segunda-feira, setembro 25, 2006

Kremlin quer controlar petróleo e gás na Rússia



Autoridades moscovitas travam aspirações das petrolíferas ocidentais

A petrolífera anglo-holandesa Royal Dutch/Shell está a ser alvo de fortes pressões da parte das autoridades russas para que aceite ceder à Gazprom, controlada pelo Estado, 25 por cento das acções do projecto de exploração de gás e petróleo Sakhalin II, em que também participam as companhias japonesas Mitsui e Mitsubishi e onde já foram investidos mais de 15 mil milhões de euros. Desta vez, o Kremlin escolheu a ecologia como alavanca de pressão."O Procurador-Geral da Rússia publicou um comunicado que anula o decreto de aprovação do acordo após um relatório ecológico. Somos obrigados a cumprir essa decisão" - declarou Rinat Guizatulin, porta-voz do Ministério dos Recursos Naturais da Rússia. O mesmo poderá suceder aos projectos Sakhalin I da da empresa americana ExxonMobil, Khariaga da francesa Total e Kovikta da empresa mista russo-inglesa TNK-BP.O Sakhalin II é o principal energético privado do mundo do mundo, com investimentos da ordem dos 15 mil milhões de euros. A petrolífera Shell detém 55 por cento das acções, enquanto que as empresas nipónicas repartem o resto (25 e 20 por cento respectivamente). O monopolista de gás russo, Gazprom, está em negociações com a Shell para comprar-lhe 25 por cento das acções. Em 2005, a Gazprom tinha chegado a um acordo com a Shell para trocar esse número de acções por um pacote de acções de um jazigo seu de gás no Ártico. Porém, esse acordo foi assinado quando os custos de Sakhalin II eram avaliados em cerca de 7.500 milhões de euros. Há poucos dias atrás, a Shell anunciou que o custo tinha disparado para o dobro, o que, naturalmente, indignou a Gazprom, que não tinha sido informada da subida antes da assinatura do acordo.A decisão das autoridades russas põe também em causa a segunda etapa do projecto, que inclui os jazigos de Piltun-Astoi e Lunski, com reservas de 150 milhões de toneladas de petróleo e 500 milhões de metros cúbicos de gás, a construção de gaseodutos e oleodutos entre o Norte e o Sul da Península da Sakhalina, a construção de uma fábrica de liquefação de gás e um terminal portuário de petróleo.
Kremlin "lembra-se" da ecologia
A decisão da Procuradia Geral da Rússia baseia-se em queixas apresentadas pela Agência de Controlo da Natureza, apresentadas no fim do mês passado. Oleg Mitvol, dirigente desse órgão, declarou que dezenas de hectares de bosques tinham sido destruídos e que milhares de peixes tinham morrido durante os trabalhos de prospecção.As organizações ambientalistas russas e ocidentais desde o início da realização do projecto que vêm chamado a atenção para os prejuízos ecológicos provocados pelo Sakhalin I e saudaram a suspensão do contracto, mas revelam perplexidade face ao facto de essa decisão coincidir com o conflito entre a Shell e a Gazprom. Isto é tanto mais estranho quando se constata que as autoridades russas se têm preocupado muito pouco com autênticos crimes ecológicos cometidos pelas empresas nacionais."Todas as observações feitas ao operador do projecto Sakhalin Energy não podem ser fundamento para suspender o processo. Não se pode dizer que o operador não reage às nossa observações. Nas partes problemáticas da construção, foi a própria companhia que suspendeu os trabalhos e, agora, juntamente com institutos técnicos, procura novas soluções de engenharia" - declarou Ivan Malakhov, governador da Sakhalina, concluindo: "É um absurdo organizar um show em torno do projecto Sakhalin II". Existe mais uma razão para se supor que se trata de uma ofensiva do Kremlin pelo controlo do sector do gás e petróleo.O projecto Sakhalin II desenvolveu-se na Rússia no âmbito da chamada Lei da Produção Compartida, uma fórmula utilizada para atrair investimentos estrangeiros. Em poucas palavras, consiste em que o Estado não cobra todos os impostos que deveria cobrar dos investidores até que estes recuperem o custo do projecto que desenvolvem. No caso de Sakhalin II, antes da recuperação dos gastos, o Estado receberá cerca de 23,6 milhões de euros e, depois disso, nos cofres públicos entrarão 1.557 milhões de euros.A Lei da Produção Compartida era vantajosa para a Rússia quando os preços dos hidrocarbonetos estavam baixos e o Kremlin se debatia com grave falta de meios financeiros. Porém, actualmente, o Governo russo não sabe o que fazer com o avalanche de dinheiro provocada pelo aumento do preço do petróleo e gás nos mercados internacionais.Além disso, o Kremlin não está interessado em que um projecto privado de tão grande envergadura como o Sakhalin II tenha êxito. Só assim terá motivos para continuar a política de "renacionalização" das grandes petrolíferas russas.

Sem comentários: