado e Igreja russos cada vez mais fundidos



Os cristãos ortodoxos celebram, este Domingo, a Páscoa. Em Moscovo, pude constatar que os templos estiveram completamente cheios de crentes.
Porém, fico surpreendido - talvez não seja surpreendido, mas diria perplexo - com a forma como a Igreja Ortodoxa Russa volta a repetir um erro do passado: a submissão total ao poder laico. Isto é tanto mais grave na Rússia, país onde além de ortodoxos, vivem muçulmanos, judeus, budistas.
A Missa de Aleluia foi celebrada no Templo de Cristo Salvador por Alexei II, Patriarca de Moscovo e de Toda a Rússia, e estiveram presentes os presidentes cessante e eleito, respectivamente Vladimir Putin e Dmitri Medvedev, acompanhados pelas esposas.
Além deles, encontravam-se conhecidos membros da actual elite política. A entrada no templo era por convites e as medidas de segurança foram mesmo fortes.
Vale a pena citar as palavras trocadas entre os dirigentes do Estado e da Igreja para compreender o tipo de relações que se estreitam cada vez mais entre eles.
“Quero agradecer-lhe pela mensagem em que felicita todos os ortodoxos que festejam a Ressurreição de Cristo” – declarou o Patriarca ortodoxo, dirigindo-se a Vladimir Putin.
“Deus lhe dê forças para realizar os seus grandes feitos heróicos em prol da Rússia. Estamos-lhe grato, profundamente respeitado Vladimir Vladimirovitch (Putin), pelos oito anos da vossa presidência. Você fez tanto pela Rússia!” – acrescentou Alexei II.
“Dmitri Anatolievitch (Medvedev), ao realizar os projectos nacionais, visitou muitas regiões e sabe o que o país precisa, quais as necessidadas das pessoas. Vós dois terão de realizar um feito heróico difícil em prol da Pátria, em prol do nosso povo” – assinalou o Patriarca, dirigindo-se aos dois dirigentes russos.
“Prometemo-vos que a Nossa Igreja irá sempre rezar e pedir a Deus que vos dê forças, coragem para superar todas as dificuldades, todas as provas. Para fazerem o que fazem em prol do homem, para bem do homem” – concluiu o chefe da Igreja Ortodoxa Russa.
Depois, Putin e Medvedev aproximaram-se do Patriarca, agradeceram-lhe pelas suas palavras, beijaram-no três vezes, como manda a tradição ortodoxa, e Putin ofereceu a Alexei II o ícone “Deus Omnipotente”.
“Quero garantir-lhe que o Estado continuará a prestar todo o apoio à Igreja no seu trabalho com vista à educação moral dos cidadãos da Rússia, ao reforço do prestígio dos valores da família na consciência social, à conservação e reforço da unidade da Ortodoxia” – declarou Putin.
O sucessor no Kremlin, Dmitri Medvedev, sublinhou que a acção da Igreja “contribui em alto grau para a realização das transformações sociais nos interesses dos cidadãos da Rússia, abre novas possibilidades para a interacção do Estado e da Igreja na solução das questões actuais da cultura e da saúde moral da nação, na educação da geração jovem”.
Se, em alguns países europeus, o laicismo da sociedade é levado ao absurdo; na Rússia, ao absurdo é levada a aliança entre o Estado e a Igreja. Quando o czarismo caiu, em 1917, a Igreja Ortodoxa Russa viu-se em grandes dificuldades por ter colaborado com um regime político pouco popular. Depois da queda da URSS, em 1991, parte significativa da hierarquia ortodoxa russa saiu comprometida com a colaboração com o comunismo ateu e a sua polícia política, o KGB.
Hoje, volta a comprometer-se de forma duvidosa. Pobre da religião que se tenta impor na sociedade apoiando-se no poder político e esquecendo as palavras de Cristo: "A Deus o que é de Deus, a César o que é de César"

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