terça-feira, junho 02, 2009

As desventuras de Tintim na Rússia


A Rússia foi talvez o último país do mundo aonde chegaram os livros de Tintim, não obstante este herói da BD ter tido a sua primeira aventura precisamente no "País dos Sovietes".
O primeiro e, por enquanto, único livro de aventuras de Tintim chegou aos leitores russos apenas em 2004 e chama-se “Os Charutos do Faraó”.
Os especialistas russos em história da banda desenhada não têm dúvidas de que este enorme atraso na chegada das aventuras de Tintim à Rússia se deveu ao primeiro álbum de Hergé “Tintim no País dos Sovietes” (1929), obra que esteve proibida na União Soviética por ser considerada “anticomunista” e que pelo mesmo motivo continua a não chegar às mãos dos leitores chineses.
Georges Remi (Hergé) coloca os seus heróis, Tintim e Milú, no período revolucionário em que os comunistas instauravam o poder pela força, tendo-se baseado na obra “Moscou sans voiles”, de Joseph Douillet, diplomata belga que viveu e trabalhou durante nove anos na Rússia soviética.
Alguns episódios do primeiro álbum de Hergé são uma ilustração exacta de episódios descritos por Joseph Douillet, como, por exemplo, “as eleições democráticas” na aldeia com uma pistola apontada à cabeça.
Sendo o diplomata belga um anticomunista, os estudiosos russos de banda desenhada europeia consideram aí residir uma das causas da “falta de qualidade” dessa obra.
“Não obstante a abordagem extremamente pormenorizada [da situação na Rússia soviética], a primeira experiência falhou, pois deu origem a uma banda desenhada bastante primitiva que contém numerosos disparates", como a existência de um agente da polícia política soviétiva OGPU que adora bananas, considera Elena Bulakhtina, reconhecendo, porém, que “há lugares divertidos”.
Opinião semelhante tem Mikhail Khatchaturov, chamando a atenção para o facto de “Tintim no País dos Sovietes” ter sido “o único volume da série das Aventuras de Tintin que não foi posteriormente trabalhado e que, durante muito tempo, não foi reeditado”.
“Só recentemente ele voltou a ser publicado, muitos anos após a morte do autor, e por isso agora surge orgulhosamente no catálogo da série como o número um”, sublinha Khatchaturov.
Não obstante o comunismo ter caído na União Soviética/Rússia há quase 18 anos, Tintim continua a ser desconhecido entre o grande público russo, ao contrário de outros heróis da banda desenhada como Astérix. “Os Charutos do Faraó” foi a primeira e única das aventuras de Tintim a chegar à Rússia com uma edição de cinco mil exemplares, o que é extremamente pouco para um mercado livreiro tão imenso como é o russo.
Tintim parece ter-se irremediavelmente atrasado na sua chegada à Rússia, mesmo sem sovietes.

30 comentários:

~PakKaramu~ disse...
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Pippo disse...

Reconheço que "Tintim no país dos Sovietes" é, das histórias do Tintin, a que menos me agrada e cujo pendor político é mais agudo.

Esta obra deriva das convicções políticas do Hergé, que tendia para a "Direita" e não gostava memso nada dos comunistas. Após a guerra, por ter desenhado num jornal associado aos colaboracionistas, houve um grupo de gente que se agregou em frente à sua casa com o fito de fazer "justiça" pelas próprias mãos. Foi graças à pronta actuação de Edgar Pierre Jacobs (autor de Blake & Mortimer, entre outros) que Hergé foi salvo da turba. Edgar P Jacobs colocou-se à porta da casa do seu amigo e, de guarda-chuva (ou bengala) em punho, como se fosse uma rapier, afastou a multidão.

"Os charutos do Faraó" são uma excelente escolha como estreia de Tintim. É uma história muito boa e, como sempre, divertida.

MSantos disse...

"Tantana" :o)

Nome deveras engraçado para o repórter mais famoso do mundo, lido dos 7 aos 77 anos.

Esta aventura tem seguimento no álbum "O Lotus Azul" e creio que neste livro aparece o nosso compatriota, o Sr Oliveira de Figueira, grande comerciante.

Tintin e Asterix foram duas grandes referências da minha infância. Por causa dos livros de Asterix fiquei sempre intressado na história da antiguidade e as suas civilizações( gregos, romanos, egípcios, etc).

Já na idade adulta descobri a minha terceira grande referência na BD, nos livros com fantásticas histórias de Edgar P. Jacobs nos seus personagens Blake & Mortimer.

Quem se interessa por ciência e tecnologia, os livros de Jacobs são pura e simplesmente maravilhosos com enredos muito imaginativos e cativantes (descoberta da Atlântida, viagens no tempo, etc) sempre sob o prisma dos mais elevados princípios. Até o seu principal vilão, o coronel Olrik era uma espécie de cavalheiro ladrão.

Enfim, tempos idos que produziam BD e animação de elevada qualidade e criatividade que despontavam nos jovens a capacidade de idealizar e sonhar, qualidades tão em falta nos dias que correm.

Cumpts
Manuel Santos

Anónimo disse...

Adoro o Capitão Haddock, os Dupond e Dupont, a Catasfiore, O Professor Girassol. No meio disto, o Tintim até é o mais fraquito.

Pippo disse...

O Oliveira de Figueira é do melhor!!! Acho que há uma história em que ele vende guarda-chuvas a beduínos!

Do Blake & Mortimer (do autor original, não das novas versões), os melhores são "O segredo do Espadão" - absolutamente fantástico - e o "Enigma da Atlântica" (a primeira história deles que eu li). "O segredo da Grande Pirâmide" também é topo de gama.

Depois temos Hugo Pratt, que é um outro patamar. O desenho não é tão bom quanto o de Jacobs (porque ele não o quis, note-se), mas as histórias são do melhor. "Corto Maltese na Sibéria" e "A Casa Dourada de Samarcanda" são uma lição de História. Mas também temos "Verão Índio", em que Pratt empresta o seu argumento aos desenhos de Manara (um outro desenhador excelente, sobretudo quando desenha "gaijas"!).

Ah, e temos ainda um outro que, actualmente, é incontornável: Enrico Marini. Os seus albuns "Rapaces", "O Escorpião" e "Águias de Roma" ("Aigles de Rome", pois, que eu saiba, ainda não foi traduzido para português) são do melhor que eu tenho visto nos últimos anos, quer ao nível dos argumentos quer, sobretudo, ao nível do desenho, que são simplesmente impressionantes.

Depois temos outros, vários, que são referências: Alix, Blueberry, Luis Má Sorte, O Decálogo, e outros cujos nomes, quer de albuns, quer dos autores, não me lembro agora. E claro, teremos sempre os clássicos.

Acho que me alonguei, mas de facto gosto muito de banda desenhada :o)

Jest nas Wielu disse...

Já que a BD era considerada a arte burguesa na URSS, não cheguei de ser fá dos “quadradinhos”. Ainda via (não consigo dizer lia), qualquer coisita na jornal dos comunistas franceses, L’Humanite sobre as aventuras do gato & cão, mas por pouco tempo (o autor tinha morrido, acho que os portugueses podem me dizer o nome dele).

Mas como estamos falar da arte, vejam dois números que gostei no show ucraniano “Ucrânia tem o talento”:
http://www.youtube.com/
watch?v=hWheT1eSQoQ
http://www.youtube.com/
watch?v=wUSdYvD0bj4

MSantos disse...

"O Oliveira de Figueira é do melhor!!! Acho que há uma história em que ele vende guarda-chuvas a beduínos!"

Creio ser no "Carvão no porão".
E vende também aparelhos eléctricos a beduínos que ficam a olhar interrogativos para as tomadas.

Do melhor, de facto! :o)

Cumpts
Manuel Santos

Anónimo disse...

Não sei se há alguma história onde vendam gás, mas aí é melhor ser um russo a vender, porque os tugas não sabem como aconchegar a bilha às clientes e pode dar explosão.
Do melhor, de facto, este Tintim.

Gilberto disse...

Na verdade, a arte dos quadrinhos(comics) praticamente inexiste na Russia. É considerado coisa de criança. O que é lamentável demais.

Pippo disse...

O meu avô paterno também achava que BD era coisa para crianças. Mal sabia ele da existência do Milo Manara :o)

Jest nas Wielu disse...

Comunismo ruiu na Polónia há 20 anos atrás

Amanha, toda a Polónia vai comemorar 20 anos do fim do comunismo e da ocupação soviética do seu país. No dia 4 de Junho de 1989, nas primeiras eleições parcialmente livres após a II G. M., venceu Solidarność, o sindicato dos operários portuários que ditou o fim da ditadura comunista na Europa Central. Um ano mais tarde, o sindicato elegeu o seu líder histórico, Lech Wałęsa, como o Presidente da Polónia Livre.

A jovem Marta Ciemniewska tinha em 1989 apenas 15 anos e nunca podia imaginar que testemunhava à queda do comunismo no seu país. 20 anos depois, o jornal Gazeta Wyborcza encontrou aquela menina com a imagem da campanha do sindicato Solidariedade de 1989, eis a sua história.

Texto & Fotos:
http://iarochinski.blogspot.com/2009/06/menina-marta-de-20-anos-atras.html

Jorgemlr disse...
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Jorgemlr disse...
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Jorgemlr disse...
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Jorgemlr disse...

Caro Manuel Santos:

A propósito do nome de Tintin em Russo, invocando aqui a minha “autoridade” de estudante de língua russa nas horas vagas... :-) , queria só referir uma curiosidade: se não estou em erro, Tantana (Тантана) é o caso genitivo (complemento determinativo) do nome Tantan (Тантан) e significa portanto “de Tintin” ; daí, na frase de antetítulo do álbum, termos: Приключения Тантана (As Aventuras de Tintin ). Se estivesse como sujeito da frase (caso nominativo), seria Тантан, e portanto o nome russo repete a fonética do nome francês.

Também para mim, Tintin e Asterix são duas referências da BD. Curiosamente, comecei a interessar-me pelo Tintin quando já tinha mais de 30 anos... O Asterix foi uma referência na minha adolescência, tornando quase obsoletos, por assim dizer, os livros da Disney (Tio Patinhas, Mickey, Pato Donald, Zé Carioca, etc.) de que fui um razoável “consumidor” na escola primária. O desenho de Uderzo é de tal maneira pormenorizado e rico que permite mesmo após várias leituras do mesmo álbum apreciar pormenores em que não se tinha reparado da última vez. Já os textos (na fase de Goscinny) permitem vários níveis de leitura, pela sua subtileza, tanto para miúdos de 12 – 13 anos e adolescentes, como para adultos. É muito curioso verificar que a crítica por vezes corrosiva, presente em muitos álbuns (por exemplo, a análise da intriga e do boato no comportamento das pessoas, feita no álbum “A Zaragata”) convive em harmonia com a linguagem acessível para adolescentes.

Mas como dizia acima, só já bem adulto é que eu comecei a interessar-me pelo Tintin. Asterix e Tintin são duas bandas desenhadas bastante diferentes; considero o Tintin um pouco mais leve, mais “infantil”; os álbuns de Asterix são mais densos, com temáticas exploradas de modo mais profundo; as personagens são muito bem caracterizadas, com as virtudes e as fraquezas próprias dos seres humanos em sociedade. A profundidade e a subtileza do texto, associados ao desenho excepcional tornam os álbuns de Asterix, na minha opinião, mais completos. Mas ainda hoje leio ambos, Tintim e Asterix, com prazer.

Como escreve José Milhazes, 5000 exemplares do álbum de Tintim é de facto pouquíssimo, e a sua chegada à Rússia parece ter-se atrasado. Esperemos que não seja irremediavelmente. Estou convencido que, uma vez reconhecidas as suas qualidades intrínsecas, os álbuns de Tintin (como os de Asterix) terão um mercado promissor neste país.

Jorge Lopes

Jorgemlr disse...
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Pippo disse...

Sem dúvida, Jorge, sem dúvida!

Note-se ainda que alguns dos personagens (normalmente romanos) das histórias do Asterix são caricaturas de personalidades francesas e internacionais, tais como actores ou membros da classe política.
É, sem dúvida, uma das grandes bandas desenhadas dos nossos tempos.

MSantos disse...

Obrigado Jorge Lopes, de facto os meus conhecimentos de russo são inexistentes sabendo apenas a fonética dos caracteres cirílicos e mal.

Concordo em absoluto com o que disse em particular dos livros de Asterix que conseguem dar uma panorâmica do cosmopolitismo do mundo antigo e civilizações mediterrânicas e mesmo outras como é o caso dos bretões, germanos, bárbaros, todos doidos segundo o erudito e grande consumidor de javalis, Obélix :o)

Talvez em Asterix tenhamos assistido á primeira globalização em particular no mundo romano o que o torna um factor de aproximação entre povos.

Astérix é muito mais que BD. É um fenómeno sociológico riquíssimo digno de estudos aprofundados.

Os detalhes históricos, as analogias com o presente (seja ele qual for) os trocadilhos e o humor em especial as especificidades de cada povo são pura e simplesmente deliciosos.

O album que referiu, "A Zargata" para mim é dos melhores a par com "O Adivinho". Tão ancestrais e tão contemporâneos ao mesmo tempo.

Cumpts
Manuel Santos

MSantos disse...

Ainda sobre o Tintim há um pormenor importante que poderá revelar-se delicado:

Se o editor russo vier a publicar todos os álbuns, existe um, "O caso Girassol" que vai ser um bico de obra face a algumas tendências actuais em reabilitar Estaline.

No referido album, o Professor inventa uma arma sónica (algo realmente desenvolvido na gama das super-armas nazis) e é alvo de rapto por parte da Bordúria, país governado pelo ditador Pletski Gladz (creio ser assim) portador de uns fartos bigodes, que não é mais do que o homónimo em todos os aspectos do "paizinho".

Efectivamente aqui vemos novamente Hergé a satirizar e combater a ameaça comunista de então.

Sabendo como são os russos, não creio que alguma vez venham a publicar este album.

Cumpts
Manuel Santos

Anónimo disse...

Não haverá problema com essa arma porque os russos são todos surdos que nem uma porta e o Estaline actual não tem bigode nem barba, mas também não é careca. Agora o Professor em si é que é capaz de ser um bocado sensível ao barulho, mas isso com os protectores passa-lhe.

Anónimo disse...

Milo Manara, sim, tem a ver com a Rússia no álbum "Põe-te em pé!", que versa as desventuras de um russo importante que queria comer italianas mas não conseguia, porque nada se levantava, por mais que tentasse, e depois vingava-se dos garanhões da Casa Nostra expondo-os em público.Enfim, é o Padrinho internacional, versão erótica.Muito bom mesmo. Só para adultos.

Pippo disse...

Acho que havia ainda uma história do Manara em que uma jovem, por culpa de umas dívidas contraídas pelo irmão, era sodomizada todos os dias por um russo enorme e silencioso.
Enfim, mais uma fantasia sexo-erótica desse grande mestre da BD!

Anónimo disse...

Dívidas de irmãos? Que coisa mais antiga. Que tem irmão a ver com irmã? Só nas irmandades mafiosas. De resto é cada um por si. Essa história está muito mal contada, não é Manara, deve ser Corin Tellado porno reles.
A história que conheço é de uns mafiosos que andavam a perseguir a amante do Czar e da forma como o soberano os foi eliminando um a um, começando pelo primogénito do Padrinho. Uma coisa bíblica-russa, muito imprópria dos direitos da criança, mas é a lei de Deus a castigar os sodomitas com fogo e enxofre. Aconselho a leitura atenta, meditação prolongada e matraca fechada. A bem da razão.

MSantos disse...

Pois...apreciadores de BD!

Mas o assunto foge sempre para o Milo Manara "y sus febras", assuntos de hardcore e tal...

O que vocês apreciam bem eu sei ;)

E aqui o tótó todo entusiasmado com os Tintins e Asterix.

:o)

Abraço
Manuel Santos

Pippo disse...

Ahahah! Fomos desmascarados!!!

Mas independentemente dessa questão, a qualidade dos desenhos do Manara são evidentes. Veja-se Verão Índio (argumento de Pratt), uma bela obra com a História da colonização norte-americana como pano de fundo.

Anónimo disse...
Este comentário foi removido por um gestor do blogue.
Pippo disse...

Temos também outros autores, como Bilal (qualidade gráfica excelente, ainda que os temas nem sempre sejam facilmente digeríveis), ou Miguelanxelo Prado, muito bom. Seráque irão algum dia ser publicados na Rússia?

Por cá, infelizmente, a capacidade editorial, em suma, o mercado, é demasiado débil para que os nossos autores possam despontar. Contudo, gostaria de ver reeditada a história "Matei-o a 24", de Victor Mesquita (saiu na revista Visão em 1975) e ainda as obras do malogrado Victor Peón, que não sobreviveu a uma série de AVCs...

Também tenho um amigo que é ilustrador e desenhador mas, também este, segue uma senda de falta aguda de saúde. Parece que é a triste sina dos mais brilhantes dos nossos...

Anónimo disse...

Realmente os AVCs são muito impressionantes, sobretudo aos 43 anos e no mês de Junho, que é dos Santos Populares. Acontecem aos melhores e aos piores; é muito democrática a Morte.

Pippo disse...

Ele nã tinha 43, era mais velho, uns 60 e tantos. Não sei quando foi o AVC do Peón, mas o homem morreu já há uns anos, creio quem em 1990 ou 1991. Infelizmente.

Anónimo disse...

Não me referia a Peon, mas a outro afamado ilustrador internauta e blogger que morreu anteontem. Uma tragédia que afectará muita gente, sem dúvida.Ele gostava tanto de Dante que pode ser que tenha encontrado agora a sua Beatriz no Além.