*** José Milhazes, para a Agência Lusa ***
Lisboa, 23 dez (Lusa) - A substituição da bandeira vermelha soviética pela tricolor russa no Kremlin de Moscovo, na noite de 25 de dezembro de 1991, há 20 anos, foi talvez um dos momentos mais simbólicos do século passado.
Começou assim uma nova era de redefinição do espaço ocupado pela União Soviética, que constitui um sexto da Terra.
Estónia, Letónia e Lituânia foram as últimas repúblicas a serem obrigadas a aderir à URSS, em 1939, e por isso estiveram na linha da frente da fuga quando o edifício chamado Império Soviético começou a ruir. Hoje, com maior ou menor sucesso, já fazem parte da União Europeia.
A Geórgia está a ter menos sucesso na aproximação à NATO e UE, em parte devido aos receios da Rússia, que já provocaram um conflito armado entre os dois países em 2008.
Quanto às restantes 12 repúblicas da ex-URSS: Arménia, Azerbaijão, Bielorrússia, Cazaquistão, Moldávia, Quirguistão, Rússia, Tajiquistão, Turquemenistão, Ucrânia, Uzbequistão continuam juntas na Comunidade de Estados Independentes, organização criada mais para gerir a desintegração da URSS do que para gerar um novo polo de integração.
Aqui, a Rússia, por razões históricas, geográficas, políticas e militares, tem tentado incentivar o processo de reunificação e de integração, mas com poucos êxitos.
Se para os dirigentes russos, isso significa recriar uma dimensão perdida, para os líderes dos restantes países trata-se da afirmação de Estados independentes e de um olhar de desconfiança face ao "irmão mais velho".
O exemplo da Ucrânia é o mais evidente. Não obstante Kiev ter apostado na viragem para a UE, Moscovo não desiste de a tentar mudar de rumo, recorrendo para isso ora a ameaças como o aumento do preço do gás, ora a benesses caso aceite integrar a União Aduaneira, composta pela Rússia, Cazaquistão e Bielorrússia. A tentação de "não deixar escapar a Ucrânia" é tanto maior quanto mais sérias são as dificuldades com que se depara a UE.
Moscovo procura também não perder zonas de influência estratégicas como a Ásia Central e a Transcaucásia. Receando a continuação da presença dos Estados Unidos na região depois da retirada das tropas norte-americanas do Afeganistão em 2014, o Kremlin tenta não permitir a criação de novas bases militares e fechar a já criada por Washington no Quirguistão.
No entanto, corre o sério risco de ver entrar pelo seu território a influência do islamismo extremista caso os talibãs recuperem posições no Afeganistão. A não ser que Moscovo espere que Pequim assuma com a Rússia um papel militar mais relevante na Ásia Central.
Porém, todos os planos de chefiar processos de integração ou de alargamento de zonas de influência podem cair por terra se Moscovo perder a corrida da modernização interna. A herança soviética está a chegar ao fim e os actuais dirigentes russos não têm sabido ou não querem aproveitar as boas oportunidades económicas, criadas pelo alto preço dos hidrocarbonetos no mundo, para modernizar as infraestruturas e fazer entrar a Rússia na fase da inovação.
Até agora, o dirigente russo não conseguiu realizar isso e, como pretende ocupar o Kremlin por mais 12 anos, pode acontecer que, no fim dos dois mandatos, se não inventar mais uma fórmula de continuação do poder, a Rússia se veja definitivamente afastada da locomotiva da inovação.
Lusa/fim
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