terça-feira, julho 21, 2015

Fragmentos da Memória-2 (Gil Eanes)



Aproveitando uma rápida passagem pela bela cidade de Viana do Castelo, não pude deixar de visitar com a minha família o Navio-Hospital Gil Eanes, hoje museu atracado num dos cais. Isto porque foi o seu pessoal médico que salvou a vida do meu pai no final dos anos de 1960.
Nessa altura, o meu defunto pai, José Marques Pinto, era tripulante do navio bacalhoeiro “Vaz”, que pescava perto da Terra Nova. Durante a faina, em alto mar, rebentaram-lhe duas úlceras no estômago e ele teve de ser urgentemente transportado para St. John's (São João da Terra Nova). Foi precisamente o corpo médico do Hospital Gil Eanes que lhe prestou os primeiros socorros e o conseguiu transportar para um hospital canadiano, onde foi operado com êxito.
                                       Sala de Operações
Naquela altura, as comunicações não eram tão rápidas como hoje. A notícia da doença do meu pai chegou-nos através de uma carta, o que nos deixou bastante preocupados e angustiantes durante algumas semanas. Mas, um dia, inesperadamente, chegou a casa são e salvo.
Não sei se existe ou não alguma obra publicada sobre a história do “Gil Eanes” e sobre os homens que nele trabalharam, mas mereciam muito. Salvaram muitas vidas, aliviaram as dores de muitos dos pescadores do bacalhau.
                                 Enfermaria

Antes do 25 de Abril de 1974, o pescador de bacalhau era das profissões mais ingratas, tratava-se de autênticos escravos. Recordo muitas histórias que o meu avô materno, pai, tios, primos e irmão contavam sobre esse trabalho, relatos inacreditáveis sobre seis meses no mar sem as mais elementares condições sanitárias, com uma alimentação extremamente pobre e um horário de trabalho que podia ir até às 16 ou 18 horas de trabalho.
O salário vinha apenas no fim da viagem, por isso, as mães e mulheres tinham que frequentemente de recorrer “ao prego” para conseguir algum dinheiro para sustentar a casa.
                            Para recordar mais tarde
Por esta e outras razões não compreendo aqueles que defendem que se vivia melhor antes da “Revolução dos Cravos”. Alguns, muito poucos, até podiam viver. Enquanto hoje, muitos dos netos e bisnetos dos pescadores de bacalhau são médicos, enfermeiros, biólogos, engenheiros, jornalistas, etc. Basta visitar a Póvoa de Varzim, Caxinas, Matosinhos, Aveiro, Ílhavo e muitos outros lugares de onde eram originários os pescadores do bacalhau para se compreender que Portugal deu um salto civilizacional depois de 1974.
Aqui fica o meu tributo ao Navio-Hospital “Gil Eanes”.


P.S. Recentemente, visitei o Museu do Bacalhau em Ílhavo e não gostei. Os espaços estão mal aproveitados, a exposição, à excepção do aquário com bacalhaus, é pouco viva, pouco interessante.  

1 comentário:

jr disse...

Se porventura o José Milhazes estiver interessado talvez possa pô-lo em contacto com uma filha do último ou dos últimos comandantes do navio Gil Eanes. Há muito tempo que não a contacto por isso não sei a disponibilidade da pessoa. Agradeço os seus escritos que leio com atenção. JJaneiro

cidadeinclusiva@gmail.com