quarta-feira, junho 16, 2010

País enfrenta eminente catástrofe humanitária – analista político


Publico aqui uma entrevista que fiz com Arkadi Dubnov, um dos melhores analistas sobre problemas da Ásia Central, para a Agência Lusa, pois considero que poderá dar respostas a algumas perguntas dos leitores sobre a situação no sul do Quirguistão:

“O Quirguistão encontra-se perante uma enorme catástrofe humanitária, que terá graves consequências para o país, para a região da Ásia Central e para a Rússia”, declarou à Lusa Arkadi Dubnov, especialista em assuntos da Ásia Central.
Dubnov considera que existe uma grande falta de controlo na distribuição da ajuda humanitária que está a chegar de diferentes países e organizações humanitárias, sublinhando que ela não chega aos refugiados uzbeques.
“A maioria dos refugiados e deslocados são uzbeques e a ajuda humanitária é distribuía, principalmente, através de organizações estatais quirguizes, que, voluntária ou involuntariamente, dão prioriade aos quirguizes”, explicou.
Segundo as organizações humanitárias internacionais, o número de refugiados e deslocados no Uzbequistão é superior a cem mil.
Quando a uma possível intervenção militar da Rússia ou de organizações internacionais no Quirguistão, o analista russo defendeu o seu envio nos primeiros dias dos confrontos no sul do país, mas sublinha que “ela agora não está na ordem do dia”.
“Duvido que a Rússia tenha capacetes azuis preparados para atuar na Ásia Central. Além disso, o Uzbequistão, país vizinho do Quirguistão, olha com desconfiança para a presença de tropas russas perto das suas fronteiras”, explica.
“Os Estados Unidos poderíam não estar contra a presença de tropas russas na região, mas Moscovo sofre do “síndroma georgiano”, ou seja, receia ser acusado de ambições imperialistas pela comunidade internacional”, acrescenta.
No que respeita à realização do referendo sobre a Constituição, marcado para 27 de Junho, Dubnov diz ter, ontem, conversado com Rosa Otunbaeva, primeira-ministra interina do governo quirguize, que lhe garantiu estarem a fazer todos os esforços para que não seja adiado.
“Mas eu não acredito que ele se realize nessa data. Ela própria reconheceu que ainda não foi tomada uma decisão definitiva. Nessa altura, as famílias das centenas de mortos estarão em luto e não vejo como será logisticamente possível realizar o escrutínio entre os refugiados e deslocados. Como se trata de um ato de legitimização das novas autoridades, o referendo deverá ser adiado”, frisou o analista russo.
Arkadi Dubnov espera que as autoridades quirguizes façam regressar a ordem e a calma ao sul do país, mas concluiu: “este conflito abriu feridas profundas, que deverão muito tempo a sarar. As suas consequências são difíceis de prever”.

12 comentários:

Jest nas Wielu disse...

Os tártaros do Tartaristão, através do Rafik Mukhametshin, o reitor da Universidade Islámica Russa de Kazan, anunciaram o lançamento do novo portal islâmico russo: www.islam-portal.ru para “difundir islão intelectual da escola tradicional de Hanafi”.

+
União das Mulheres Muçulmanas de Tartaristão http://soyuzmusulmanok.ru/index

++
http://www.info-islam.ru

PortugueseMan disse...

...“Os Estados Unidos poderíam não estar contra a presença de tropas russas na região, mas Moscovo sofre do “síndroma georgiano”, ou seja, receia ser acusado de ambições imperialistas pela comunidade internacional”...

Este é para mim o problema principal de uma intervenção russa, existe um custo político (para não falar do resto) tremendo.

É por isso que acho que só com um mandato internacional oficial de preferência uma resolução da ONU, de modo a verificar se os 5 membros permanentes concordam.

Porque continuamos com o problema de sempre, o que estamos a assistir aqui é a um confronto entre Rússia e EUA pela influência na região.

E o objectivo neste momento parece-me claro: o adiamento do referendo, impedir a legitimição deste governo interino.

O referendo está marcado para daqui a 11 dias, e da maneira com está toda a região do Sul, como é se vai efectuar um referendo ali?

Mas se não é feito, continuamos na mesma, temos um presidente deposto e um governo provisório que não se oficializa.

E aqui começa outro problema, parece-me ser claro que este governo não controla a parte Sul, não controla os militares nesta zona. Se isto começa a arrastar, poderemos ter uma reviravolta, podem surgir forças leais ao presidente deposto.

Quanto mais tempo passa, mais tempo existe para preparar essas forças e desde que elas, ou os seus líderes recebam apoio significativo vindo de quem prefere que seja aquele presidente a governar, podemos ter uma nova reviravolta, com o retorno do presidente.

No meio desta situação, se os russos entram lá devido à crise humanitária, podem ser envolvidos em eventuais combates entre forças leais ao presidente e forças leais aos actuais lideres. Numa situações destas a Rússia deve fazer o quê, sabendo que com aquele presidente a base americana não vai ser fechada?

Isto pode ter muitas ramificações e perigosas.

E a situação pode gerar uma bola de neve, pequena no início, mas quando começa a rolar...

Ou a coisa vai-se resolvendo nestes dias com tendência a acalmar, ou então para os russos entrarem ali, a situação terá que se agravar imenso e nessa altura eles entram e com muita força.

E com o agravar quero dizer que muito mais gente terá que morrer para alguém se mexer.

E é assim a realidade da vida.

Anónimo disse...

Eu também acho que ou os russos mandam umas boas massas ou o Quirguistão pode rebentar-lhes na cara.

Jorge Almeida disse...

PM, e a China, como é que fica no meio disto tudo?

Será que quererão ver tropas russas num país vizinho deles, onde, ainda por cima, existe uma imensa comunidade uígure, (etnia essa problemática para os chineses)?

Será que os chineses não terão interesse em entrar pelo Quirguistão dentro, quanto mais não seja para combater os uígures?

Para além disso, não nos podemos esquecer da imensa reserva de água que é o lago Issyk-Kul, para já não falar nas reservas de petróleo, gás natural e ouro (nomeadamente a mina de Kuntor) que existem no país.

Pippo disse...

Os chineses nunca intervirão no país. E por várias razões:
1 - uma intervenção chinesa no território iria totalmente contra a sua Pol. Ext. que se pauta pela não intervenção em países terceiros;
2 - tal intervenção geraria críticas por parte de toda a comunidade internacional (toda!), o que é péssimo para a imagem da China no mundo, que ser quer pacífica, construtiva, etc.;
3 - criaria imediatamente um confronto geopoolítico aberto com a Rússia e os EUA, e se há coisa que a China neste momento não pretende ter é problemas com esses dois países, sobretudo com a Rússia;
4 - o problema uigure não ficaria resolvido com uma intervenção chinesa, muito pelo contrário. Em lugar de lidarem com a questão apenas no seu território, os chineses passariam a ter de lidar com esse problema num país terceiro, na qualidade de forasteiros (na melhor das hipóteses) ou de invasores (na pior), e a intervenção seria uma arma propagandística excelente para a causa uigure;
5 - os recursos exigidos para a permanência de tropas chinesas no Quirguistão não compensariam os benefícios, quer económicos, quer políticos.

Não conheço o futuro, mas não me parece que a China venha a intervir no país.

Já agora, esta questão anda a ser debatida na China em determinados círculos, nomeadamente devido às implicações internas que se prendem com o separatismo uigure, mas no geral o povo não recebe notícias que possam gerar "alarme social".

Pippo disse...

Já agora, deixo aqui uma ligação para um projecto que está a ser desenvolvido na Àsia Central com o apoio da AKDN.

Trata-se da Universidade da Ásia Central, onde se espera fornecer aos alunos provenientes daquela região (e não só) cursos não superiores e superiores de excelência.

Um belo projecto que espero sinceramente que dê frutos.

http://www.ucentralasia.org

Cristina disse...

Julgo que esta tragédia terá consequências muito negativas para a Rússia, que provavelmente enfrentará nos próximos tempos uma nova vaga de refugiados vindos desta zona. Sem qualquer tipo de protecção social, estas pessoas, que falam russo e procurarão ver-se a salvo na Rússia, a sua antiga "metrópole", irão agravar a já de si complicada situação dos refugiados e imigrantes nas cidades russas.

Jorge Almeida disse...

Pippo, pelos critérios que enuncia, a China nunca teria invadido o Tibete.

No entanto, invadiu.

Outros tempos?

Jest nas Wielu disse...

Autoridades russas exigem (comandadas pelo Vladislav Surkov) que a imprensa russa classifique o grupo de homens assassinados e presos no Extremo Oriente russo de “bandidos” (o grupo atacava à tiro e à fogo posto a estrutura corrupta da polícia russa) e nunca de “partisanes” (insurgentes), para evitar e heróização dos mártires, quer em outros regiões russas, quer na blogosfera.

Mas a imprensa russa publica as fotografias com os graffities nos muros de Vladivostok e das outras cidades russas, onde se pode ler: “Glória aos Partisanes” e “Partisanes, as vossas façanhas não serão esquecidas”:
www.newsru.com/russia/16jun2010/
heroband.html (em russo)
http://windowoneurasia.blogspot.com/
2010/06/window-on-eurasia-kremlin-wants-media.html (em inglês)

PortugueseMan disse...

Caro Jorge Almeida,

A minha opinião é semelhante à do Pippo. A China não vai intervir pelos razões apontadas.

E tenha em mente que neste momento já existem tropas russas e americanas no país. A China já tem com que se preocupar mesmo sem estas revoluções e contra-revoluções.

Apesar do interesse chinês nesta zona, a China não quer problemas com a Rússia. E por isso só vejo uma hipótese de participação pela parte deles, ao abrigo da Organização de Xangai e a convite da Rússia.

E só vejo a Rússia a recorrer a isto, caso não consiga obter nada através da ONU, porque sou da opinião que a Rússia não deve intervir por meio da Organização do Tratado de Segurança Colectiva porque precisa de partilhar a pressão política recorrendo a outro membro permanente da ONU.

Caro Pippo,

Em relação à política externa chinesa, poderemos assistir daqui a uns anos a uma mudança. O Japão vai abrir a sua primeira base militar no estrangeiro, quem diria... e curiosamente não estamos a ver isso a ser muito falado na imprensa. Agora tenho a certeza do que apareceria na imprensa se fosse a China a fazer isso...

Seja como fôr, estamos infelizmente a assistir por todo o mundo a rearmamentos e a China por estar a consumir cada vez mais petróleo, terá muito certamente ter necessidade de poder projectar força.

Pippo disse...

"Pippo, pelos critérios que enuncia, a China nunca teria invadido o Tibete.
No entanto, invadiu.
Outros tempos?"

Exactamente, meu caro, outros tempos. E sobretudo, outras mentalidades e necessidades.

O Tibete é um espaço geográfico central, e a sua não ocupação permitiria que o Tibete viesse a ser usado pelo "imperialismo" contra as forças "progressistas".
Naqueles tempos justificava-se o uso da força contra o inimigo (vide Coreia), e foi isso que a RPC fez.

A Pol. Ext. chinesa mudou muito desde então, isto é, deu-se preferencia à cooperação económica com o fim de enriquecer a China e dar-lhe know how.
No capítulo das armas, a China está a progredir lentamente. Estabelece-se no Mar da China, estabelece-se no Índico, investe enormemente no poder aeronaval e na modernização das suas FA, e quando chegar a altura poderá lidar, dentro do seu espaço estratégico, de igual para igual com os EUA.
Acima de tudo, poderá negar-lhe o seu espaço estratégico o que, para os EUA, representa uma derrota.

A China tem necessidade de recursos energéticos e de comida. Não os tem, por isso terá de os buscar além, e para isso tem de garantir a segurança dos seus abastecimentos. Sem dúvida que isso assusta muita gente e as coisas começam a mudar por aquelas paragens.

PM, não sabia essa do Japão. Onde vai ficar a base?

PortugueseMan disse...

Caro Pippo,

Peço desculpa por responder tão tardiamente.

"Japan plans to open first foreign military base in post-war era"

http://www.janes.com/news/defence/triservice/jdw/jdw100504_1_n.shtml