Estónios repetem experiência da Letónia e Lituânia e escolhem para Presidente um cidadão nascido no estrangeiro
O Colégio de Eleitores da Estónia, numa reunião realizada hoje, escolheu um social-democrata, Toomas Hendrik Ives (na foto), Presidente da República. Este candidato recebeu 174 votos a favor de um total de 345 membros do Colégio de Eleitores, derrotando Arnold Rüütel, que ocupa actualmente o Palácio Kadriorg de Tallinn, residência oficial do Presidente estónio.
Toomas Hendrik Ives, actual vice-presidente da Comissão de Negócios Estrangeiros do Parlamento Europeu, foi eleito com o apoio de vários partidos do centro e da direita (Partido das Reformas, União da Pátria, República e Partido Social-Democrata).
Ilves nasceu a 26 de Dezembro de 1953 em Estocolmo, capital da Suécia, numa família de cidadãos estónios fugidos à ditadura comunista soviética, imposta na Estónia depois da Segunda Guerra Mundial. A sua avó, pela linha materna, era russa e originária de São Petersburgo. A sua mãe nasceu também nessa cidade russa e, juntamente com o avô, foram viver para a Estónia, a fim de fugir ao regime comunista na União Soviética. Porém, no Outono de 1944, a sua família, tal como dezenas de milhar de estónios, viu-se novamente obrigada a atravessar o Mar Báltico e a encontrar refúgio na Suécia.
Mais tarde, a família de Ilves muda-se para os Estados Unidos, onde ele estudou Psicologia nas Universidades da Colômbia e Pensilvânia. Entre 1984 e 1988, trabalhou como analista político do Instituto de Investigação da Rádio "Free Europe" em Munique e, entre 1988 e 1993, ocupou o cargo de vice-chefe da redacção estónia dessa rádio.
Depois do restabelecimento da independência da Estónia em 1991, regressou à terra dos seus antepassados. Em 1993, foi nomeado Embaixador Extraordinário e Plenipotenciário da Estónia nos EUA. Em 1996-1998 e 1999-2002, ocupou o cargo de Ministro dos Negócios Estrangeiros da Estónia. Foi precisamente na qualidade de chefe da diplomacia estónia que Toomas Hendrik Ilves visitou oficialmente Portugal em 2000. E, 2004, foi eleito deputado do Parlamento Europeu. Ilves fala, além de estónio, inglês, alemão, espanhol, francês e finlandês.
Os órgãos de informação da Estónia consideraram que esta campanha eleitoral foi não só uma das mais renhidas, mas também uma das mais "sujas" depois do restabelecimento da independência deste pequeno Estado do Báltico em 1991. Por exemplo, os apoiantes do actual Presidente, Arnold Rüütel, acusaram Ilves de ser "arrogante", "cosmopolita" que nasceu na Suécia, "viveu a maior parte da vida na América" e "conhece mal o povo estónio". Os seus adversários não tiveram mesmo pejo de recorrer a insinuações anti-semitas para denegrir a figura de Ilves, procurando "sangue judeu" na linha materna dos seus antepassados. Claro que não faltaram também as acusações de Ilves ser "agente da CIA".
Com a derrota de Arnold Rüütel, desaparece a última figura de entre os dirigentes estónios saídos do período soviético, abrindo caminho a uma geração de políticos bem mais jovem.
Com a eleição de Ilves, a Estónia junta-se às suas vizinhas do Báltico: Letónia e Lituânia, cujos presidentes nasceram no estrangeiro. A Presidente letã nasceu no Canadá e o seu homólogo lituâno nos Estados Unidos. Será que os povos bálticos chegaram mesmo à conclusão de que "santos da casa não fazem milagre"?
É de assinalar que a eleição do Presidente da Estónia não é feito através de escrutínio directo, mas de um processo extremamente complicado. O nome dos candidatos a esse cargo é votado no Parlamento, sendo eleito o que consegue o apoio de mais de 2/3 dos deputados. Caso não seja possível escolher assim o Chefe de Estado, a eleição é realizada por um Colégio de Eleitores, formado pelos deputados do Parlamento e representantes do poder local. Foi precisamente desta forma que foi eleito Ilves.
Durante a sua campanha eleitoral, Ilves apresentou como um dos principais objectivos "superar a divisão da sociedade estónia". Tarefa difícil se tivermos em conta que quase metade da população da Estónia é russófona e que ainda falta fazer muito para integrar este segmento da população na língua, cultura e sociedade estónias.
1 comentário:
Caro leitor, na postagem escrevi que o candidato social-democrata foi eleito com o apoio de partidos do centro e da direita, e não apenas da direita. No Leste da Europa, as categorias políticas são bem diferentes daquelas com que nos habituámos a operar na Europa Ocidental. Resumindo, Ilves é um defensor da democracia e do pluralismo económico.
Quanto ao actual Presidente estónio, Arnold Rüütel, ele militou muitos anos no Partido Comunista da União Soviética e, depois da independência da Estónia, dirigiu um partido de esquerda que defende os interesses dos camponeses.
Claro que, actualmente, seria um erro chamar a Rüütel comunista. Trata-se de um político de esquerda que, enquanto Presidente, respeitou os princípios democráticos do Estado estónio. Não sei se ficou muito esclarecido, mas é difícil conotar os políticos da Europa do Leste com a esquerda e a direita clássicas. Na Rússia,por exemplo, o Partido Comunista é uma força "reaccionária", pois quer fazer voltar a sociedade ao passado ditatorial soviético.
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