A minha comunicação feita nos XXXV Colóquios de Relações Internacionais na Universidade do Minho
Parte 3:
"Por
isso, quando Vladimir Putin anunciou o nome do seu sucessor: Dmitri
Medvedev, alguns sectores ocidentais admitiram que este poderia
liberalizar o sistema político e económico do país com vista à
sua modernização, mas o facto é que ele não passou de um joguete
mandado por Putin, que saltou para a cadeira de primeiro-ministro.
Foi
durante a presidência do “liberal” Medvedev que o Kremlin
experimentou no terreno a teoria da soberania limitada dos Estados
vizinhos que, antes, faziam parte da URSS, à excepção das três
repúblicas do Báltico: Estónia, Letónia e Lituânia, que já eram
e são membros da NATO. Em Agosto de 2008, a pretexto da “defesa
de cidadãos russos”, entra na Geórgia e priva esse país de parte
do seu território: Ossétia do Sul e Abkhásia.
É
verdade que Medvedev anunciou algumas reformas de abertura do sistema
político, bem como do sistema económico para modernizar o país e
libertá-lo da dependência absoluta das exportações de
hidrocarbonetos, mas praticamente nada foi feito.
Com
um Parlamento controlado e uma oposição extraparlamentar não
organizada, Dmitri Medvedev preparou condições ainda mais cómodas
para o seu “sucessor” ao fazer aumentar os mandatos presidenciais
de quatro para seis anos e os parlamentares de quatro para cinco.
Verdade
seja dita, na presidência de Medvedev, a oposição extraparlamentar
teve possibilidade de organizar melhor as suas actividades e de fazer
uma surpresa a Vladimir Putin, após a sua reeleição em Março de
2012. Os contestatários da política de “mudança de cadeiras”
conseguiram trazer para as ruas muitos milhares de pessoas,
principalmente em Moscovo e São Petersburgo.
Porém,
o Kremlin “recuperou rapidamente os sentidos” e começou a
aprovar uma série de leis que visavam limitar os movimentos da
oposição. Basta recordar a lei que equipara as organizações de
defesa de direitos humanos que recebem apoio do estrangeiro a
“agentes” (palavra que, em russo, tem uma conotação clara com
serviços secretos), ou as chamadas “leis anti-gay”, etc."
9 comentários:
As negociações de gás não estão a dar resultados.
Parece que vamos ter um corte de gás.
Isto vai ficar muito complicado e vai sobrar para a Europa.
Agora no Verão ainda vamos poder brincar aos cortes, mas vai ter que estar resolvido até ao Inverno.
E com isto parece-me que vai haver ainda mais pressão no South Stream.
"Basta recordar a lei que equipara as organizações de defesa de direitos humanos que recebem apoio do estrangeiro a “agentes” (palavra que, em russo, tem uma conotação clara com serviços secretos)"
Sim, é realmente estranho, diria até censurável, que organizações financiadas por "sabe-se lá quem" no estrangeiro sejam conotadas com "quintas colunas"... Só mesmo uma mente retorcida para pensar tal coisa :)
PM, relativamente ao SS, qual é, de momento, a posição da Bulgária e da Sérvia?
Caro José Milhazes
Apreciei muito a sua comunicação.
Especialmente a 1.ª e 2.ª parte, que julgo magistrais.
De facto, em toda a sua história, nunca a Rússia esteve tão próxima de ser uma democracia representativa, parlamentar e liberal, do tipo das ocidentais, como no tempo de Gorbachov.
Uma experiência breve, que rapidamente retrocedeu por variadas razões, a maior parte das quais atribuo à incapacidade política de Gorbachov de governar segundo a realidade de então.
Quanto à "abdicação " de Ieltsin em favor de Putin, acrescentaria que o bombardeamento americano da Sérvia e o seu profundo impacto na Rússia deverá ter sido o momento chave em que Ieltsin perdeu os seus apoios políticos e foi forçado a demitir-se. Creio que lhe foi dada a escolha entre sair a bem, com plena imunidade para si e para a sua família e conservando a fortuna, ou sair a mal e sofrer um destino tipicamente soviético.
A narrativa histórica que começou e desenvolveu de forma notavelmente articulada, escorreita, factual e pertinente, face ao tema da comunicação, merecia um epílogo de igual calibre.
A meu ver, arrematou a sua narrativa histórica sem a profundidade, a pertinência e o rigor factual com que iniciou e desenvolveu o tema.
Entendo que as leis que impedem o financiamento de ONG´s russas com recurso a capitais estrangeiros, colocam entraves a manifestações na via pública e proíbem a propaganda da homosexualidade não constituem sinais distintivos e relevantes de que existe retrocesso ou paralisia do país e da sociedade em evoluir para uma democracia de amplas liberdades.
Os efeitos perversos e nefastos para a criação de Estados de direito democrático que resultam do financiamento de ONG´s nacionais pelo departamento de estado americano, por fundações de falsos filantropos como George Soros e quejandos, são agora visíveis na Ucrânia e, desconfio, na Venezuela e Brasil, como no passado sucedeu na América Latina e em países árabes.
Há tempos, numa tarde de sábado e fazendo zapping nos canais da TV Cabo, fiquei escandalizado ao ver que num programa (reality show) americano dois gajos se comiam (literalmente) um ao outro. Programas desse tipo começam a proliferar a ponto de constituir a apologia de um estilo de vida, mais do que um espelho de determinada realidade. Acho que, pelo conteúdo e pela hora da sua divulgação, tal deveria ser legalmente proibido, como outros conteúdos são proibidos de ir para o ar, e não vejo que a democracia portuguesa fique em crise. É uma posição que é comungada por dezenas, se não centenas de milhões de cidadãos da UE, que não belisca a democracia e a liberdade de expressão porque existem outros valores conflituantes.
Quanto aos limites de manifestação, proibindo manifestações em certos locais públicos, o mesmo sucede em Portugal e nas democracias que pretendem moralizar a Rússia. Basta dizer que uma manifestação de ucranianos em frente à embaixada russa de Lisboa foi desmobilizada pela PSP só porque não estava autorizada, quando o artigo 45.º, n.º 1 da Constituição da República Portuguesa expressamente permite a liberdade de reunião e manifestação pacíficas em locais públicos "(...) sem necessidade de qualquer autorização".
Continuação:
Existem outros factos políticos que são mais relevantes para apreciar se o copo da democracia russa está meio cheio ou meio vazio.
No actual momento da Rússia acho importante salientar que Putin está numa condição única para encher o copo da democracia russa, como ninguém esteve antes dele.
Claramente ultrapassou e libertou-se da ortodoxia política que o lançou e apoia e conquistou prestígio, apoio popular e poder efectivo suficientes para promover uma política realística (não fantasiosa, temerária e teórica à maneira de Gorbachov) de democratização crescente, se necessário for à revelia e contra os poderes intermédios em que se apoia. Por outro lado, mostra ser um líder racional e pragmático, que é capaz de fazer uma leitura do mundo contemporâneo e das mudanças e dos desafios que este inexoravelmente coloca e colocará, bem como de lhes dar respostas teóricas e práticas bem sucedidas (i.e. organização política do Estado, criação de instituições, reforço do Estado de Direito, reforço da soberania política e económica, ...).
Contra ele deporará o facto de ser um homem de cultura soviética, como todos os do seu tempo, restando saber em que medida saberá ele ver mais além da ortodoxia política em que foi criado. E no seu caminho poderá ele contar com uma política adversa à democratização da Rússia que vem e virá de Washington. Uma política de contenção, de cerco e de sitiamento, cuja consequência lógica e natural é remeter o seu alvo a um recuo a formas mais autoritárias de governo para salvaguarda desse Estado sob ataque.
Enfim... se Putin conseguir criar uma classe média numerosa, suficientemente abastada e intelectualmente dotada, fruto de um ensino de qualidade e de liberdades cívicas (viajar pelo estrangeiro, navegar pela internet e de ver como se vive por todo o mundo, etc) como está a conseguir fazer, já terá dado o maior contributo da história russa para a democratização do seu país.
Se assim for, Putin terá feito mais pela democracia do que alguma vez fez Gorbachov e outros bem-amados do ocidente.
Terá criado uma sociedade e economia capazes de evoluírem pacífica e ordenadamente para tomar o seu justo lugar na sociedade das nações democráticas.
Bem haja, José Milhazes, pelo seu prestimoso trabalho e serviço.
Caro Pippo,
Quanto à Sérvia é mais rápido de dizer.
Estes estão numa posição de expectativa, eles querem o South Stream, mas estão completemante dependentes das decisões de terceiros.
Quanto à Bulgária, a coisa é muitíssimo mais complicada.
Eles estão debaixo de uma pressão enorme e vai ter que haver esclarecimentos políticos internos para se perceber como a coisa vai ficar.
Não vai ser fácil, eles são a chave para a existência do South Stream. Russos, Americanos e Europeus sabem disso e todos eles vão fazer pressão à sua maneira.
A facção europeia anti-South Stream junto com os americanos, estão pressionar imenso a Bulgária.
Do outro lado temos os italianos e franceses que serão os apoiantes de maior peso. Mas a situação ucraniana, impede movimentos mais activos a favor do pipeline, pois apoiar a Rússia tem custos políticos e no caso da França, já tem o problema dos Mistral.
A Bulgária de certa maneira está dividida e pressionada da mesma forma que a Ucrânia. E os "jogadores" são os mesmos.
De facto. Quem olhar para a USAID; O BM; Foundation for defence of democracies, dirigida pelo ex-directora da CIA; a Westminster Foundatio for Democracy de David Cameroon; a NED financiada pelo congresso americano, não pode deixar de pensar: será que os EUA, pais ultra capitalista, cada vez mais militarizado, fazem estas fundações para ajudar? Bem, quem quiser acreditar no conto da carochinha, esteja à vontade, mas o que a história real mostra é que estas organizações, na maioria dos casos não são mais do que portas de entrada da CIA e Pentágono para os países em que se instalam. Claro que a lei de Putin pode ( e se calhar é) implicar injustiças diversas para com associações realmente virtuosas, contudo, quem sabe, como ele, como foi que Ieltsin chegou ao poder e como a URSS caiu, não pode deixar de se sentir ameaçado por tais organizações, que de bom e válido, apenas têm o nome. De resto, mais não são do que organizações que visam estender o poder ultra liberal americano a todo o mundo, fazendo confundir capitalismo com democracia e liberdade com liberalismo. Aí, percebem-se os receios de Putin, até porque já as utilizou a seu favor para afastar o poder do Partido Comunista Russo. Agora está ele na linha de fogo e, ckmo qualquer militar e ex-agente secreto, sabe como se fazem as coisas e através de que organizações.Para mim é mais condenável a utilização destas organizações para fins obscuros, do que a decisão de Putin as diabolizar. Quem começou por dar mau nome às ONG's foram os EUA, não Putin. Putin defende-se como qualquer autoritário (como o fez Bush, Nixon, Reagan, Tatcher..)o faria. Surpresa? Só para quem não vê ou não quer ver.
Rússia adversa á democracia bla bla bla bla.....
E então?E for adversa á democracia?
Porque raio é uma heresia alguém sequer por em causa "a democracia"?
A humanidade tem milhões de anos e a democracia tem menos de uma centena.
Alguém que se dê ao trabalho de contar o mortos provocados por essa nova religião chamada democracia, e depois pense um pouco.....
Quem até hoje usou bombas antónias?
Não foi um pais democrático?
Porque é que a corrupção e o esbulho aos povos é enorme em paises "democraticos"?
Porque é que a decadência, prostituição, drogas, sida, casas dos segredos, novelas prosperam precisamente em regimes totalitários democráticos?
Eu quero que a democraCIA se Fo......
"Basta recordar a lei que equipara as organizações de defesa de direitos humanos que recebem apoio do estrangeiro a “agentes” (palavra que, em russo, tem uma conotação clara com serviços secretos), ou as chamadas “leis anti-gay”, etc."
Caro Milhazes, nem parece seu. Claro que quem é financiado por um governo estrangeiro, é um agente estrangeiro, e bem, mas não é só na Rússia. E a questão dos gays é mais propaganda para enterter papalvos pela CS Ocidental, como bem sabe quem já foi a Moscovo ou Leningrado, ou mesmo Novosibirsk. Não será a Holanda, mas também está longe de ser a Arábia Suadita...
"Em Agosto de 2008, a pretexto da “defesa de cidadãos russos”, entra na Geórgia e priva esse país de parte do seu território: Ossétia do Sul e Abkhásia."
Bom aqui está-se a esquecer da influência do maníaco comedor compulsivo de gravatas Sakhasvile, aluno das melhores Universidades Americanas e psicótico diagnosticado... mais uma vez não foi acção Russa, foi reacção a uma alteração de situação que estava latente desde os 90´s...
Quanto ao resto, bom artigo (factualmente), mas falta-lhe algo - o sentimento dos russos comuns nisto tudo (Perestroika, 90´s e após Putin)... pois isto ajudaria a perceber porque é que eles se sentiram traidos antes, e não se sentem traidos agora e avalizam o governo e a oposição parlamentar (e não a ficticia inventada em Washington, os tais agentes estrengeiros)!...
"mas falta-lhe algo - o sentimento dos russos comuns nisto tudo (Perestroika, 90´s e após Putin)"
O último russo com quem eu falei, ex-engenheiro militar na casa dos 40 anos, foi muito peremptório quando falou do Gorbachov: "esse filho da puta com aquela merda de mancha na careca".
I rest my case.
Enviar um comentário