A minha comunicação feita nos XXXV Colóquios de Relações Internacionais na Universidade do Minho
Parte 1:
"É
impossível falar do movimento da sociedade russa para a democracia
sem falar do nome e da herança deixada por Mikhail Gorbatchov,
primeiro e último Presidente da União Soviética e secretário-geral
do Partido Comunista da URSS entre 1985 e 1991.
Porque
este foi talvez um dos períodos mais férteis no que diz respeito à
construção da democracia na Rússia, obra até hoje inacabada.
Os
soviéticos, naquela altura, diziam que a democracia tinha tanto a
ver com a “democratização” iniciada por Gorbatchov como um
canal tem a ver com uma canalização. Mas, lançado, a partir dos
nossos dias, um olhar frio e isento, podemos dizer que esse período,
principalmente os anos de 1989-1991, foi o mais democrático em toda
a história da Rússia no século XX.
Ao
longe, poderia não parecer assim, mas, in loco, tive a
oportunidade de ver a constituição de uma sociedade civil, de a ver
a abrir caminho por entre as fissuras que se iam formando no Partido
Comunista da União Soviética e nas instituições soviéticas
burocratizadas que teimavam resistir aos ventos de mudança.
Mikhail
Gorbatchov tinha de fazer ginástica, ser um campeão de equilibrismo
para controlar a situação e só não o conseguiu, porque recebeu
uma economia desequilibrada e extremamente débil. A estagnação
económica, a corrida aos armamentos e as aventuras militares dos
seus antecessores (Angola, Afeganistão, Etiópia, etc.) impediram
que ele conseguisse melhorar o nível de vida das pessoas. A queda
drástica do preço do petróleo em 1985 e 1986 ($ 9 por barril) foi
fatal para o futuro da URSS.
Porém,
as sementes da sociedade civil, lançadas a partir de 1985, foram
fundamentais no dia 19 de Agosto de 1991, quando ortodoxos comunistas
tentaram afastar Gorbatchov do poder. Os golpistas esperavam repetir
o golpe palaciano, realizado em 1964 e que derrubou Nikita Krutchov,
mas os cidadãos saíram para as ruas de Moscovo, Leninegrado,
Tallinn, etc. para defender as suas conquistas.
A
formação da sociedade civil, sob a forma de renascimento nacional,
revelou-se nos movimentos autonomistas em várias regiões da URSS.
Vieram à tona numerosos problemas nacionais recalcados. À primeira
oportunidade surgiram movimentos independentistas não só nas três
repúblicas do Báltico: Letónia, Lituânia e Estónia, que tinham
sido anexadas em 1939, ou seja, mais tarde do que as restantes 12
repúblicas da URSS, bem como na Geórgia, Azerbaijão, Arménia, e
até no interior da Federação da Rússia: na Tchetchénia.
Na Rússia, é neste período
que emerge a figura política de Boris Ieltsin. Trazido de Sverdlov
para Moscovo por Egor Ligatchov, membro do Bureau Político do PCUS,
para injectar forças novas e activas nesse partido, Ieltsin
rapidamente enveredou pelo populismo a fim de vencer os seus
adversários. À frente da organização de Moscovo do PCUS, medidas
populistas como o de andar de autocarro em vez de utilizar o
automóvel aumentavam a popularidade. E até as publicações na
imprensa oficial de notícias sobre acções realizadas sob o efeito
do álcool (que, mais tarde, vieram a ser confirmadas) lhe davam
pontos na luta contra Gorbatchov. Em
26 de Março de 1989, Ieltsin foi eleito deputado por Moscovo com
92% dos votos, e três dias mais tarde, conquistou um lugar no
Soviete Supremo (Parlamento) da Federação da Rússia. A
19 de Julho do mesmo ano,
Iéltsin anunciou a formação de uma facção radical a favor de
reformas..." (continuação)
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