quinta-feira, janeiro 27, 2011

A UE é dura com Minsk, mas suave com Baku


Texto traduzido e enviado pelo leitor Pippo:




"por Gorkhmaz Asgarov



Alguém deveria dizer aos líderes da União Europeia para deixarem em paz o ditador bielorrusso Alyaksandr Lukashenko.

Afinal de contas, na próxima semana, o Presidente da Comissão Europeia, José Manuel Durão Barroso reunir-se-á com Islam Karimov, Presidente do Uzbequistão. E na semana passada o mesmo Durão Barroso visitou o Azerbaijão e reuniu-se com o Presidente do Azerbaijão, Ilham Aliyev, cujo registo de direitos humanos é comparável ao do seu homólogo do Uzebequistão. E na mesma semana, a União convidou o Presidente do Turcomenistão, Gurbanguly Berdymukhammedov, a visitar Bruxelas e discutir sobre assuntos de cooperação energética e comercial.

O que faz com que Lukashenka seja diferente dos ditadores acima mencionados? Bom, ninguém pode culpá-lo por a Bielorrússia não possuir petróleo ou gás natural.

Sociedade 'Dinâmica'

Não é nenhum segredo que certos países pós-soviéticos parecem muito diferentes uns dos outros, sobretudo quando os líderes europeus os observam através do prisma do petróleo e do gás. "Eu sei que o seu país tem uma sociedade muito dinâmica", disse Barroso a Aliyev durante a sua visita a Baku.

Dinâmica? Talvez. Mas ninguém o diria se considerar que todos os actos eleitorais tem sido fraudulentos desde 1993, quando o pai de Aliyev, Heydar Aliyev, derrubou o governo democraticamente eleito e tornou-se chefe de Estado num acto que os observadores da Organização para a Segurança e Cooperação na Europa e do Conselho da Europa descreveram como sendo um golpe de Estado.

Ninguém o diria se tivesse tido em conta o facto de que o governo do Azerbaijão tem constantemente obtido péssimas classificações em termos de corrupção por parte da Transparência Internacional, e que o Presidente Aliyev tem sido apontado como um predador de jornalistas por parte de grupos de vigilância da liberdade dos média.

Dinâmica, de facto…

No mês passado, Lukashenko causou um alvoroço na UE e desencadeou um processo de possíveis sanções contra o seu governo após uma ofensiva brutal pós-eleitoral contra a oposição. Ele poderia ter seguido os passos de Aliyev, o qal fez exactamente a mesma coisa em 2003 e 2005.

A Presidência Infindável


Em Março de 2009, Aliyev alterou a Constituição (através de um referendo fraudulento, é claro) abolindo assim os limites de mandato para a presidência e preparando o cenário para ele "concorrer" infinitamente para o cargo. Quando um jornalista da EuroNews recentemente lhe perguntou se ele se considerava um rei, Aliyev simplesmente balançou a cabeça. Mas é difícil imaginar que poderes pode um rei ter que Aliyev não tenha.

No entanto, Lukashenko é um ditador cruel que deve ser desprezado pela “boa” sociedade europeia, enquanto Aliyev é um verdadeiro amigo que preside um país "dinâmico".

 
A UE precisa de rotas alternativas de energia, e o negócio de um "corredor do sul" para transporte de gás através do Azerbaijão faz muito sentido sob o ponto de vista económico. Do ponto de vista económico, a cooperação com o Turquemenistão e Uzbequistão também fazem sentido.

Mas porque não restringir as relações com esses países dentro de um quadro da cooperação estritamente necessária? Azerbaijão, Turcomenistão e outros países têm hidrocarbonetos a UE tem o dinheiro para os pagar. Então, será que é realmente necessário que os funcionários europeus coloquem os seus braços por sobre os ombros destes governantes autoritários e digam disparates acerca do seu desenvolvimento "dinâmico"?
 
Por que é que Barroso faz o comentário gratuito de que "nós queremos deixar claro que as nossas relações não se limitam ao petróleo e gás", quando todos sabem que 98 por cento das importações da UE provenientes do Azerbaijão são o petróleo e o gás?

Adicionando insulto à injúria

Já foi dito antes, mas, obviamente, precisa ser dito novamente. Quando os líderes da UE fazem visitas de alto nível a esses países e louvam os seus governantes, eles conferem um enorme capital político a essas transacções comerciais. Os líderes autoritários concluem que, enquanto estiverem dispostos a receber dinheiro europeu, eles terão a UE nos seus bolsos. Na falta de legitimidade ente o seu próprio povo, eles diligentemente recebem raspas de legitimidade dos lábios de pessoas como José Manuel Barroso.

Este é um jogo que os líderes autoritários estão felizes por jogar. Afinal, a UE é um exemplo de um modelo político radicalmente diferente para os cidadãos de países como o Azerbaijão. Assim, a "ditaduras da energia" sentem a necessidade de desacreditar a UE, mostrando assim aos seus povos que o discurso da Europa da democracia e dos direitos humanos é apenas um corrilho de mentiras.

 
Quando eles apertam as mãos com altos responsáveis da UE, como Barroso, eles enviam a mensagem de que as críticas do passado (na sua maior parte, proveniente das organizações europeias) nunca importaram e foram esquecidas. No caso do Azerbaijão, a mensagem é ainda pior. Aliyev afirmou muitas vezes que "alguns países" manipulam as questões da democracia a fim de forçar o Azerbaijão a fazer concessões económicas. Quando funcionários da UE assinam acordos e falam sobre o Azerbaijão "dinâmico", toda a gente neste país entende que a democracia, eleições fraudulentas, jornalistas presos, espancados e manifestantes são apenas moeda de troca para tornar o gás e o petróleo mais baratos. Ou pelo menos, isso é o que Baku quer que todos, no Azerbaijão, assim o pensem.

E não ajuda o facto de que, quando Durão Barroso realizou uma conferência de imprensa conjunta com Aliyev em Baku, nenhum dos órgãos independentes dos média do país tivessem estado presentes. Mais tarde, quando Durão Barroso realizou uma conferência de imprensa individual, organizada pelo gabinete da UE em Baku, as perguntas dos jornalistas foram previamente seleccionadas.

Por que é que a UE participa nesta dança Kabuki com o governo do Azerbaijão?

Aqui estão alguns factos para fazer a UE refectir. Eynulla Fatullayev é um jornalista do Azerbaijão que foi detido em 2007 sob acusações falsas, pois os dois jornais que fundou eram críticos em relação ao Governo. Ele foi condenado a 8 anos e meio de prisão sob a acusação de calúnia, difamação, incitação ao terrorismo e à evasão fiscal.

No ano passado, o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem absolveu-o de todas as acusações e ordenou ao Azerbaijão que o libertasse e o indemnizasse no valor de 28.000 €. Antecipando-se a esta decisão, o Supremo Tribunal de Justiça do Azerbaijão rapidamente condenou por novas acusações de posse de drogas e evasão fiscais. Ele permanece na prisão até aos dias de hoje.

A indemnização ordenada por Estrasburgo foi depositada numa conta bancária a qual foi congelada na sequência da prisão de Fatullayev, permitindo a Baku afirmar que tinha dado cumprimento à decisão do tribunal, assegurando ao mesmo tempo que Fatullayev não poderia receber o dinheiro.

Barroso afirmou que discutiu este caso com Aliyev. "O Tribunal Europeu dos Direitos Humanos pronunciou-se em seu favor e defendi a sua libertação", disse Barroso. "Eu abordei essas questões, num espírito de abertura e amizade, chamando claramente a atenção do presidente Aliyev. "

Em 21 de Janeiro o Tribunal da Apelação de Baku analisará o recurso de Fatullayev para a sua libertação. Este será um bom teste para os amigos de Durão Barroso em Baku.

E aqui está mais um exemplo do cinismo extremo com que o governo do Azerbaijão trata os seus parceiros europeus.

Mais de um ano atrás, a Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa (APCE) nomeou o social-democrata alemão Christoph Straesser como relator especial para os presos políticos no Azerbaijão. No entanto Straesser ainda não recebeu o convite do governo do Azerbaijão para visitar o país e implementar o seu mandato.

O Conselho da Europa pediu a Baku que resolvesse o problema, mas sem sucesso. Straesser provavelmente receberá o seu convite na mesma altura em que Fatullayev receber a sua indemnização.

Lukashenko pode obter sanções; Aliyev irá rir por último.

8 comentários:

Pedro disse...

Excelente artigo.

Eu pessoalmente estou farto de saber há muitos anos que o Mundo se move apenas por interesses.
Os bem falantes que ouvimos por ai nos jornais e televisões podem meter a cassete dos direitos humanos, da liberdade e da democracia que entra por um ouvido e sai por outro.
Só já vejo cinismo e hipocrisia.

A outra máxima dos tempos modernos que nos insinuam constantemente é a questão dos fundamentalismos islâmicos e guerra religiosa. Mais uma fraude do tamanho do mundo. nunca em nenhum lado há guerras por motivos religiosos.
É sempre, sempre, por interesses económicos e de poder.
É idêntica á suposta luta ideológica dos tempos da guerra fria.
Não tenho a menor dúvida que os EUA se fariam aliados de paises com regimes comunas ou de regimes islamicos (Arábia saudita) desde que estes correspondessem aos seu interesses económicos/Geo-estratégicos.

Em relação ao assunto da Bielorrússia nem vale a pena comentar, já sabemos há anos a dualidade de critérios destes senhores que julgam ter autoridade de ordens a países soberanos.

PortugueseMan disse...

Caro Pippo,

Este artigo faz-me lembrar o ano de 2003 onde tantas vezes escrevi no Expresso Online a chamar a atenção para o Azerbaijão e a Geórgia. Na altura colocava comentários um pouco como faço aqui. Ambos os países eram (e são) cruciais para o transporte de energia fazendo o bypass da Rússia, mas eram temas que raramente originavam discussão, pois eram países completamente fora das notícias e o Azerbaijão hoje ainda o é.

Por esta altura os EUA estavam a entrar em força na Ásia Central e no Iraque e o pipeline começou a sua construção em princípios de 2003.

Em Outubro tivemos as eleições estando o presidente na altura nos Estados Unidos numa clínica, tendo passado o testemunho para o seu filho por meio de umas eleições "democráticas".

Em Novembro temos umas eleições na Geórgia que dão origem à revolução rosa, que por coincidência coloca uma pessoa muito mais favorável aos EUA (embora o pipeline não tivesse sido negociado com ele) e que agora já se tornou bem conhecido pelo o resto do mundo.

Em Dezembro de 2003 o presidente morre na clínica nos EUA, estando já garantido a sua sucessão.

Este foi um ano muito movimentado, com os EUA a exercer pressão em várias partes do globo e com sucesso.

Por esta altura havia um jogador que estava a tentar colocar um travão a todos estes avanços, mas não tinha dinheiro e sem dinheiro nada se faz. A Rússia optou pela estratégia de alocar o máximo de recursos para se livrar do FMI. Em 2003 também foi um ano complicado com muita coisa a pagar e conseguiram fazê-lo com sucesso e estavam a acelerar as prestações de modo a acabarem com as dívidas.

Em 2004 foi criado o fundo de estabilização portanto o que passou a indicar que as dívidas já não estavam a ser aquele fardo, como se veio a comprovar com o pagamento total da divida (em adiantado) em princípios de 2005.

Em 2005 o pipeline BTC arranca, em 2005 a Rússia livre de dívidas começa lentamente a reagir e hoje a Rússia passou de nação endividada a uma nação que já não se consegue contornar, bastando para ver a quantidade de assuntos onde a mesma está envolvida.

Mas voltando ao Azerbaijão, o grande "truque" é o "low-profile". Ninguém ouve falar deste país, mas por exemplo se falar do Chavez, já toda a gente o conhece.

Ambos são "players" energéticos e apesar das eleições até serem reconhecidas, toda a gente fala em ditadura. Por enquanto não se pode falar nisso, porque ele ficou lá à custa de votos.

Só que Chavez diplomáticamente é o mesmo que um elefante numa loja de loiças. E como ainda por cima entrou em atrito com os EUA...

Para paises energéticos, não interessa o regime que lá esteja, desde que não façam demasiado barulho. O que é preciso é que a energia flua...

MSantos disse...

Parabéns Pippo, pela pedrada nesse charco autointitulado defesa da "democracia, direitos humanos e liberalismo".

Às vezes nem é necessário o interesse energético como era o caso do prisidente tunisino deposto que até há poucas semanas era bastante tido em consideração por esta gente.

Pessoalmente o que mais me entristece é que a Europa nem sequer é cínica e facciosa para defender os seus interesses mas sim para defender os da superpotência dominante mesmo contra os seus próprios nem se atrevendo nunca a pôr em causa esse relacionamento.

Quaisquer caminhos alternativos são assunto tabu o que numa sociedade que se reclama de livre pensamento é de bradar aos céus.

Cumpts
Manuel Santos

Jest nas Wielu disse...

Acho que será crucial não esquecer o facto do que Belarus é um país europeu e os restantes países citados no artigo não são...

Portuga men disse...

Pois, caro doutor MIlhazes, tudo se resume a interesses. O senhor de Minsk como é fiel a Moscovo e lá não passa nenhum oleoduto ou gasoduto indispensavel para os alemães é um tirano.

Os senhores do caucaso, nomeadamente o azerbeijão e restantes paises nomeados como passam lá gasodutos importantes para a alemanha, e durão não é mais que um peão e um boy de alemães e franceses, e de americanos, diga-se de passagem, já são uns tipos porreiros, quando na verdade são iguais ou piores que o senhor de Minsk.

É a Europa que temos, e o nojo de politica que temos, é só falsidades e interesses, aqui fica bem patente a máxima de que os paises não tem amigos, têm interesses.

Cumprimentos.

Portuga men disse...

Faltou dizer, que por mim este União Europeia acabava já hoje.

Portugal inserido neste colete de forças comandados por potencias históricamente nossas inimigos correr o risco de ser comido pelo império colonial castelhano, na minha deia é mesmo isso que está a ser cozinhado, a nossa economia esta a ser canibalizada por espanha, atraves de leis europeis que vão nessse sentido e que nos são estremamente lesivas e prejudiciais.

A unica forma de decepar este iberismo em Portugal é abandonar este UE, de modo a encostar e desviar de cena os traidores alinhados com espanhaque se estão a perpetuar no governo, e que desde 2005 nada mais tem feito que tentar entregar os sectores estrategicos do pais a espanha, em que ate o futebol é usado para tentar castelhanizar os Portugueses.

É o degredo total.

Cumprimentos.

Wandard disse...

Pippo,

Parabéns pelo artigo. Somente participantes do blog com uma visão mais pura e realista pode trazer artigos como este, fora da sequência tendenciosa e costumeira de sempre.

Muito bom,

Abraço,

Pippo disse...

Obrigado pelos agradecimentos, mas eu apenas limitei-me a traduzir (e com gralhas!) este artigo que me pareceu interessante e muito elucidativo relativamente a certas ideias feitas que por aqui circulam.
Os agradecimentos deverão ser dados ao Gorkhmaz Asgarov :o)

Ab,