domingo, agosto 11, 2019

Olhar da Rússia para o mundo - 5

Palestra no EMGFA (continuação)

Assim estamos a assistir à Rússia com uma nova política Africana, que nas palavras de Putin significa que “desta vez a política africana tem que dar dinheiro”, não será como as políticas da União Soviética que exportavam aquelas maquinetas que não funcionavam em África e construíram umas centrais hidroelétricas, mas fundamentalmente o que enviavam eram armas. Hoje a Rússia tem uma política diferente. A Rússia tenta entrar nos países onde são extraídos metais ou matérias primas que concorrem com a Rússia no mercado internacional. Diamantes em Angola, ou ouro no Zimbabué ou outros metais. Na República Centro-Africana, também existe essa política. Na Líbia, o petróleo porque a Rússia tem fortes interesses no petróleo líbio, e por isso a Rússia tenta ocupar estes lugares deixados vagos, pelo Ocidente, principalmente em situações de conflito, onde há guerras entre numerosos grupos e tenta, dessa forma, entrar e mexer-se para garantir alguns dos seus interesses. 
Se falarmos da América Latina, temos dois vectores contraditórios. 
Por um lado, a Venezuela, onde a Rússia tem grandes interesses e de onde só sairá se esses interesses ficarem seriamente guardados e garantidos, porque a Rússia já está farta de assinar papeis, sem efeitos práticos. Neste caso, julgo que não se trata de a Rússia pôr em causa a influência de Monroe ou pôr em causa a influência Norte Americana na América Latina, mas sim uma forma de a Rússia ganhar força para discutir questões noutros lugares, nomeadamente na Ucrânia ou em outras zonas da antiga União Soviética. 
Quero chamar a atenção para um acontecimento ocorrido há poucos dias… Por incrível que pareça os Estados Unidos, a União Europeia e a Rússia, na pequena Moldávia, conseguiram chegar a acordo e fazer um milagre… conseguiram destituir os corruptos que lá estavam no poder e restabelecer o regime democrático naquele país. Claro que a Moldávia é um país pequenino, é um país muito pobre, mas isto é um bom sinal! É sinal que nem sempre é obrigatório estarmos todos em conflito, tanto mais em zonas sensíveis, tanto para a Rússia como para a NATO, como é a Moldávia, que é junto à Roménia, que tem uma série de problemas complicados... 

Na América Latina, temos a questão do Brasil, porque o senhor Bolsonaro não promete nada de bom em relação ao projeto dos BRICS. Alguns apresentaram o projeto dos BRICS como o aparecimento de uma daquelas super-organizações, que agora é que vai ser, que os Estados Unidos vão ficar para trás, mas ao que tudo indica, o senhor Bolsonaro não está muito disposto a prejudicar as suas relações com o Trump em nome da integração nos BRICS. Por isso, neste momento, o projeto é uma organização que está congelada, ou seja, existe, mas não funciona de forma visível e ativa. 
Quanto à relação com os Estados Unidos e com a Europa, aqui as questões são complicadas porque muito vai depender da política de Donald Trump em relação à Rússia, à Europa e a outros países. Se esta política que ele tenta, pelo menos publicamente mostrar, que a política internacional para ele é uma espécie de grande empresa em que ele é o sócio maioritário, e que está disposto a falar com os outros sócios e a assinar acordos com eles, mas nas condições dele. Se assim é, e parece que foi o que aconteceu com o México, ele conseguiu pelo menos aparentemente ganhar a batalha com o México, se conseguir chegar a um acordo com a China, isso será de extrema importância porque permitirá ao Senhor Trump continuar, ou não, com essa política. 
Os russos estão extremamente preocupados com esse eventual acordo… Na minha opinião, os russos já se arrependeram de ter apoiado e se congratulado com a eleição de Donald Trump, porque as relações entre a Rússia e os Estados Unidos, neste momento, não podiam estar piores do que o que estão. 
Não poderão ficar melhor, no próximo ano, se acabarem com o último Tratado do período de desanuviamento, que é o tratado de limitação dos mísseis de longo e médio alcance. Se os Estados Unidos e a Rússia saírem desse acordo, o mundo ficará sem qualquer tipo de acordo nesse campo. 
Com o Direito Internacional que hoje temos, e a forma como é cumprido, não sei se os acordos têm alguma validade… porque, hoje, o Direito Internacional só serve quando é aceite por “alguém”. E recordando tempos mais atrás, a Rússia não teve problema em esmagar completamente a resistência nacionalista da Tchetchénia, defendendo a sua integridade territorial… Mas, agora, acha que a Ucrânia não tem direito a fazer o mesmo, e isto dá origem a que muita gente acredite que o senhor Putin é a salvação, é um anti-imperialista que trouxe às relações internacionais uma nova etapa…

(continua)

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