Não
há dúvida que António Ribeiro Sanches, ilustre médico português
que trabalhou na corte russa do séc. XVIII, tinha razão quando, no
seu livro
“Memória
sobre os banhos
de
vapor russos”,
deu preferência a estes últimos em comparação com os finlandeses
ou turcos. Mas para se apreciar um verdadeiro banho russo é preciso
deixar-se levar pelos mestres da arte.
Recentemente,
fui convidado uma vez mais a fazer banho russo na casa de um amigo
nos arredores de Moscovo. Eduard era o “banchik”, ou seja, o
homem que guarda as tradições de todo o ritual, sim porque o banho
russo é um verdadeiro rito, com até alguma religiosidade.
“Estão
prontos? Vamos começar o banho com essência de absinto para limpar
o corpo e a alma de todas as impurezas”, disse Eduard quando
atirava para cima dos nossos corpos uma essência feita à base dessa
planta e entravamos para um pequeno compartimento onde se encontrava
um forno que fazia a temperatura chegar um pouco acima dos 90 graus.
Só a cabeça ia protegida por um barrete especial de feltro.
“Durante
dois ou três minutos não falem, meditem para que toda a sujidade
abandone o vosso corpo”, continuava ele a dar instruções.
Não
sei quantos minutos passei dentro daquela fornalha, mas pareceu-me
uma eternidade. O odor exalado pelo absinto era forte e fazia
comichão na garganta e no nariz, o corpo transpirava de uma forma
cada vez mais intensa que se ficava com a sensação de se estar a
perder rapidamente peso.
Saí
disparado como uma flecha para me ir pôr debaixo de um chuveiro que
jorrava água gélida, criando uma sensação de alívio.
O
“tratamento” com absinto repetiu-se e, depois, Eduard preparou um
banho com essência de lúpulo e sal marinho, enquanto alguns dos
convidados conversavam à volta de umas canecas de cerveja. A
preparação foi rápida e o segundo acto do banho russo valeu a
pena, pois a segunda essência parecia tornar-me ainda mais leve,
tanto física como espiritualmente.
Mas
já não aguentei o terceiro banho, preparado com ramos de um
pinheiro siberiano de que desconheço o nome e “mais uma essência
secreta” de Eduard. Os meus amigos continuaram a cumprir o
“programa completo”, que incluía o vergastar das costas com
ramos de várias plantas. Eu adoptei por colocar os pés em água
quente misturada com mais uma essência do nosso mágico “banchik”.
A
sessão termina com mais um banho de contraste. Podíamos ter corrido
para a rua esfregarmo-nos com neve, mas a temperatura do ar não
convidava, o termómetro mostrava cinco graus positivos e a tradição
pede temperaturas negativas.
Aqueles
que nunca fizeram banhos russos não podem imaginar com que vontade
de comer e de beber se fica depois de tudo isso, mas Eduard previne:
“se comerem e beberem muito, o efeito purificador do banho
desaparece. Por isso, sejam moderados, principalmente no álcool”.
Só
que nos esperava a saudação russa da dona de casa: “que o vapor
seja leve!” e uma verdadeira mesa russa: peixes fumados, pepinos e
repolho salgados, bolos de carne, arroz e repolho, e tudo isto só
para as entradas. Depois, ainda veio cabrito e coelho.
Tudo
estava muito saboroso e o tempo ia passando à medida que se
realizavam os brindes: “À saúde dos hóspedes!”, “à saúde
dos hospitaleiros donos da casa!”, “à saúde das mulheres que
prepararam o jantar!”, misturados com conversas sobre os resultados
dos Jogos Olímpicos de Sochi e a situação na Ucrânia.
Foi
uma noite inesquecível, pois o banho russo é ainda mais agradável
e curativo quando feito com pessoas de que tu gostas. E não esqueci
o último conselho de Eduard sobre o efeito purificador dos banhos
russos.
6 comentários:
Deve ser agradável, mas para quem tem a tensão baixa 3 minutos de calor a 90º não será desaconselhável?
A comidinha fez crescer água na boca, menos o coelho que não como.
Estes pequenos momentos são os que são inesquecíveis!
Obrigado por partilha-los connosco, JM.
Jose milharss voce e umar farça como nao deixa as pessoas comentaren livremente neste blog so sisto pena de você a sei voce nao e digno de minha pena;)
O banho russo sofre alguma influência do banho turco?
Eur., são duas coisas diferentes.
Caro JM,
Bom artigo.
Gostei de ler.
Enviar um comentário