"A Rússia de hoje viu-se numa espécie de armadilha e é incapaz de se modernizar, considera Vladislav Inozémtsev, director do Centro de Estudos da sociedade pós-industrial.
Ao contrário dos países asiáticos, que eram pobres, analfabetos e basicamente rurais, a Rússia já não pode impulsionar uma modernização industrial: não aproveitou as vantagens deste modelo no período da União Soviética, não se tendo transformado numa economia competitiva, assinala Inozémtsev num artigo publicado hoje no diário Vedomosti.
A Rússia passou os últimos 20 anos a andar de um extremo ao outro, o que acabou por desprestigiar os modelos clássicos aos olhos da população. Rompeu com a distribuição socialista e ainda não criou uma economia liberal no sentido tradicional, tendo o liberalismo começado a associar-se à trivial ingovernabilidade e prepotência dos oligarcas. Quando se fez uma tentativa de pôr fim aos abusos, a Rússia transformou-se numa coutada de pretorianos extorsionários. Como resultado, nem a economia de mercado nem o sistema estatista servem agora como alavancas de modernização.
A modernização implica o imperativo de aprender, de copiar tecnologias e instituições. Mas a Rússia foi a primeira do planeta em vários sectores, considerou-se arquitecta de um mundo novo nos tempos da URSS e jamais será uma aluna diligente. Também não poderá voltar a ter o papel de líder, no qual falhou uma vez. Falta-lhe recursos e oportunidades para o conseguir e não tem vontade nem paciência para se converter finalmente num país comum.
Um outro problema é que o poder do Estado se transformou num instrumento banal de latrocínio, onde a cúpula representa os interesses de uma burocracia criminalizada. Não se aprecia o poder, mas sim a riqueza.
A posição internacional do país também não ajuda à modernização. A Rússia continua à margem da OMC e da OCDE, exclui a mera ideia de adesão à União Europeia e tenta preservar o status quo sem entender que é uma tarefa inviável a longo prazo.
A Rússia é demasiado rica para se industrializar com êxito e demasiado pobre para gerar procura interna de tecnologias; demasiado inteligente para se dedicar a cópias e plágios mas não suficientemente profissional para atingir a liderança tecnológica. Considera-se demasiado especial para ser um país normal mas é demasiado débil e pouco original para aspirar a mais.
São dilemas quase fatais, que não se resolvem com a simples transição de um regime autoritário para uma democracia, considera Inozémtsev. Nenhum democrata poderá ganhar as eleições se apelar aos cidadãos russos para apertar o cinto, ser aprendiz do Ocidente, abrir o mercado a investimentos estrangeiros, ceder uma parte da soberania à União Europeia e renunciar às vantagens de “superpotência energética”.
Artigo original em: http://www.vedomosti.ru/newspaper/article/2010/02/24/226398"
8 comentários:
Caro Sr. José Milhares...
" A Rússia continua à margem da OMC e da OCDE, exclui a mera ideia de adesão à União Europeia e tenta preservar o status quo sem entender que é uma tarefa inviável a longo prazo..."
R. A Rússia não está na OMC por intervenção americana, que nega o acesso de Moscow nessa organização.
"...demasiado inteligente para se dedicar a cópias e plágios mas não suficientemente profissional para atingir a liderança tecnológica.."
R. A Rússia é lider mundial na fabricação de usinas nucleares para geração de energia elétrica,é a segunda maior potencia espacial do planeta,etc... Realmente, é um país inteligente de mais para se dedicar á cópias e plágios. O mesmo não pode ser dito da China, que usa hackers para roubar tecnologia ocidental e russa. E o Reino Unido que basicamente desenvolveu o seu parque industrial copiando a tecnologia americana.
A História irá provar ao contrário. A Rùssia é hoje um novo país, que existe apenas á 19 anos. Ainda está em fase de adaptação ao novo sistema capitalista. Não acham muito pouco tempo para julgar a capacidade russa de se adaptar e se habituar ao novo tipo de mercado?
É uma visão muito negativa. Isto reflecte a sua opinião, Cristina?
Não concordo que a Rússia deva ambicionar entrar para a UE nem sequer que a UE deva permitir o seu ingresso.
A cultura e mentalidade russas estão para além da sua territorialidade europeia. Provavelmente as pessoas que vivem ou o conhecem a Rússia sabem a que me refiro.
Quanto à OCDE ou à OMC existem alguns países que bloqueiam a entrada da Rússia e nem lhes interessa que esta evolua e progrida (pelo menos nos trâmites do seu próprio interesse).
Lamentável e oportunísticamente não houve grandes problemas na entrada da China na OMC.
Cumpts
Manuel Santos
Caro Zé, esta sua descrição da Rússia cada vez mais me faz temer o destino do nosso país. Quase que consigo transpor parte desse sentimento para Portugal.
Os russos passaram por extremos muito depressa e isso deixa marcas. O 8 ou o 80, o comunismo ou o capitalismo, uma sociedade do povo ou o individuo da sociedade.
Como dizia Voltaire:
"Nem o excesso, nem a abstinência, alguma vez deixarão o Homem feliz."
É uma visão muito negativa. Isto reflecte a sua opinião, Cristina?
Creio, infelizmente, que não a opinião, mas sim, a vontade de muitos russóbos frequentadores deste sítio.
Vamos dar tempo ao tempo....
Caros leitores
Trata-se apenas de uma tradução (condensada) do artigo de um intelectual russo e as opiniões são dele e não minhas. A minha intencão foi mostrar que na imprensa russa são publicados materiais muito críticos, polémicos, dos mais diversos quadrantes, de pessoas que reflectem sobre os destinos do seu país, tal como aliás se faz em muitos outros países, inclusivé em Portugal. Acho que isso é saudável e em breve (se o JM o permitir) darei a conhecer outra visão do país, mais próxima do actual governo. O autor tem uma perspectiva pró-ocidental e, (sabendo ele em que país vive,um país orgulhoso que preza o seu "caminho especial"), reconhece que será impossível desenvolver o país à maneira ocidental, ou seja, alcançar um desenvolvimento baseado em tecnologias e na globalização. Daí advem a sua visão pessimista do futuro.
Na Rússia, há muita gente inteligente, que sabe pensar e é pena não podermos conhecer a riqueza da imprensa e da cultura russa actuais.
Esta é apenas uma das vozes.Mas há muitas outras.
Caros leitores
Trata-se apenas de uma tradução (condensada) do artigo de um intelectual russo e as opiniões são dele e não minhas. A minha intencão foi mostrar que na imprensa russa são publicados materiais muito críticos, polémicos, dos mais diversos quadrantes, de pessoas que reflectem sobre os destinos do seu país, tal como aliás se faz em muitos outros países, inclusivé em Portugal. Acho que isso é saudável e em breve (se o JM o permitir) darei a conhecer outra visão do país, mais próxima do actual governo. O autor tem uma perspectiva pró-ocidental e, (sabendo ele em que país vive,um país orgulhoso que preza o seu "caminho especial"), reconhece que será impossível desenvolver o país à maneira ocidental, ou seja, alcançar um desenvolvimento baseado em tecnologias e na globalização. Daí advem a sua visão pessimista do futuro.
Na Rússia, há muita gente inteligente, que sabe pensar e é pena não podermos conhecer a riqueza da imprensa e da cultura russa actuais.
Esta é apenas uma das vozes.Mas há muitas outras.
Cara Cristina,
Então veja lá se encontra também alguém que veja como positivo o caminho que a Rússia tem seguido nos últimos anos.
Confesso que vejo mais artigos pessimistas que optimistas, mas isso é assim por todo o lado.
Na minha opinião é sempre mais fácil criticar. E não se vendem jornais para se ver notícias das coisas boas, mas sim o que existe de mau ou qual o último escândalo da classe política.
E claro quem realça o que existe de positivo é porque é da cor x, ou são vozes próximas do governo.
Eu aqui por exemplo dou a minha opinião sobre vários países, sou por exemplo muito crítico pelo o caminho que a Ucrânia tem percorrido nos últimos anos, mas vejo um desenvolvimento interessante na Rússia, com um potencial muito grande e que nesta década que entramos agora, já começaremos a ver alguns frutos do que foi semeado na década passada.
Será que só eu é que vejo isso? Não há por aí vozes que vejam que certas opções tomadas, vão influenciar positivamente o futuro da Rússia?
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