A polémica sobre os alegados documentos da
PIDE volta a surgir a propósito de novos dados publicados no livro
“Cunhal, Brejnev e o 25 de Abril”, do historiador e correspondente da
Lusa em Moscovo.
O autor de “Cunhal, Brejnev e o 25 de Abril”
escreve que os arquivos da PIDE-DGS que foram levados para Moscovo
permitiram aos serviços secretos soviéticos não só aceder a informação
sobre Portugal mas também identificar uma “toupeira” da CIA no KGB, nos
anos 1970.
José Milhazes recorda que a questão dos arquivos foi
falada, pela primeira vez, pelo general Oleg Kaluguin, do KGB, que vive
atualmente nos Estados Unidos, e que escreveu um livro nos anos 1990
sobre as atividades que desenvolveu nos serviços secretos soviéticos e
“onde fala da operação de transferência dos arquivos” da PIDE.
“Mais
tarde, outro livro que se chama “Arquivo Mitrokhine”, (Vassili
Mitrokhine agente soviético que fugiu para Londres no início dos anos
1990 na posse de numerosos documentos secretos) e que foi publicado em
Portugal, faz uma afirmação semelhante. Nessa altura falou-se nisso. O
Ministério dos Negócios Estrangeiros (através do então ministro Jaime
Gama) até tentou contactar as entidades russas para que o arquivo fosse
devolvido, mas depois de terem recebido a resposta dos russos de que não
tinham nada, não insistiram”, recorda Milhazes, considerando relevante o
esclarecimento do assunto.
“Segundo aquilo que eu consegui
apurar, a diplomacia respondeu que em Moscovo não havia arquivo nenhum,
mas isto trata-se de um processo diplomático e apresentando provas de
russos vai ser difícil eles dizerem que isso não aconteceu. Por exemplo,
é pegar nas revelações feitas pelos russos, com base nesse arquivo”,
afirma José Milhazes, correspondente da Lusa e residente em Moscovo
desde os anos 1970.
Para o jornalista, a importância histórica dos
arquivos “é enorme” porque se ficaria a conhecer a rede internacional
da antiga polícia política portuguesa.
Para a historiadora Irene
Flunser Pimentel, autora da “História da Pide”, entre outras
investigações sobre a polícia política e o Estado Novo, a questão do
arquivo da PIDE deve voltar a ser abordada.
“É um assunto que já
coloquei à Torre do Tombo, assim como colegas meus, porque eu acho que
os arquivos devem regressar. Eles até podem ficar com cópias, mas os
originais devem vir para cá”, afirma a historiadora, que defende que os
historiadores devem “pressionar outra vez” para que o arquivo seja
devolvido.
“Um grupo de historiadores deve começar a pressionar,
outra vez, para que seja devolvido, através do Ministério dos Negócios
Estrangeiros, mas também tem de haver interesse da Torre do Tombo”, onde
se encontra o arquivo da PIDE.
Tal como José Milhazes, Irene Pimentel cita igualmente as fontes russas que referem a existência dos documentos em Moscovo.
“Há
as fontes do arquivo Mitrokhine e há elementos do KGB que disseram que
viram, de que coisas se tratavam, de que há muito material relacionado
com as colónias e de tudo o que tem que ver com as agências secretas e
com as polícias. O que dizem é que, sobretudo, terão ido muitas coisas
sobre o relacionamento da PIDE e as agências secretas. Aqui (em Lisboa)
não há nada sobre a Scotland Yard, não há nada sobre o MI5 e MI6 e há
muito pouca coisa sobre a CIA”, diz Irene Pimentel.
Para a
historiadora Raquel Varela da Universidade Nova e autora do livro “A
História do PCP e a Revolução dos Cravos (1974-1975)”, o Governo
português tem obrigação de fazer um pedido formal de devolução desse
arquivo para se juntar ao restante arquivo da PIDE e pedir, “no
imediato”, uma digitalização e a abertura do mesmo aos investigadores
portugueses, uma vez que, afirma, a regra básica é a abertura dos
arquivos passados trinta anos.
“Já estamos a falar de 45 anos e continuamos sem ter acesso a esse arquivo”, disse Raquel Varela à Lusa.
“Nós
estamos a falar do arquivo da polícia política da mais longa ditadura
da Europa e uma parte essencial desse arquivo diz respeito aos anos 1960
e 1970, um período absolutamente rico da nossa História, que envolve
uma mudança imensa em Portugal, envolve a Guerra Colonial e conflitos
internacionais muito importantes”, conclui Raquel Varela.
A
questão do alegado envolvimento do PCP na operação da suposta retirada
dos documentos de Portugal para Moscovo também é abordada no livro de
José Milhazes, mas o Partido Comunista Português, quando questionado
pela Lusa, considerou que notícias sobre o envio de arquivos da PIDE
para a União Soviética em 1975 assentam em “velhas falsificações”.
“Não merecem comentário afirmações desqualificadas assentes em velhas e recorrentes falsificações”, afirma o PCP.
3 comentários:
Acabo de ler o seguinte comentário de Vitor Dias sobre o livro, o que trago aqui em benefício do contraditório:
http://otempodascerejas2.blogspot.pt/2013/09/vem-ai-mais-do-costume-ou.html
o poder com que os russos ficaram à conta disto e o que com ele fizeram e fazem faz com que nunca sejam devolvidos
O PCP continua com os tiques do costume. Bem sabemos como queimaram jornais e revistas que não lhe agradavam depois do 25 de Abril.
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