Acontecimentos semelhantes aos que acontecem no Egito e Tunísia serão inevitáveis na Rússia, restando saber a forma que irão adquirir neste país, declarou à Lusa o general na reserva Leonid Ivachov, diretor da Academia de Problemas Estratégicos.
“A repetição dos acontecimentos no Egito e na Tunísia é inevitável na Rússia, mas poderá ter outro caráter. Quando o poder e o povo são adversários, são inevitáveis mudanças radicais”, considera Leonid Ivachov, que já respondeu pelas relações com a NATO no Estado-Maior das Forças Armadas da Rússia.
“Resta saber se irá dar-se sob a forma de uma revolta violenta ou se o poder encontrará coragem para evoluir no sentido de reformas radicais. Por enquanto, o poder nada de bom trouxe a ninguém, faz tudo para bloquear o desenvolvimento dos partidos e movimentos sociais, representa uma pequena maioria”, sublinha.
O general Ivachov chama atenção para o fato de as autoridades russas estarem a fazer buscas não só nas sedes de partidos da oposição liberal, mas também nas sedes de forças nacionalistas.
“Militantes nacionalistas russos, sensatos, construtivos, são também detidos e condenados a penas de prisão. Trata-se de um sinal de medo do poder. Este quer a todo o custo esmagar a consciência nacional do povo russo e de outros povos do país”, acrescentou.
Quanto aos acontecimentos no Egito e Tunísia, este especialista em geopolítica considera que eles têm origem na insatisfação de parte significativa da população, principalmente da juventude, com a situação social e económica nesses países.
“Mas o principal consiste em que avança o nacionalismo árabe, os árabes começam a ter consciência de que podem ser uma força importante ao nível mundial, querem reformas para não se atrasarem em relação ao Ocidente e Oriente. Por isso, tentam alterar regimes caducos que tentam conservar esse atraso”, considera Leonid Ivachov.
No que respeita ao papel do “fundamentalismo islâmico” nas movimentações sociais, o general russo chama a atenção para a sua “natureza dupla”.
“Por um lado, é um reflexo saudável do nacionalismo árabe; mas, por outro lado, em muitos casos, trata-se de organizações radicais islâmicas criadas pelos Estados Unidos, Israel e Europa como espantalhos, para travarem o desenvolvimento do mundo árabe”, considera ele.
“No Egito e Tunísia, trata-se de movimentos de revoluções económicas, sociais e políticas com vista a uma mudança de época no mundo árabe”, concluiu o general na reserva.
13 comentários:
"Quando o poder e o povo são adversários, são inevitáveis mudanças radicais”
"insatisfação de parte significativa da população, principalmente da juventude, com a situação social e económica nesses países."
-> isto não seria igualmente válido para países europeus em crise como Portugal?
O Nuno apontou uma questão interessante. Até que ponto as mudanças são inevitáveis quando o poder e o povo são adversários? Na Europa Ocidental, apesar da "democracia", o poder que o povo tem para influenciar - diria mesmo determinar - o seu destino parece-me fraco ou mesmo inexistente.
Na prática, quem detém o poder político alia-se ao poder económico, e juntos prometem o que prometem e depois fazem o que querem.
É essa a chamada "democracia".
Ora, as sublevações populares não dependem apenas da situação sócio-político-económica mas depende também do carácter dos povos e do seu entendimento de que se "bateu no fundo".
Na Tunísia, o povo entendeu que já não aguentava mais. No Egipto também.
Na Europa Ocidental os povos são submissos.
E na Rússia, como será?
Vamos a ver se as pessoas ansiosas por revoluções coloridas em Moscovo ainda não vão apanhar uma desilusão e vê-las acontecer antes na própria casa, pois nós cá deste lado estamos a perder e vamos continuar a perder mais.
Sobre a Rússia há três factores que podem adiar por algum tempo os furores revolucionários:
- Os anos Ieltsin ainda bem presentes
- A expriência "colorida" ucraniana.
- O modo sui generis de como os russos encaram a política, em particular a mudança.
Cumpts
Manuel Santos
"Na Europa Ocidental, apesar da "democracia", o poder que o povo tem para influenciar - diria mesmo determinar - o seu destino parece-me fraco ou mesmo inexistente."
SINCERAMENTE, ISSO FOI UMA DAS COISAS MAIS IDIOTAS QUE JÁ VI SEREM ESCRITAS.
Desculpe. Mas não resisti.
Caro Pippo, tem toda a razão!
Andam por aí idiotas que acham que temos muita democracia. Será que eles votaram o Tratado de Lisboa em referendo, como nos foi prometido? Será que eles votaram os cortes nos vencimentos dos funcionários públicos? Será que eles votaram a redução das indemnizações pagas aos trabalhadores que vão para o olho da rua?
Claro que não!
Onde está então a "democracia"?
Caros amigos que acham que não temos democracia:
Experimentem viver em países como a Bielorrússia, Tajiquistão, Cuba, Venezuela, ou Arábia Saudita e verão o que é a sua inexistência. Nesses sítios (e em muitos outros), até o acesso à Internet é controlado.
Demos graças a Deus por termos ainda alguma liberdade e o povo poder participar a nível local e escolher democraticamente o seus governantes (agora se os escolhem mal, a culpa já não é do sistema)
Cara Cristina
Dê mas é graças a deus por esses regimes ainda existirem.
Esqueceu-se da Rússia e do Irão.
Já pensou no que será de vós quando estes totalitarismos desaparecerem?
E depois? Qual será o bicho papão vivo?
Cumpts
Manuel Santos
Cristina, não se trata de "escolher mal", trata-se do facto de, seja qual for a escolha, os resultados serem os mesmos.
Diga-me uma coisa: quem é o deputado na AR que A representa, a si? Qual é o deputado a quem a Cristina pode pedir justificações? Conhece-o? Não. Porquê? Porque um deputado não é nomeado por si, não é o seu representante.
Será ele o representante do Partido ao qual pertence? Também não.
Na verdade, o deputado representa os líderes do Partido que o nomearam! É tão simples quanto isto.
Ora, porque é que certos indivíduos são escolhidos para serem os representantes da direcção partidária na AR? Será pelas suas competências? Não. Pelos seus conhecimentos? Não. Na verdade, eles são escolhidos por terem sido fiéis aos ganhadores das eleições internas do Partido, isto é, por terem permanecido parte da "camarilha", por terem cacicado a seu favor, por terem "votos", etc.
Por isso, um tipo medíocre mas fiel é deputado; um tipo excelente mas que é da "oposição" é posto na prateleira.
Acredite nisso porque eu já lá estive e sei muito bem do que falo.
Em suma, o deputado representa os líderes do seu Partido, e a não ser que este tenham sido escolhidos por si, então o deputado, de forma alguma, a representa, nem sequer indirectamente. Percebeu?
Cristina, você contesta a minha afirmação contrapondo com a Bielorrússia, Tajiquistão, Cuba, Venezuela e Arábia Saudita. Pelos vistos, para si, se não for tirania, então é democracia. Lamento, mas está equivocada. Nesses países, provavelmente, existirá tirania (provavelmente, pois não sei se é isso que os respectivos povos pensam), mas o facto de não vivermos na tirania ou na autocracia não quer dizer que tenhamos democracia. A não ser que democracia seja podermos pôr um papel numa urna ou podermos dizer cobras e lagartos dos nossos governantes nos emails ou à mesa do café.
Então, que tipo de democracia temos? Temos uma "democracia" em que podemos votar num partido cujos líderes e seus representantes têm imunidade parlamentar, decidem o que querem nas nossas costas e não nos dão cavaco (salvo seja!). Temos uma “democracia” onde o contrato social entre governados e governantes é constantemente violado por estes sem que sejam cível e criminalmente responsáveis. Temos uma “democracia” onde nos prometem uma coisa e no dia seguinte fazem outra (a vergonhosa história do referendo à Constituição Europeia é disso um exemplo escandaloso: não foi a referendo porque o documento não se chamava “Constituição” mas sim “Tratado de Lisboa”!)
Ah! Mas podemos discutir política no café! Porreiro, pá! Essa é a maior falácia com que nos enganaram. É que enquanto a malta discute, liberta a pressão acumulada, e com isso impede-se a explosão, a revolta das massas. A liberdade de expressão foi a maior conquista da “democracia” pois permitiu às pessoas libertar o vapor sem, contudo, lhe conceder verdadeiro poder de decisão. Esse permanece em mão alheias.
Mas a isso chamam Democracia.
Cristina, me desculpe discordar, mas que a democracia representativa está sendo corroida, isso está. mesmo podendo escolher nossos representantes, a organização partidária e o sistema institucional vão de mal a pior, a primeira não forma mais quadros comprometidos com o bem comum ou o sentido de nação e as instituições estão todas infiltradas pela burocracia inepta e corrupta. É claro que não se chegou ao ponto do estado de exceção como nos países que você citou, mas experimente ir contra algum grupo organizado no poder ou contra o pensamento politicamente correto e as diretivas de Bruxelas para sentir o peso da opressão estatal.
Em parte concordo com o sentido do comentário. A existência de democracia politica até certo ponto torna as sociedades mais abertas e estáveis. Mas se avaliar-mos mais ao pormenor essa peculiaridade, também podemos constatar que esse conceito é comum a muitos outros países dos mais diversos continentes e das mais variadas culturas, sem no entanto produzir os mesmos efeitos por igual.
Serve esta observação para questionar os defensores das democracias amputadas dos seus reais valores. Sim; qual o uso (ou utilidade) da democracia politica esvaziada das componentes económicas e sociais? Para que serve o direito ao voto dos cerca de 2 M M de seres humanos carenciados dos meios mais elementares de sobrevivência?
Que podem fazer os pobres e os desempregados na Europa no dia seguinte ao terem depositado o voto na urna?
Portanto defender apenas a democracia politica é pouco. Além de ser ideologicamente muitíssimo perigoso. É um passo que há décadas se mantém num impasse com tendência para encurtar cada vez mais. Temos a atual situação Europeia como exemplo.
Portanto não basta apenas exigir liberdade politico temos que pugnar igualmente por liberdade económica e social, para que todos os seres humanos tenham acesso às riquezas produzidas de uma forma justa, (igualitária não, porque isso seria provocar outras formas de injustiças).
A este propósito Ignacio Rimonet (Diretor do Le Monde Diplomatique) num recente trabalho regista que dos cerca de 6 200 Milhões habitantes do planeta, apenas vivem confortavelmente cerca de 500 Milhões, e que 358 multimilionários têm um rendimento anual superior ao de 2 600 Milhões de pessoas.
Portanto são estes desequilíbrios na distribuição dos rendimentos que provocam a marginalização social, a pobreza, e todos os males que as sociedades dos nossos dias enfrentam.
No mesmo estudo Rimonet afirma ainda que apenas 5% da economia mundial está assente nos meios de produção, enquanto 95% se sustenta no movimento de capitais e especulação financeira.
Portanto esta desproporcionalidade de forças em presença na esfera economica mundial é a única responsável pela presente crise.
Na medida em que o grande volume de capital excedentário procura ganhar cada vez mais e só o consegue fazer reduzindo os salários aos trabalhadores e ao reduzir os salários restringe o poder de compra a uma camada substancial da população, por conseguinte baixa o consumo de bens.
E desta forma surge assim uma das grandes contradições do capitalismo.
Senão veja-se nos países onde aumentou o poder de compra por parte da população a crise poucos (ou nenhuns) efeitos produziu.
Francisco, só falhou numa coisa: é Ignacio Ramonet.
Em tudo o resto, acertou na mouche!
Caro Pipo! Grato pela correção.
Cumprimentos.
Já agora, recomendo-lhe (se é que ainda não o leu) a Geopolítica do Caos, o mesmo autor. No mínimo, interessante.
Enviar um comentário