***José Milhazes, agência Lusa***
*** Foto de Verónica Kulakova***
Pretchistoe, 23 set (Lusa) – João Pinheiro, chefe da
família de acolhimento de Alexandra, a criança russa que foi entregue à mãe
biológica pelo Tribunal de Guimarães há três anos atrás, esteve na Rússia para
se encontrar com a família da menina e “estabelecer um diálogo normal com ela”.
“É
impossível descrever o que vai dentro de mim. Nem quero acreditar que tenho os
pés em Moscovo”, declarou ele à Lusa, depois de uma longa e atribulada viagem
entre o Porto e a capital russa.
João
Pinheiro tinha requerido junto do Consulado da Rússia em Lisboa um vista para
entrar no país, mas foi-lhe várias vezes recusado.
“Não
sei o que aconteceu desta vez, mas recebi o visto e aqui estou. Foi três anos a
lutar por este momento e cá estou”, frisou.
Como
a família de Alexandra não se quis dirigir a Moscovo por motivos económicos,
João Pinheiro lançou-se numa longa viagem até Pretchistoe, vila onde reside a
menina, situada a mais de 360 quilómetros de Moscovo. Nos dois sentidos,
foram precisas onze horas, mas o português de Barcelos tinha o seu objetivo.
“Por
essa menina, vou mesmo até ao fim do mundo. Vim aqui precisamente para isso.
Quero abraçá-la, dar-lhe um beijo e entregar-lhe as prendas que trouxesse”,
continua João Pinheiro, enquanto, através da janela do carro, olha para aldeias
russas com enorme curiosidade.
Não
sabendo como iria ser recebido, bateu à porta da velha casa da família de
Natália Zarubina com um certo receio, mas não havia motivo para tal, pois
recebido com a possível hospitalidade russa: abraços e beijos.
A
Xaninha não estava em casa, andava a brincar com as amigas. Veio pouco depois e
recebida por João Pinheiro com abraços e beijos, mas sem que ela respondesse em
português a algumas das perguntas dele.
A
menina dirigiu-se rapidamente para as prendas, prestando pouca atenção às
conversas entre os adultos.
“A
camisola de que gosta! E que estojo com perfumes bonitos! Mais uma camisa e
meias bonitas!”, exclama Alexandra entusiasmada, mas falando sempre em russo.
Apenas
disse em português: “obrigada!”, mas só após a insistência da mãe.
Durante
o almoço no restaurante local onde Natália ganha a vida como empregada de mesa,
João Pinheiro contou como corria a vida da sua família em Portugal, tentando,
ao mesmo tempo, apelar às recordações de Alexandra sobre a sua vida passada,
mas a menina raramente reagia, distraindo-se com outros afazeres.
Irrequieta
e traquina, não tardou a insistir com a mãe para voltarem para casa, pois
queria ir brincar com as amigas.
“Quando
não está na escola, passa a vida a brincar na rua com as amigas. Não está
parada”, justifica Natália, mãe de Alexandra.
Entretanto,
o telemóvel não parava de tocar. Um grupo de portugueses que apoiam de várias
formas a família Pinheiro desde a partida da menina querem saber notícias,
saber como estão a correr as coisas. Florinda, esposa de João Pinheiro, também
está ansiosa para “saber como está a minha menina”.
“Tem
medo que lhe roubem o marido”, comenta ela com um sorriso nos lábios.
Rapidamente
chegou a hora da despedida, pois João Pinheiro tinha ainda de regressar a
Moscovo e as estradas russas não permitem grandes velocidades.
Ao
distribuir velhos e abraços por entre todos os membros da família da Alexandra,
desde o avô até ao padrasto, João propôs
a Natália e ao marido que viessem passar o Natal e Ano Novo a Portugal.
“Está
bem, nós vamos! Mas temos de tratar de passaportes e vistos”, declarou Alexei,
o padrasto da menina, dando a entender que há apenas um “pequeno” problema: a
grave falta de dinheiro.
“Eu
vou ajudar. Irei dar todo o apoio para vos ver lá em minha casa”, retorquiu
João Pinheiro.
O
português não quis deixar a vila sem ver a Lúcia, cadela que acompanhou a
menina para a Rússia. A coxear de uma das patas, o animal, que vagueia por
Pretchistoe à procura de comida, saltou para João e começou-lhe a lamber as
mãos e a pedir festas.
“Lúcia,
Lúcia, ela reconheceu-me, não se esqueceu de mim”, exclamou ele, ficando
sufocado por lágrimas e desviando-se de Alexandra e das outras pessoas para que
não o vissem a chorar.
“Tentarei
fazer tudo para ajudar esta família, e agora muito mais”, concluiu João
Pinheiro ao deixar para trás a vila de Pretchistoe.
JM
Fim/Lusa
2 comentários:
Cadelinha foi a mais fiel, lembro que a primeira coisa que lhe aconteceu é ser amarrada à uma corrente metálica, um símbolo, mas não deixa de ter o seu significado...
Não conheço a menina mas nunca esquecerei as imagens da entrega, e a angustia das noticias que nos iam chegando da Russia, continuo a comover-me mesmo passados 3 anos.....obrigada por nos ir informando e muita força à familia Pinheiro a quem mando um grande beijo.
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