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ACIDENTE DE MBUZINI |
Interferências de Pik Botha ameaçaram idoneidade das investigações |
O antigo ministro dos negócios estrangeiros sul-africano, Pik Botha, interferiu nos trabalhos da comissão de inquérito instaurada pela África do Sul como Estado de Ocorrência do acidente de Mbuzini, pondo em cheque a autoridade dos investigadores que no terreno procediam à identificação das causas do desastre de aviação em que perdeu a vida o primeiro presidente de Moçambique, Samora Machel. Segundo Theresa Papenfus, autora da obra biográfica «Pik Botha and His Times», o ex-ministro sul-africano tomou a iniciativa de entregar às autoridades moçambicanas a documentação da aeronave sinistrada em Mbuzini, à revelia dos preceitos que regem as comissões que investigam acidentes de aviação. A autora cita o investigador responsável pela parte sul-africana, Rennie van Zyl, a dizer que Pik Botha “havia tornado mais difícil a tarefa dos investigadores pois ele, infelizmente, já havia concordado que os moçambicanos retirassem documentos de entre os destroços do avião. Perdemos muitas provas. Conseguimos salvar as caixas negras quase no fim, pois Pik Botha até estava disposto a entregá-las a Moçambique”. Acrescenta Van Zyl, referindo-se ao investigador-chefe, pela parte sul-africana, “Felizmente, o Piet de Klerk evitou que isso acontecesse e a seguir a polícia colocou as caixas negras sob sua custódia”. A União Soviética, com o apoio de Moçambique, insistiu sempre na entrega incondicional das caixas negras às autoridades de Moscovo. Van Zyl volta a ser citado na biografia a dizer que “os russos sugeriram que Piet de Klerk levasse as caixas negras para Moscovo. Não concordámos, pois não sabíamos se voltaríamos a ver, quer Piet de Klerk, quer as caixas negras”. Van Zyl afirma que as partes soviética e moçambicana acabariam por aceitar uma proposta sua de que as caixas negras fossem abertas num país neutro, a Suíça. Isto, no caso do gravador de cabine (CVR). Relativamente ao gravador digital de dados (DFDR), Van Zyl propôs que a África do Sul ficasse com uma cópia, sendo a outra aberta e descodificada em Moscovo na presença de representantes dos três países. De acordo com Van Zyl, quando a 14 de Novembro de 1986 ele apresentou a proposta em Maputo, “tanto os soviéticos como os moçambicanos levantaram objecções, especialmente face às declarações recentemente proferidas pelo ministro soviético da aviação civil”, Ivan Vasin, que mesmo antes da abertura das caixas negras já tinha decidido quais haviam sido as causas do acidente. Adianta Van Zyl: “Quando eram cerca das 9 horas da noite, um dos russos perdeu as estribeiras com o colega da KGB e disse-lhe algo em russo. O homem da KGB tentou calá-lo. Meia hora depois, o acordo estava assinado e à meia-noite eu estava de regresso a Joanesburgo.” Voltando a referir-se a Pik Botha, o investigador responsável pela parte sul-africana disse que o ex-ministro dos negócios estrangeiros da África do Sul consentiu que o mecânico de bordo, Vladimir Novoselov, fosse evacuado do Hospital Militar 1 em Pretória. Van Zyl afirma que quando se deslocou a Moscovo em Dezembro de 1986, as autoridades soviéticas impediram-no de entrevistar Novoselov, alegando “dificuldades de transporte” para São Petersburgo, cidade onde se encontrava o mecânico de bordo. Idêntica sorte tiveram os investigadores da comissão de inquérito moçambicana presentes na capital soviética. Quando o Relatório Factual elaborado pelos investigadores dos três países foi apresentado perante a Comissão de Inquérito sul-africana num tribunal de Joanesburgo em Janeiro de 1987, Novoselov não foi autorizado pela União Soviética a testemunhar nem a ser acareado. Sob pressão de Moscovo, Moçambique retirar-se-ia dos trabalhos da Comissão de Inquérito instaurada pelo Estado de Ocorrência, não comparecendo no tribunal de Joanesburgo, apesar do representante oficial moçambicano junto dessa comissão, Dr. Paulo Muxanga, ter solicitado momentos antes, à parte sul-africana, que recomendasse uma firma de advogados para defender os interesses de Moçambique nessa instância jurídica. Do Hospital Militar 1, Vladimir Novoselov foi evacuado para Maputo a 29 de Outubro de 1986. Novoselov seguiu da capital moçambicana para Moscovo no dia 5 do mês seguinte, tendo o Presidente Joaquim Chissano apresentado cumprimentos de despedida a esse tripulante no mesmo dia, deslocando-se para o efeito à Representação Comercial da União Soviética em Maputo. Em «Memórias em Voo Rasante», Jacinto Veloso, que integrou a Comissão de Inquérito moçambicana, revelou que a Embaixada Soviética em Maputo por duas vezes impediu que investigadores moçambicanos entrevistassem Novoselov entre os dias 30 de Outubro e 5 de Novembro de 1986, alegando que o mecânico de bordo do Tupolev presidencial não se encontrava em bom estado de saúde. A autópsia aos corpos da tripulação foi outro caso apontado na biografia, «Pik Botha and His Times», como revelando interferência do antigo ministro sul-africano dos negócios estrangeiros nos trabalhos da Comissão de Inquérito. Sem o consentimento dos investigadores sul-africanos, em Mbuzini Pik Botha concordara com o ministro da segurança moçambicano, Sérgio Vieira, que os corpos dos tripulantes fossem imediatamente transferidos para Maputo. Os investigadores conseguiriam, porém, que os corpos fossem primeiro transportados para o hospital de Komatipoort para extracção de humor vítreo, e de sangue mediante a incisão de golpes no pescoço. A autópsia ao cadáver de Samora Machel seria efectuada em Maputo por um médico patologista sul-africano com o apoio de médicos moçambicanos e cubanos. (Redacção) |
segunda-feira, janeiro 24, 2011
Mais um texto sobre morte de Samora Machel
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