Os resultados das eleições parlamentares no Cazaquistão, o maior país da Ásia Central, voltam a colocar no centro das atenções o papel dos observadores internacionais, as possibilidades que estes realmente possuem de controlar a campanha eleitoral, o escrutínio e a contagem dos votos.
Recordo que, segundo dados preliminares, o Partido Luz da Pátria, dirigido pelo Presidente Nussultan Nazarbaev, conquistou 80, 74% dos votos, o Partido Via Luminosa, que se representa homens de negócios, mas é totalmente leal ao poder, conseguiu 7,46 % e o Partido Comunista, também obediente ao poder, conquistou 7,2 % dos votos.
Os restantes quatro partidos, entre os quais o único partido da oposição, o Social-Democrata, não superaram a barreira dos 7% e, por isso, ficaram de fora.
Os observadores da Comunidade de Estados Independentes, organização que reúne onze das quinze antigas repúblicas soviéticas, não fugiram à tradição e consideraram que o escrutínio decorreu segundo as normas democráticas.
Os observadores de organizações como OSCE, UE, irão constatar alguns progressos, mas sublinhar falhas importantes na preparação e realização do escrutínio.
Tanto uns como outros têm razão, mas só muito parcialmente. Vamos admitir que a votação decorreu normalmente (embora a oposição fale de fraudes em massa), mas as eleições não são apenas o acto de votação.
As eleições são constituídas por campanha eleitoral, dia do escrutínio e noite da contagem dos votos. Ora, a campanha eleitoral ficou marcada por graves irregularidades. A primeira foi que a Comissão Eleitoral do Cazaquistão impediu a participação de seis partidos nas eleições. Além disso, o partido no poder dominou completa e totalmente os órgãos de informação, impingindo a sua leitura dos acontecimentos.
No dia das eleições, as coisas até podem correr muito bem, com “pequenas fraudes”, mas depois chega a hora da contagem dos votos e aqui começa a “noite dos mistérios”. As autoridades manipulam os dados obtidos nas urnas durante a transmissão para a Comissão Eleitoral Central, pois este processo não é controlado pelos observadores. Quando a votação nos “partidos previstos” pelas autoridades se desvia da norma, os resultados são adaptados a essa norma através da reescrita das actas do escrutínio ou no processo de transmissão à Comissão Eleitoral Central.
Estes desvios explicam a “grande votação” no Partido Comunista controlado pelo poder. As sondagens davam a vitória absoluta ao Partido de Nazarbaev e a superação da barreira dos 7% pelo Partido Via Luminosa, pois a nova lei eleitoral, arrancada quase que a ferros pela Organização para a Segurança e Cooperação na Europa, exige que no Parlamento estejam pelo menos representados dois partidos. Mas, segundo as sondagens, o Partido Comunista estava muito longe de superar essa barreira, mas o poder apressou-se a dar provas da sua “bondade política”.
Esta dádiva ao Partido Comunista também pode ser explicada como uma forma de as autoridades tentarem controlar através dele a onda de protestos nalgumas zonas do país. Em Dezembro passado, confrontos entre operários da indústria petrolífera e polícias na cidade de Janaozene, provocaram dezenas de mortos e feridos.
Nesta situação, é difícil considerar legítimas estas eleições parlamentares.
Por outro lado, o Cazaquistão é o maior país da Ásia Central, rico em hidrocarbonetos e minérios, e o alargamento da desestabilização política ao seu território poderá ter consequências funestas para toda a região, incluindo a Rússia. Daí, poucos serão os interessados em insistir, durante muito tempo, nas críticas à política do Presidente Nazarbaev.
O próprio Nazarbaev tem de estar atento e agir preventivamente aos desafios. Além dos confrontos em Janaozene, grupos fundamentalistas realizaram quatro atentados terroristas no Cazaquistão em 2011.
O dia das eleições ficou marcado por um acontecimento que alguns interpretam como mau agoiro. Em Astana, capital do país, um incêndio provocou sérios prejuízos numa mesquita que aí está a ser construída, e que será a maior da Ásia Central. Mas os bombeiros controlaram atempadamente as chamas.
Eu não sou supersticioso, mas…
P.S. O sistema eleitoral russo sofre os mesmos males do cazaque, pois os truques do segundo são copiados do primeiro. No dia 04 de Março, os russos vão eleger o seu Presidente. Putin promete eleições limpas e transparentes, vamos esperar para ver.
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