domingo, novembro 12, 2006

Contributos para a História


Recentemente, o militar na reserva e jornalista russo, Alexei Sukonkin, publicou o livro “Campanha para a Pensão”, onde descreve o seguinte episódio das relações entre a União Soviética e Moçambique:
“Em 1976, um grupo de conselheiros militares soviéticos foi feito refém em Moçambique. A operação foi dura: foi liquidada praticamente toda a guarda, constituída de soldados moçambicanos.
Nessa altura, a URSS já há vários anos que ajudava activamente Moçambique independente na luta de libertação nacional contra as “artimanhas do imperialismo”. A ajuda era concedida sob a forma de fornecimento de armamentos e injecções financeiras ao partido comunista nacional Frelimo. Pelo seu lado, o Governo de Moçambique fornecia à URSS matéria-prima das suas minas de tântalo e jurava fidelidade e ajuda mútua.
Em 1976, quando o Presidente do país, Machel, reforçou definitivamente as suas posições, os fornecimentos de armamentos da União Soviéticaforam suspensos por não serem objectivamente necessários. O Comité Central do Partido Comunista da União Soviética (PCUS) considerou que a construção do socialismo em Moçambique estava garantida e que existiam condições para que Machel abrisse caminho para o futuro radioso “com as suas forças”, apoiando-se apenas no dinheiro ganho com o tântalo vendido.
Habituado à ajuda militar de Moscovo, Machel, de súbito, perdeu muito e, principalmente, a sensação de uma força de protecção atrás de si. Porque ele não podia, devido à ingerência dos “imperialistas”, estabelecer contactos com outros países para adquirir armas de qualidade. Tanto mais que ele planeava realizar uma série de razias nos estados limítrofes com vista exclusivamente ao enriquecimento pessoal. Tentou convencer, através de palavras e conversações, da necessidade do restabelecimento do fornecimento de armas, mas não conseguiu.
Nessa altura, a GRU (Direcção Principal de Reconhecimento) [espionagem militar soviética] do Estado Maior já tinha entregue no CC o seu relatório sobre o estado e perspectivas do desenvolvimento económico, político e militar de Moçambique, onde a possibilidade do fracasso da construção do socialismo tinha sido completamente excluída. Do ponto de vista da GRU, a situação em Moçambique era relativamente estável.
Resumindo, o CC do PCUS deu a entender, de forma suave, a Machel que era preciso trabalhar mais do que pedir ajuda. “Tu és o chefe, então dirige” – foi a resposta a Machel. Além disso, a ajuda humanitária seguia da URSS para Moçambique com a mesma intensidade. Os mais velhos lembram-se bem disto: “...as crianças moçambicanas gostam muito de leite condensado...”
Então, Machel recorreu a uma fraude. Organizou o rapto de cinco oficiais soviéticos da GRU, conselheiros no estado-maior das forças armadas de Moçambique, para demonstrar à União Soviética que no país supostamente existiam ainda forças antigovernamentais que constituíam séria ameaça ao regime. Tudo parecia ser real: bandos da oposição ou destacamentos especiais de vanguarda da República da África do Sul, com o apoio das espionagens imperialistas, movimentam-se ousadamente no país, raptando representantes soviéticos. Isto seria bom para mascarar razias, mas para isso faltavam armamentos! E tinham sido retirados instrutores inteligentes! Com o que combater e pilhar?
A GRU suspeitou dos verdadeiros objectivos de Machel e, por isso, foi decidido realizar uma operação especial. O Ministério dos Negócios Estrangeiros da URSS propôs a Moçambique que organizasse, o mais rapidamente possível, a busca e libertação dos oficiais desaparecidos. Machel não fez isso.
Um mês depois, no porto de Maputo entraram dois navios de guerra da Armada do Índico da URSS. A bordo de um dos barcos encontrava-se o 263º batalhão de fuzileiros, contituído por 300 homens. Uma hora depois, os fuzileiros simplesmente desembarcaram, sem terem ordem para avançar. O batalhão fumava, revistou o cais e pôs-se a gozar o forte sol africano. Duas horas mais tarde, os serviços secretos moçambicanos “descobriram e libertaram” os reféns. Machel tirou as devidas conclusões e, um mês depois, assinou com a URSS o Tratado de Amizade e Cooperação e não desviou mais a linha do partido...
O desembarque demonstrativo de centenas de fuzileiros, falando literalmente, restabeleceu as relações favoráveis entre os países que estavam a ser perdidas. No fundo, esse batalhão de fuzileiros simplesmente fez chegar à consciência dos políticos de Moçambique a política inabalável do Partido Comunista da União Soviética e a firmeza das decisões do Comité Central. Isto chama-se precisamente: “”a palavra apoiada pela pistola...”
O Presidente da República Popular de Moçambique, camarada Machel compreendeu instantaneamente que, se Moscovo quiser, no lugar de um pequeno batalhão demonstrativo, em Maputo pode desembarcar a 55ª divisão de fuzileiros navais da Frota Militar da URSS e, então, ele já não será Presidente do país. Talvez até ele já esteja no outro mundo.
Claro que a causa do desembarque do batalhão de fuzileiros navais não foram os cinco oficiais soviéticos. Nem o desvio político de Machel. A União Soviética, antes de tudo, estava interessada nas minas de tântalo de Moçambique. Mas essa verdadeira causa ficou nos bastidores. Os cinco oficiais foram apenas o pretexto para demonstrar a sua força ao desobediente Machel e a uma série de outros dirigentes dos países do terceiro mundo que se encontrava debaixo da asa da URSS e acompanharam, com grande interesse, o desenvolvimento desses acontecimentos. A demonstração foi bem sucedida. Não só Moçambique, mas muitos países do terceiro mundo encaixaram esta lição dada com perícia”.

9 comentários:

RioDoiro disse...

"Tanto mais que ele planeava realizar uma série de razias nos estados limítrofes com vista exclusivamente ao enriquecimento pessoal."

Essa é forte.

...

Anónimo disse...

Efectivamente é totalmente descabida a afirmação de que Samora planeva realizar uma série de razias nos estados limítrofes com vista exclusivamente ao enriquecimento pessoal.
Essa não cabe na cabeça do mais acérrimo colonialista, anticomunista ou aparentado.

jpt disse...

citacao sem comentario do bloguista? assume o que esta escrito? Estou com o comentario anterior, machel em razias no estrangeiro para enriquecimento eh um absurdo e uma falsidade historica. isto nao tem credibilidade e conspurca o blog-sede

Diogo disse...

O que é que as ex-repúblicas soviéticas da zona do Cáspio pensarão desta «democratização à força»:

Esta foi a resposta do “Correspondente para os assuntos do Médio Oriente» Aasif Mandvi, do Daily Show, à pergunta de Jon Stewart sobre a descrição que a Secretária de Estado Condoleezza Rice fez da horrível violência no Médio Oriente, chamando-lhe «dores de parto». Rice acrescentou também que cada crise traz consigo uma oportunidade.

Jon Stewart: Então não há ressentimentos pelas mudanças terem sido impingidas aí?

Aasif: Não, não, de forma nenhuma. Ao longo dos anos, habituámo-nos a pensar em nós como vocês pensam de nós: minúsculas gotas abstractas num possível campo petrolífero. Estamos sempre desejosos de experimentar as últimas teorias dos vossos cientistas políticos.


Jon Stewart: É uma forma incrível de enfrentar uma situação terrível.

Aasif: Penso que não é diferente da forma como a vossa nação reagiu aos acontecimentos do 11 de Setembro. Um dia difícil, uma grande oportunidade.

Vídeo – 4:18m

Da Rússia, de Portugal e do Mundo disse...

Caro JPT, eu citei um livro editado, onde se fazem essas revelações. Os leitores lêem e formam a sua opinião. Quanto à minha opinião sobre o que está escrito, não posso dizer que esteja formada, porque ainda há muita coisa que não foi revelada.
Se alguém tiver provas em contrário, envie que eu publico. Trata-se de um episódio histórico demasiadamente significativo para deixar passar ao lado publicações destas.

Anónimo disse...

Não consigo entender a credibilidade de uma coisa destas…
Levantam-se calúnias sobre pessoas que ainda por cima já não se podem defender e depois os outros é que têm de arranjar argumentação para desaprovar as falsidades.
É do senso comum que Samora Machel nunca poderia «fazer uma série de razias nos estados limítrofes com vista exclusivamente ao enriquecimento pessoal».
Em minha opinião o responsável pela publicação desta atoarda é que tem que justificar porque transcreveu isto…
Fico a aguardar desenvolvimentos…

Da Rússia, de Portugal e do Mundo disse...

Caro leitor, volto a frisar que citei apenas o livro de um antigo militar soviético e jornalista. O texto está entre aspas.
Você, antes de ler esse texto, imaginava centenas de soldados soviéticos a invadir Maputo?
A propósito, leia a postagem que publico a seguir, talvez esclareça alguma coisa

Anónimo disse...

Jose Milhazes V. tem alguma razao, esta apenas a citar. Mas edita, tambem. O que implica, pelo menos, aspas para este "apenas" a citar. Dai o meu comentario anterior diante de um post "Contributos para a historia".
Nao tenho qualquer prova, mas o texto parece-me mais do que especulativo. Comecando pela data, 1976 - considerada como concluida a construcao do socialismo. Que estranha concepcao, mesmo sob o ponto de vista militar (guerra episodica com a entao Rodesia, em mocambique chamada "guerra de smith", por iniciativa rodesiana)
mas o que me chama a atencao 'e o postulado de um machel cleptocrata e tendente a invasao (pro-rapina) de estados vizinhos - o que eh uma absoluta falacia: parte-se de um padrao de cleptocracia africana e ajusta-se a todos os lideres do continente. Que eu saiba murmura-se que 10 anos depois desta data apontada tera havido (talvez, nao tenho certezas) a ideia de intervir militarmente no malawi (de banda) de molde a combater a renamo. O que se tiver sido verdade eh algo completamente diferente (e nao so nas datas) `a ideia aqui avancada.

fui ler o texto seguinte, sobre as diferencas de personalidade entre machel e chissano (e, talvez, politicas). sao absolutamente pacificas, mas nada as liga conceptual ou empiricamente com as afirmacoes aqui avancadas.

da citacao fica a ideia do tal episodio militar - mas com tamanhos dislates quebra a confianca "factual" no autor do livro

cumprimentos

Cine-clube Komba Kanema disse...

Vivia em Maputo nessa altura e não me recordo de nada parecido com essa tal demonstração de força dos soviéticos.
Sobre a ideia de Samora frazer razias nos paóses vizinhos para enriquecimento pessoal, ela é tão abstruza que só pode passar por uma mente já muito toldada pelo vodka.
Vejamos quais eram os países vizinhos nessa altura: África do Sul, a maior potência militar da África sub sariana!
Suazilândia, um pequeno reino semi protectorado da África do Sul; Rodésia, outro país com forças armadas muitíssimo superiores às moçambicanas; Zâmbia, um aliado de Moçambique: Tanzania, outro aliado de Moçambique; Malawi, nessa altura (1976) ainda um vizinho com quem se mantinham boas relações.
Rudo isto é uma patacoada sem pés nem cabeça.

Machado